11 de setembro: uma data para não esquecer jamais!
Por Judite Santos
Da Página do MST
A onda de regimes militares direitistas inundou o continente latino-americano a partir da década de 1960. Diferentes países da região experimentaram amargamente as atrocidades cometidas por estes regimes. Argentina, Brasil, Uruguai, Chile, Bolívia, América Central, quase que completa, vivenciaram entre as décadas de 1960, 1970 e até 1980 esta cruenta trajetória.
Em alguns países a grande repressão chegou ao genocídio para defender os interesses da classe dominante. O processo agudo de polarização das estruturas sociais e enfrentamentos políticos de interesses antagônicos foram eminentes entre revolução e contra-revolução.
O “perigo” do comunismo se alastrara no continente, sobretudo, após o triunfo da Revolução Cubana, em 1959, então, foi necessário fazer a contra-revolução preventiva para deter o avanço das lutas guerrilheiras e a propagação do comunismo na região, assim, os militares tomaram o poder em vários países para massacrar o movimento revolucionário que tomava impulso naquelas décadas.
Neste sentido, a vitória obtida pelo bloco dominante não foi só militar, foi também política e ideológica. Como resultado desse esmagamento prolongado e sangrento, a esquerda levou muito tempo para se recompor, em alguns casos como o Brasil e o próprio Chile, mais de 20 anos.
Em meio à polarização de projetos – guerrilhas versus ditaduras militares – o Chile demonstrou ser possível chegar ao socialismo traçando outro caminho. Foi a primeira vez que se chegara ao socialismo pela “via pacífica” isto é, pela via eleitoral, transcurso, até então, singular na América Latina. Allende foi vitorioso e venceu a contrapelo do que acreditava a grande maioria da esquerda na América Latina.
A Unidade Popular, poderosa coalizão política que aglutinava comunistas, socialistas, grupos radicais e progressistas em torno de um programa eleitoral revolucionário, levou ao poder a esquerda chilena.
O triunfo de Salvador Allende em 4 de novembro de 1970, implicou em mudanças reais e decisivas que avançaram rapidamente. No primeiro ano de governo da Unidade Popular, Salvador Allende adotou medidas radicais, como a nacionalização das empresas de riquezas estratégicas e reduziu pela metade a situação de desemprego, o programa da UP levou a aceleração do plano de reforma agrária e a defesa do território da população indígena Mapuche.
No entanto, este processo não foi capaz de romper com a ordem vigente e mudar definitivamente a correlação de forças a seu favor. Foi preciso enfrentar os inimigos que estavam dispostos a levar a cabo uma das mais cruéis e sangrentas ditaduras militares no continente latino-americano.
Com as mudanças em curso, se levou a cabo a desestabilização do governo de Salvador Allende, financiada pelos Estados Unidos, tal qual se tenta fazer com a Venezuela nos dias atuais. Em dois anos de governo, o movimento contra-revolucionário encabeçado pela oligarquia com participação das forças armadas começam fazer frente a institucionalidade do país e preparar a derrota do governo socialista de Salvador Allende.
Para a sobrevivência da Revolução Chilena, se fazia necessário maior peso do campo socialista para o equilíbrio de poder, mas as condições históricas não estavam à altura das demandas do Chile.
O campo socialista, com exceção de Cuba, não favoreceu o governo de Allende e a ajuda da União Soviética foi muito limitada. Recordemos que o mundo estava em plena Guerra Fria e a União Soviética não podia confrontar os Estados Unidos em sua área de influência, ou seja, América Latina, haja visto o processo de distensionamento entre as potencias hegemônicas.
A Política Exterior de Salvador Allende era claramente anti-imperialista. A aproximação do Chile com Cuba e demais países do campo socialista fez com que os Estados Unidos colocassem em pratica a conspiração para a derrocada do governo socialista. Os EUA precisavam “degolar” o processo revolucionário chileno para impedir uma nova Cuba ou um Vietnã no continente latino-americano.
Desestabilização econômica, boicote e campanha anti-comunista começaram a intensificar-se para derrocar o socialismo de uma vez por todas. Acentuaram-se então as ações que levaram ao ataque final com o bombardeio do Palácio de La Moneda, onde se encontrava o presidente Salvador Allende, com seus fieis camaradas, em pé de resistência no dia 11 de setembro de 1973.
A vitória dos militares se produziu muito rapidamente, dando lugar a mais brutal e sangrenta ditadura militar do nosso continente latino-americano sob o comando do general Augusto Pinochet por quase 20 anos.
Antes de morrer Allende pronunciou suas palavras de despedida a qual agradeceu a lealdade e confiança do povo chileno, mas também manifestou sua clara convicção nas lutas futuras: “Saibam que, antes do que se pensa, de novo se abrirão as grandes alamedas por onde passará o homem livre, para construir uma sociedade melhor”.
Ganhar o governo no Chile não significou ganhar o poder. A Unidade Popular não se preparou a altura para enfrentar um possível golpe contra- revolucionário. Os trabalhadores organizados nos Cordões Industriais fizeram duras críticas ao governo da Unidade Popular por não haver cumprido seu programa de forma radical.
Denunciaram as atrocidades cometidas pela oligarquia contra a classe trabalhadora antes mesmo da concretização do golpe.
Em carta dos Cordões Industriais ao presidente Allende poucos dias antes do golpe, alertaram sobre o caminho forçado que tomava o país e afirmaram de forma contundente que “aqui temos apenas duas alternativas: a ditadura do proletariado ou a ditadura militar”.
Da mesma maneira, o Movimento de Esquerda Revolucionária (MIR), acreditava não ser possível a construção do socialismo no Chile pela via pacífica, para este, havia que radicalizar o enfrentamento à contra-revolução pela via armada.
Lideranças como Miguel Enríquez foram até as últimas consequências ao lado da Unidade Popular mesmo acreditando no caminho mais radical. Após o golpe militar que levou a derrocada do governo de Salvador Allende, o MIR organizou a resistência clandestina contra o governo ditatorial de Augusto Pinochet, mas foram massacrados em menos de um ano.
Os longos anos de ditadura do general Pinochet (1973 – 1990) foi suficiente para impor ao Chile uma política de ultraliberalismo econômico, inaugurando a era do neoliberalismo no continente latino americano, numa clara demonstração de que liberalismo político e democracia não é a mesma coisa que liberalismo econômico.
As grandes Alamedas a que se referia Allende, em suas últimas palavras, não se abriram ainda, será preciso retomar com força a organização popular e a luta permanente contra o sistema de opressão e espoliação do capital, no entanto o povo chileno está mobilizado fazendo frente a crise geral que assola o país, contra as injustiças e repressão para colocar um basta nos resquícios que ainda ficam daquela data histórica.
*Judite Santos é integrante do Coletivo de Relações Internacionais do MST
**Editado por Maura Silva