Devastação Ambiental

Política ambiental de Bolsonaro ameaça a produção de alimentos, denuncia MPA

Maria Cazé, da coordenação nacional do MPA, analisa as consequência da política de destruição ambiental de Bolsonaro para o meio ambiente e a sobrevivência das camponesas e camponeses no país
Camponeses do MPA do Piauí cobram o direito à vida, vacina já, auxílio emergencial de 600 reais e o Fora Bolsonaro! Foto: Maria José da Costa

Por Solange Engelmann
Da Página do MST

A preservação e recuperação das florestas, dos rios, da terra e dos animais, é fundamental para garantir a manutenção dos bens comuns e a sobrevivência dos povos indígenas, tradicionais, pequenos agricultores e camponeses. Mas, no Brasil, o meio ambiente se encontra sob ataques desde o golpe de 2016, contra a democracia.

Porém, os ataques ao meio ambiente se intensificam, ainda mais, com a política de devastação ambiental e destruição da Amazônia e dos demais biomas brasileiros, adotada pelo governo Bolsonaro com ajuda do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Este, investigado pela Polícia Federal por suspeitas de crimes de corrupção, advocacia administrativa, prevaricação e facilitação de contrabando de madeira.

Nesse contexto, em entrevista exclusiva, a camponesa e agrônoma Maria Cazé, que integra a coordenação nacional do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) e faz do coletivo de soberania alimentar e abastecimento popular, analisa e denuncia as consequências da política de destruição ambiental de Bolsonaro.

Maria, que vive na comunidade Serra dos Morros, no município de Francisco Santos, região centro sul do semiárido piauiense, também fala sobre os impactos da destruição do meio ambiente nas comunidades de pequenos agricultores e camponeses diante do aumento da liberação de agrotóxicos e relaciona a destruição das florestas com o avanço do agronegócio nessas áreas devastadas, com culturas que não alimentam a população brasileira, justamente em um período de aumento da fome no país.

“O nosso país, a partir desse governo genocida tem optado por um caminho que leva à destruição de bases fundamentais da vida”, aponta ela.

Confira.

Maria Cazé, camponesa e agrônoma, integra a coordenação nacional do MPA e coletivo de soberania alimentar e abastecimento popular. Foto: Arquivo pessoal

Como você enxerga a questão do meio ambiente no Brasil atualmente? Há algo a comemorar?

No Brasil atual o que podemos ver é um país coberto de fumaça e de nuvens de veneno, de agrotóxicos. Essas duas situações que responsabilizam o governo federal através de uma política genocida, que mata pessoas, não só pelo novo Coronavírus e da fome, que assola quase 120 milhões de brasileiros/as, mas mata também a partir dos venenos liberados. Estamos em meio a uma conjuntura de recordes de números de agrotóxicos liberados no país. E também mata, a partir da desterritorialização de povos, comunidades, populações, a partir do avanço das queimadas criminosas, que tem como um dos articuladores dessa política do fogo o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles.

Como a política genocida do governo Bolsonaro tem impactado o meio ambiente, a preservação da Amazônia e da biodiversidade no país?

Se fizermos uma retrospectiva da situação ambiental do nosso país, em 10 de agosto de 2019 tivemos a decretação do dia do fogo, foram grupos bolsonaristas, que atearam fogo na Amazônia pra ver, de fato a floresta queimar. E essa foi uma ação extremamente coordenada, justamente num período em que se fazia um debate político em torno da flexibilização das leis ambientais, de proteção ambiental no país. Então, foi um recado que os grupos bolsonaristas deram ao povo brasileiro de qual é o marco jurídico que eles querem para o Brasil. E esse marco jurídico é simplesmente não haver proteção nenhuma para as florestas no país. Seguiu-se em 2020 com o aumento das queimadas, inclusive comprometendo, tanto a Amazônia quanto o Pantanal e o Cerrado. Então, nós perdemos áreas enormes de florestas pras queimadas, queimadas intencionais, que a gente pode considerar como uma ação política destrutiva e genocida do governo Bolsonaro e seus grupos apoiadores, incluindo o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles.

Qual o marco dessa opção por uma política de destruição do meio ambiente, que foi intensificada na gestão do governo Bolsonaro?

Estamos assistindo desde o golpe de 2016, uma ação política destrutiva, com a opção pelo desmatamento e as queimadas. Em 2021 segue-se essa mesma perspectiva de desmatamento e tanto de 2019, quanto em 2020, 2021, o objetivo é um só, destruir a floresta pra disponibilizar áreas desmatadas para um mercado considerado “extremamente promissor”, que é o mercado de produção de commodities de mercadorias, principalmente carne de gado, o boi, a soja, que são dois produtos colocados no lugar da floresta. É importante situar isso, pra que o povo brasileiro possa entender, se a gente for analisar os números do que ocupa hoje as áreas que antes eram florestas, vai ver que se relaciona diretamente, com a questão da produção de commodities. Tivemos um aumento considerável das áreas de produção de soja, hoje temos no Brasil, mais ou menos, 38 milhões de hectares produzindo soja, aproximadamente 18 milhões de hectares produzindo milho, aproximadamente 170 milhões de hectares produzindo pastagem.

Ou seja, essa floresta é derrubada exatamente pra botar essa mercadoria. Portanto, essa é uma situação criminosa. Hoje, em 2021, podemos dizer que o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, faz parte dessa quadrilha, que tem derrubado milhões de hectares de floresta na Amazônia, mas também no Pantanal e no Cerrado.

Aliado à isso, também houve novas liberações de agrotóxicos, muitos já proibidos em países Europeus e classificados como potencialmente cancerígeno pela Organização Mundial da Saúde (OMS)?

Desde o governo Temer, tivemos liberado no país mais de 1.200 novos tipos de agrotóxicos, inclusive com alteração de classificação de agrotóxicos, justamente pra facilitar a comercialização, ludibriando as pessoas, de que um agrotóxico que antes era extremamente perigoso, hoje é considerado medianamente perigoso.

Esses agrotóxicos liberados estão diretamente relacionados com essa política de devastação das florestas, porque ao desmatar, derrubar a floresta em pé, e colocar lá a pastagem e/ou a soja, vai acarretar um aumento considerável do volume desses venenos, que são utilizados nessas lavouras.

Portanto, é uma casadinha que beneficia o mercado internacional, as transnacionais dos venenos, a partir da devastação da floresta Amazônica, do Cerrado, do Pantanal e de outros biomas. O nosso país, a partir desse governo genocida tem optado por um caminho genocida, que leva à destruição de bases fundamentais da vida.

Como a política ambiental do governo Bolsonaro, de aumento no desmatamento, desmonte das políticas de proteção ambiental, incentivo à destruição da Amazônia e liberação da mineração, tem afetado os pequenos agricultores no país?

Tem colocado os camponeses e camponesas numa condição de violência muito grande. Nos coloca numa condição de disputar cotidianamente o nosso território, de disputar a terra, disputar a água, disputar o lugar que a gente vive com o capital internacional, com a milícia, com as transnacionais.

Essa disputa é extremamente maléfica, porque impede que os camponeses e camponesas, os povos do campo, das águas e das florestas cumpram com sua principal missão, que já é árdua e em muitos lugares, extremamente penosa: ser camponês e camponesa produzindo alimentos.

Quando você tem, às vezes, uma arma apontada pra cabeça; quando tem um cara com documento fajuto, dizendo que é o dono da terra que você está; quando tem o fogo correndo atrás de você, queimando as florestas; quando tem o envenenamento dos rios, a mortandade de peixes, a mortandade de animais, o desaparecimento de espécies; enfim, uma conjuntura dessa, torna a missão de produzir alimentos, a missão de viver no campo, extremamente árdua.

Quais os principais desafios impostos pela pandemia aos pequenos agricultores do MPA, em relação à sobrevivência e preservação do meio ambiente?

Os desafios são grandes, primeiro porque o governo federal destruiu todas as políticas públicas de apoio à agricultura camponesa e à produção de alimentos. Isso colocou o campesinato numa condição de vulnerabilidade muito grande, e frente à pandemia então, mais ainda.

Não temos mais nem os mecanismos de apoia à produção, tão pouco de apoio à comercialização e ainda somos desafiados a alimentar. Isso coloca uma pressão grande sobre o campesinato, que tem que dar conta de produzir alimentos pra alimentar esse povo todo, porque a pandemia também mostrou que o agronegócio não colocou um único quilo de alimento na mesa que quem estava com fome. Ao contrário, eles fazem a propaganda de mais supersafras, e quando a gente vai ver, as supersafras dizem respeito basicamente à soja, milho, eucalipto, cana-de-açúcar, gado e um pouquinho de arroz e feijão, e parte disso, produzido pelo campesinato.

Temos a pressão de alimentar o povo que passa fome, que tá em situação de insegurança alimentar, os desempregados, as mães de família, que moram nas pontas de ruas nas cidades. E um campesinato sem apoio de política pública nenhuma.

Os desafios colocados são muito grandes. Então, hoje a gente pode dizer: “que os verdadeiros heróis desse país, somos nós, os camponeses e camponesas”. Nós nunca arredamos o pé! Ao longo da história, o campesinato sustentou e segurou todas as crises existentes, incluindo no Brasil a de 2008, 2009, quando os valores dos alimentos foram à estratosfera no mundo todo, e aqui no Brasil, quando o Lula falou que era “marolinha”, é justamente, porque recaiu sobre o campesinato a missão e a tarefa de segurar o preço dos alimentos.

Agora, nós vamos desistir? Não, temos que seguir lutando por investimentos pra produção de alimentos, lutando pelo auxílio emergencial de 600 reais, lutando contra a política do governo federal de destruir, desmatar, matar o povo, o meio ambiente, as florestas, os rios. Essa é a política genocida do governo Bolsonaro.

No ano passado o MST lançou o Plano Nacional Plantar Árvores e Produzir Alimentos Saudáveis, que visa o plantio de 100 milhões de árvores em dez anos. Para os pequenos agricultores do MPA, qual a importância da produção de alimentos de forma sustentável, aliado à recuperação do meio ambiente para a sobrevivência e permanência no campo?

O MST está de parabéns de ter puxado uma ação tão importante no Brasil de hoje, nós, os camponeses e camponesas do MPA nos sentimos partes desse plano e em muitos lugares onde estamos, já plantamos e vamos plantar parte dessas 100 milhões de árvores. Porque esse é um plano que representa a todos nós, que estamos no campo, nas águas e nas florestas. E é fundamental, porque essas 100 milhões de árvores darão a condição ao povo brasileiro de recuperar parte desse patrimônio que foi destruído e está sendo destruído, desde o golpe de 2016, e principalmente no governo Bolsonaro.

*Editado por Fernanda Alcântara