LGBT Sem Terra

Curso Saber Protege: uma experiência de formação em saúde popular à população LGBT do campo

O curso aconteceu entre os dias 7 e 14/8, em Salvador, e contou com a participação de 100 LGBT Sem Terra de 18 estados
Foto: Cadu Souza

Por Wesley Lima
Da Página do MST

É parte constitutiva do projeto de Reforma Agrária Popular, defendido pelo MST, o tema da diversidade sexual e de gênero. Assim como pensar todas as dimensões da existência desses sujeitos nas áreas de assentamentos e acampamentos, inclusive o direto à saúde. Essa afirmação apareceu como síntese no  Curso de Formação de Educadores e Educadoras Populares em Saúde LGBTI+ do Campo e Prevenção às IST/HIV/AIDS.

O curso aconteceu entre os dias 7 e 14/8 no Centro de Treinamento da Secretaria de Desenvolvimento Rural (SDR), localizado em Salvador (BA). Fruto de uma parceria com a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o espaço, que teve início com o mapeamento dos sujeitos LGBTI+ no campo, segue construindo processos de formação, desta vez nas áreas do MST.

Na programação, os 100 participantes de 18 estados, discutiram temas como: “Educação Popular em Saúde”, “Sistema Único de saúde e a política de saúde para população do campo”, “Prevenção e promoção de saúde – concepção de saúde do MST”, “Saúde da População LGBTI – Prevenção às IST e HIV/AIDS”, “Saúde mental e autocuidado das LGBTI+”, “A atual conjuntura brasileira” e a “História do Coletivo LGBT Sem Terra e desafios da pauta no MST”.

Alessandro Mariano. Foto: Cadu Souza

Ao final das atividades, Alessandro Mariano, da direção nacional do MST pelo Coletivo LGBT, afirma que a semana de atividades e estudo foi intensa e repleta de aprendizados. “Estamos finalizando mais um curso. E essa semana tivemos acesso a um conjunto de discussões sobre o direito à saúde, entendendo o Sistema Único de Saúde [SUS], mas entendendo também a dimensão de pensar o direito integral a saúde para os sujeitos LGBT do campo, e também, a própria promoção da saúde e a prevenção as IST, HIV e AIDS”.

Para ele essas questões precisam ser encaradas como um direito e conectadas às identidades enquanto LGBTQIA+, “que resistem e existem no campo brasileiro”.

Foto: Cadu Souza

Nesse mesmo sentido, Mariano sinaliza também é que parte integral do projeto de reforma agrária para o campo articular o tema da saúde com a diversidade sexual e de gênero. “Não podemos discutir a Reforma Agrária Popular separada da diversidade sexual e de gênero. Elas caminham lado a lado e o Coletivo LGBT do MST tem sinalizado isso para o conjunto do Movimento nesses mais de oito anos de existência nas instâncias”, explicou.

Sobre a importância desse espaço, Anakeila Stauffer, da Fiocruz, destacou o papel da escola na educação politécnica, como um instrumento capaz de possibilitar o conhecimento científico para todas e todos e afirmou a necessidade da apropriação do conhecimento através do curso.

Foto: Cadu Souza

“Entendemos a saúde numa concepção ampla e como ela se materializa na vida da população LGBTI+ do campo. Essa concepção norteia a construção desse espaço e a necessidade de avançarmos no estudo coletivo e na formação de educadores e educadoras, agentes populares, para organizar e seguir na luta por uma saúde integral e universalizada a partir dos seus territórios de atuação.”

Autocuidado

Os espaços de estudo em plenária foram acompanhados também por momentos de autocuidado, onde realizaram algumas práticas em saúde, como “massagem e ventosas”, “ervas e cuidado espiritual” e o “corredor do cuidado”. Esses e outros espaços foram construídos em parceria com o Setor de Saúde do MST.

Com foco no processo de troca, construção coletiva do conhecimento em saúde e nas práticas em saúde, Edinaldo Novaes, da direção nacional do MST pelo setor de saúde, destacou o papel do autocuidado na construção da luta e a importância do curso como um espaço que tem acumulado coletivamente para se pensar os sujeitos LGBTI+ no campo.

Ele afirma que é preciso cuidar não apenas “do nosso corpo físico, mas também das dimensões da saúde de maneira integrada. Precisamos pensar a saúde antes, o cuidado com amor e a construção dos nossos corpos como territórios também em disputa”.

Cultura de resistência

Sued, multiartista. Foto: Cadu Souza

As atividades artísticas e culturais também estiveram presentes nas atividades de formação do curso. O “Sarau Arte e Rebeldia dos Afetos”, realizado em uma das noites do curso, contou a presença da multiartista Sued Hosaná e a noite cultural com Carine Narciso e Nola Criola.

Durante sua apresentação, Sued ocupou o curso denunciando a violência contra os corpos trans e negros, demarcando a necessidade de luta coletiva. “Nossos corpos e nossas vozes não podem ser silenciados e a arte é um espaço de expressão dessa luta. Meu corpo está a serviço da arte e a arte está a serviço das milhares de vozes LGBTQIA+ que sofrem cotidianamente com a violência”, explicou.

Próximos passos

Ao final, os participantes do curso, retornaram para suas áreas com o objetivo de executar atividades práticas no cuidado e no debate em torno da saúde da população LGBTI+ no campo. Para Mariano, essa semana “foi cheia de conhecimento, muitas mesas temáticas de debates, mas também espaços de autocuidado em saúde, contando com psicólogos, com diversos profissionais de saúde do próprio MST que estiveram com a gente”.

Ele conta ainda que “estivemos juntas e juntos aqui pensando, construindo ações, que serão desenvolvidas em todo o país. Na medida que terminamos esse curso, nós voltamos para nossas áreas e vamos compartilhar conhecimento com outras LGBT, com as nossas comunidades.”

*Editado por Fernanda Alcântara