O lucro não Vale a vida: MST de MG é exemplo de produção e enfrentamento à mineração
Por Comunicação MST-MG
Da Página do MST
“Há somente duas alternativas: ou tratamos nossos solos com amor e carinho, recuperando-os e produzindo alimentos sadios, ou tentamos explorá-los ainda mais e pereceremos por causa da desertificação, da falta de água e dos tóxicos em alimentos, ar e água.” (Ana Primavesi)
No dia 5 de novembro de 2015 rompeu a barragem de fundão, em Bento Rodrigues, Minas Gerais. Em 25 de janeiro de 2019, mais uma tragédia aconteceu com a ruptura da barragem do Córrego do Feijão, em Brumadinho, que resultou em mais de 200 mortes e dezenas de desaparecidos. Nesse cenário, diversas famílias camponesas foram atingidas e mais de 40 mil hectares de terra ainda precisam ser recuperados. Pelo menos nove áreas de Reforma Agrária, entre assentamentos e acampamentos do MST, foram atingidas pelos dois crimes.
A quarentena do COVID-19, iniciada no primeiro trimestre de 2020, agrava ainda mais a situação das famílias que vivem próximas ao Rio Doce e ao Paraopeba. Além da convivência com o aumento dos casos de dengue, doenças de pele e respiratórias, elas estão em isolamento social em regiões dominadas pela mineração predatória. Contudo, o MST segue produzindo e comercializando alimentos em todo o estado, como parte do Plano Nacional “Plantar Árvores e Produzir Alimentos Saudáveis”.
O Movimento, a partir da construção da Reforma Agrária Popular, apresenta como missão a preservação e recuperação ambiental dos territórios, aliada à produção de alimentos saudáveis, tendo como matriz tecnológica a agroecologia para atender as necessidades das famílias no campo e cidade. Nesse momento de crise, o MST vem ampliando a oferta de alimentos agroecológicos, seja com a doação para famílias carentes ou a comercialização de cestas nos centros urbanos. Além disso, os Sem Terra constroem a Jornada de Enfrentamento à Mineração em Minas Gerais que busca apontar os rumos da reconstrução dos territórios degradados pelas mineradoras.
Cultura, produção e responsabilidade social
Como parte da tarefa dos trabalhadores rurais Sem Terra, o MST segue entregando cestas agroecológicas nas cidades de todo o país. Em Minas Gerais, as regionais do Triângulo Mineiro, Zona da Mata e Metropolitana mantém a entrega das cestas agroecológicas como forma de resistência ao modelo de monocultura transgênica e ao uso abusivo de agrotóxicos.
Além de gerarem renda às famílias assentadas e acampadas, essa forma de produção permite que o MST leve o projeto popular de agricultura saudável à população urbana. Vânia Maria é assentada no Vale do Rio Doce, região atingida pelo rompimento da barragem de Mariana. Ela conta que, como a produção foi prejudicada, as famílias tiveram que repensar a vida no território.
“Sigo reorganizando a minha produção. Na época do crime fiquei muito prejudicada e até hoje não está sendo fácil, eles não me deram nem um real para compensar os impactos e ajudar na retomada de renda. Os meus impactos não se encontram no formulário que eles fizeram. Agora é com a cara e a coragem que a gente segue resistindo e reerguendo a produção. Estou aproveitando a quarentena para organizar a produção que mando para o Armazém do Campo em Belo Horizonte, e já pensar essa comercialização aqui na região também, porque já temos demanda”, conta Vânia.
Domingos dos Reis, do setor de produção da regional Metropolitana afirma que o crime da Vale em Brumadinho paralisou totalmente o acampamento Pátria Livre, onde ele mora. E com o coronavírus, as famílias se viram novamente na necessidade de reinventar a produção e a subsistência. Na região, apenas as entregas de produtos não perecíveis, junto com o Armazém do Campo BH foram mantidas. “Nós tivemos que suspender as cestas de consumo, pois a maioria dos nossos colaboradores é idosa e isso só nos deixa mais fragilizados. É nossa responsabilidade cuidar das pessoas”, afirma Domingos.
Com a força da juventude e organização das mulheres Sem Terra, as regiões seguem produzindo arte, cultura e alimentos saudáveis, e são diversas as iniciativas de plantio desde o início da pandemia. Na região metropolitana, a juventude já se envolveu, junto aos demais coletivos das áreas de acampamento e assentamento, em mais de cinco plantios coletivos de árvores frutíferas e de reflorestamento. Segundo Agatha Azevedo, da direção regional e do Coletivo CCJLGBT, “o protagonismo da juventude na construção de outras formas de luta e outros territórios possíveis é uma marca do trabalho do MST na região, que vive tanta contradição cotidianamente. Enfrentar é preciso”.
Semeando agroflorestas e resistências coletivas
Em meio às várias crises, o MST se desafia e assume junto com toda a sociedade a tarefa de florestar novamente a bacia do médio Rio Doce, do Rio Paraopeba e diversas regiões do estado, atingidas pela mineração, pela extração, pelo uso indevido da pecuária, pela especulação imobiliária, pela seca e pelo agronegócio.
Já iniciado, o Programa Agroecológico do MST na bacia do médio Rio Doce, que se trata de uma conquista junto à Fundação Renova, busca reflorestar e desenvolver a vida nas margens do rio e alavancar a economia e a qualidade de vida dos habitantes.
Fábio Nunes, do setor de produção da regional Metropolitana e coordenador do viveiro de mudas da região, afirma que um dos compromissos do MST ao semear agroflorestas e desenvolver projetos de reflorestamento é enfrentar o governo de Jair Bolsonaro, com propostas políticas que atendam às necessidades da classe trabalhadora. “O avanço da COVID-19 e a consequente situação de isolamento social nos mostra a importância de repensar o modelo de desenvolvimento adotado para agricultura. Fica claro que a exploração dos recursos naturais pelos grandes complexos agroindustriais e mineradoras para comercialização nas bolsas de valores não atende as necessidades do povo”, explica.
Para Aguinaldo Batista, da direção do setor de produção, o Programa Agroecológico tem um potencial de revisão cultural na maneira de uso, posse e propriedade da terra, e serve para fazer o enfrentamento político necessário à sobrevivência, principalmente em tempos de COVID-19. Segundo ele, o baixo uso de tecnologias industriais na região “eleva a condição de retomada de saberes populares e históricos, e é a oportunidade de fortalecer uma rede dos pequenos donatários de terra na região, especialmente dos povos tradicionais do campo”.
Além dessas ações, o Movimento também tem construído propostas na área da educação, através dos cursos de agroecologia e das turmas de formação de formadores, distribuídas na Bacia do Rio Doce e no todo estado de Minas Gerais. Nesse sentido, o MST reafirma a necessidade de repensar o modelo de produção no campo, em defesa da vida e da existência da classe trabalhadora.
*Editado por Solange Engelmann