Ruy Mauro Marini e a teoria marxista da dependência
Por Matheus Gringo de Assunção*
Para Página do MST
No dia 5 de julho de 1997 nos deixava um grande militante e intelectual revolucionário, que contribuiu para a construção de uma original interpretação da América Latina, que lançava as bases para entender as origens de nosso subdesenvolvimento, e mais do que isso, contribui para ação revolucionária em nosso continente.
Ruy Mauro Marini nasceu em 1932 em Barbacena, Minas Gerais. Em meado da década de 1950 inicia seus estudos acadêmicos na Faculdade de Direito da Universidade do Brasil (hoje Universidade Federal do Rio de Janeiro) e neste período também se dedica ao estudo das ciências sociais na Fundação Getúlio Vargas.
No início da década de 1960, com uma bolsa do governo francês, Marini parte para Paris e continua seus estudos no campo da sociologia, aprofundando seus estudos sobre Marx e Lênin. No retorno ao Brasil se liga ao grupo marxista Política Operária (Polop).
Em 1964, com o golpe militar no Brasil, Marini partiria para seu primeiro exílio. No México desenvolve seus estudos sobre a América Latina, primeiro no Colégio do México e posteriormente na Universidad Nacional Autonoma do México (UNAM). Neste período publica “Subdesenvolvimento e Revolução”, que traz uma análise sobre a ditadura militar e as escolhas da esquerda revolucionária latino americana neste período.
Com o aumento da repressão no México, Marini passaria para seu segundo exílio, desta vez no Chile. Neste período participa do Movimento de Esquerda Revolucionário (MIR) e se incorpora ao Centro de Estudos Socioeconômicos (CESO), naquele tempo um dos principais centros de formação política e intelectual do continente latino americano.
Em 1972 é publicado uma das principais obras da teoria da dependência, o livro “Dialética da Dependência”, que lança as bases para uma interpretação marxista da formação dependente latino americana e como este processo constitui uma maneira específica de reprodução do capitalismo na América Latina, que exacerba as contradições do capitalismo e modifica as relações de produção nas nações dependentes para assegurar a reprodução ampliada da dependência, assim, nos termos de Marini em Dialética da Dependência afirma que: “a consequência da dependência não pode ser, portanto, nada mais do que maior dependência, e sua superação supõe necessariamente a supressão das relações de produção nela envolvida”.
Com o golpe no Chile, em 1973, que instaurou a ditadura de Pinochet naquele país, Marini é obrigado a ir para seu terceiro exílio. De volta ao México assume como professor do Centro de Estudos Latino Americanos da UNAM. Seu retorno ao Brasil se daria apenas na década de 1980, com seu retorno definitivo em 1986.
Realidade da América Latina
A teoria marxista da dependência, justamente por seu rigor no método desenvolvido por Marx, possibilitou uma teoria original de interpretação da América Latina, desenvolvendo categorias de análise próprias, que reflete a realidade concreta de nosso continente.
É a partir disso que podemos entender que aquilo que a CEPAL havia denominado de deterioração do termos de troca, em essência se trata de uma transferência de valor onde parte do mais-valor produzido aqui fará parte da dinâmica de acumulação de capital nos países centrais. No entanto, para compensar essa perda de mais-valor as burguesias que exploram os trabalhadores e trabalhadoras nos países dependentes necessitam superexplorar a força de trabalho, remunerando os trabalhadores e trabalhadoras abaixo do valor de reprodução da força de trabalho.
Neste sentido, é a necessidade da superexploração da força de trabalho que aprofunda uma outra contradição nos países dependentes, na medida em que a América Latina se insere no mercado mundial de maneira subordinada, ou em função das necessidades de acumulação dos países centrais, opera-se uma cisão do próprio ciclo do capital nas economias dependentes, qual seja, “a produção latino americana não depende da capacidade interna de consumo para sua realização […] cujo efeito é fazer com que apareça de maneira específica na economia latino-americana a contradição inerente à produção capitalista em geral, ou seja, a que opõe o capital ao trabalhador enquanto vendedor e comprador de mercadorias”, afirma Marini em Dialética da Dependência.
Legado Teórico
O legado teórico de Ruy Mauro Marini e dos autores da teoria marxista da dependência tem um papel muito importante para a ação política e a estratégia da classe trabalhadora, na medida em que entende que os problemas do subdesenvolvimento latino americano não se deve a nenhuma falta de desenvolvimento, ou seja, subdesenvolvimento não é a etapa de um continuum rumo ao desenvolvimento, mas é a forma particular de manifestação das relações capitalistas nos países dependentes.
Deste modo, o desafio para a superação da dependência e do subdesenvolvimento passa necessariamente pela luta para suprimir o próprio capitalismo, que engendra estruturalmente o que nos condiciona à dependência e ao subdesenvolvimento.
*Militante do MST, economista e pesquisador do Instituto Tricontinental
**Editado por Wesley Lima