Escolas do Campo do Paraná trazem história e cultura da África para a sala de aula

Obrigatório nos currículos das redes de ensino em 2003, ensino da história e cultura africana está sendo implementado em escolas do campo
Brincadeira cooperativa africana – Escola Itinerante Valmir Motta de Oliveira, localizada em Jacarezinho. Foto: Arquivo MST/PR

Por Jovana Cestille, Nyky Rodrigues e Ednubia Ghisi
Da Página do MST

Além de Zumbi dos Palmares, qual outro herói negro no Brasil você conhece? Grande parte da população não saberia responder, ou ficariam longos minutos refletindo e percebendo que nunca lhes foram apresentados outros personagens que participaram da construção dos mais de 500 anos de história do nosso país.

Colégio Contestado. Foto: Arquivo MST/PR

O ensino da história e da cultura africana e afro-Brasileira tornou-se obrigatório nos currículos das redes de ensino em 2003, a partir da Lei 10.639. Em 2011, a Lei 12.519 institui o 20 de novembro como Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra. Apesar da legislação, a inclusão do tema em sala de aula, na prática, não é a regra. A falta de conhecimento sobre o papel da África e do povo negro na formação do Brasil é um dos alimentos para a continuidade do racismo.

Nas Escolas do Campo de áreas da reforma agrária do Paraná, a ação conjunta da comunidade escolar marcou novembro como o mês da Consciência Negra, com dezenas de atividades. Luciane Olegário da Silva, mestre em Educação e integrante da direção do Setor de Educação do MST/PR, explica que os trabalhos estão atrelados ao projeto de educação na perspectiva da formação humana.

“Eles expressam, através da arte, da cultura entre outras dimensões, a importância dos/as estudantes conhecerem a história do povo negro, a cultura afro-brasileira e suas religiões. Desde a infância até a faixa etária adulta, é necessário que busquemos ampliar a compreensão de que o ser humano, independente da raça-etnia, tem o direito de viver e de ser respeitado”, afirmou Luciane.

Escola Herdeiros do Saber II. Foto: Arquivo MST/PR

As Escolas Municipais do Campo Egídio Bruneto e Trabalho e Saber, e o Colégio Estadual do Campo Maria Aparecida Rosignol Franciosi, localizados no assentamento Eli Vive, em Londrina, realizou uma Semana da Consciência Negra com diversidade cultural e muita arte, através de exibição de vídeos, oficinas, teatro, dança, música e alimentação diferenciada. “A semana cultural foi marcada com a compreensão de que a consciência negra é a consciência de todos nós”, explicou a professora Sandra Scheeren.

Estudar a história e a cultura da África é prática antiga no Colégio Contestado, da Lapa. Em 2016, a escola venceu um concurso estadual de redação sobre o tema, escolhido entre outros 500 textos. Neste ano, os estudos sobre a questão do povo negro no Brasil ocorreram em vários momentos na equipe multidisciplinar do Colégio.

“Ao longo de duas semanas antes do dia 20, fizemos trabalhos sobre a história dos negros no Brasil, sobre o porquê do Dia da Consciência Negra, resgatando algumas histórias e lutadores que nos representam nessa luta”, conta Ana Santos, professora do Colégio. No Centro Cultural Casarão, teatro localizado dentro da comunidade, as famílias assentadas puderam assistir apresentações de roda de capoeira, peças teatrais, maracatu, danças e declamações de poesias feitas pelos educandos e educandas.

Colégio do Campo Estrela do Oeste. Foto: Arquivo MST/PR

O Colégio Estadual do Campo Estrela do Oeste, município de Santa Maria do Oeste-PR, realizou uma atividade cativante para todos, incentivando a leitura, interpretação e diálogos. Alguns estudantes, junto a professores, confeccionaram material com frases que cobriram todas as portas do Colégio. No momento dos intervalos, nos períodos da manhã e da tarde, educandos e professores se reuniram para dialogar sobre preconceito, racismo e discriminações que existem e a importância de lutar por respeito, especialmente no momento em que vivemos em nosso país.

Na Escola Itinerante Valmir Motta de Oliveira, localizada em Jacarezinho-PR, as atividades foram diversas: trabalhos de pesquisa de representatividade negra na mídia; debates sobre as religiões de matriz africana e racismo; trabalhos com literatura afro-hispânica; construção de painéis, pinturas, máscaras africanas, brincadeiras e brinquedos e jogos afro, pintura facial, máscaras; estudo étnico do continente africano; construção de mapas étnicos; estudo da culinária afro-brasileiras; e dinâmicas para problematizar a questão de raça/etnia.

Em Rio Bonito do Iguaçu, na Escola Itinerante Herdeiros do Saber II, localizada no acampamento Herdeiros da Terra de 1º de Maio, as atividades foram de leitura e interpretação de texto sobre a história do dia da Consciência Negra e a escravidão no Brasil, produção de cartazes, até a confecção de bonecas Abayomi – que tem origem iorubá, feitas em tecido preto. Depois de entender o significado e participarem da produção coletiva das bonecas, cada criança levou uma para casa.

“Esses processos formativos têm contribuído de maneira significativa na vida dos/as sujeitos, nos diferentes espaços. Seja no dia a dia da escola, da casa ou da comunidade. É necessário trabalhar esses temas permanentemente, já que o racismo, o preconceito e a discriminação ainda são recorrentes na sociedade que vivemos”, completa Luciane Olegário da Silva, dirigente do Setor de Educação do MST.

*Editado por Fernanda Alcântara