Despejo Zero
MST reconhece importante medida do STF sobre despejos, mas avalia que não resolve o problema
Por Solange Engelmann
Da Página do MST
Reivindicado por um processo de lutas dos movimentos sociais do campo e da cidade, que integram a campanha Despejo Zero, na última segunda-feira (31) o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, indeferiu o pedido de prorrogação da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 828, que impede despejos em áreas ocupadas no país durante a pandemia. Por outro lado, de forma inédita, Barroso decidiu pela humanização das reintegração de posse no Brasil, ao criar um regime de transição para a questão, ordenando a criação de comissões especiais de mediação nos tribunais para acompanhar cada reintegração.
Sobre essa importante vitória dos movimentos e organizações populares da campanha Despejo Zero, ainda que de forma parcial, mas fundamental por criar um “regime de transição” para mediação da questão, Ayala Ferreira, da coordenação nacional e do setor de direitos humanos do MST, reconhece a importância da medida, mas avalia que não revolve o problema dos despejos no país.
“Avaliamos como uma importante decisão; primeiro pelo contexto que estamos enfrentando: pandemia da Covid-19 e de crise generalizada, que levaram cerca de 900 mil pessoas a sofrerem o risco de serem despejadas em áreas rurais e ocupações urbanas. No entanto, não consideramos uma decisão que resolva nossos problemas”, afirma.
Um levantamento da Campanha Despejo Zero mostra que 898.916 pessoas no Brasil correm o risco de sofrer despejos a qualquer momento com o fim da vigência da ADPF 828, que impedia dos despejos forçados durante a pandemia. Entre elas estão 154 mil são crianças.
No momento, o MST também tem cerca de 80 mil famílias Sem Terra que vivem em acampamentos em todo o país, de forma precária e provisória. Desse total, aproximadamente 35 mil famílias correm o risco de serem despejadas a qualquer momento, a partir da suspensão da ADPF 828.
Para Ayala, a solução para resolver as ameaças eminentes de despejos pelo país depende da retomada de uma ampla e correta política de distribuição de terras e moradias às famílias sem-terra e sem-teto, “que precisam de reforma agrária e uma reforma urbana, voltar pra pauta e centralidade dos governos.”
Canais de diálogo
Por outro lado, as organizações da Campanha Despejo Zero ressaltam a decisão do ministro do STF como uma importante vitória popular, ao sinalizar com a criação de canais de diálogo e mediação a partir de Tribunais de Justiças (TJs) e Tribunais Regionais federais (TRFs) nos estados para analisar cada caso de ameaça de despejo e obrigar a realização de reuniões de mediação e a oitiva (escuta) de todas as partes envolvidas antes da determinação de um despejo, por meio de uma reintegração de posse.
“O importante da decisão nesse momento de transição e incertezas políticas é a possibilidade de se criar canais de diálogo entre as partes interessadas com a mediação do estado por meio dos agentes do poder judiciário e executivo. Como criar mecanismos que garantam direitos fundamentais das famílias? Essa é uma das questão que precisaria ser respondida antes da decisão de despejar. Com a decisão poderemos evitar muitos conflitos e de colocar as famílias de trabalhadores rurais e urbanos em situação de extrema vulnerabilidade”, avalia Ayala.
Nesse sentido, movimentos sociais e organizações populares, como o MST, por exemplo, podem recorrer aos canais jurídicos nos estados para a mediação e escuta das famílias ameaçadas de despejo, em busca de preservar o direito à garantia da moradia e à preservação da vida dessas famílias antes realização dos despejos?
Ayala orienta que, na medida em que o centro dessas decisões foram deslocados para os estados nos TJs e TRFs, os Sem Terra do MST nos estados e locais com áreas ocupadas e ameaçadas de despejos.
Devemos incidir por meio de ofícios e pedidos de audiências para formação das comissões, mais aprofundadas que comissão de conflitos fundiários”.
Enquanto isso, a dirigente também chama atenção para a necessidade dos movimentos sociais atuarem no contexto nacional para cobrar, monitorar e fiscalizar o trabalho dessas comissões estaduais que buscam resolver conflitos e diminuir os despejos forçados e o desrespeito à moradia e à vida dessas famílias em situação de vulnerabilidade.
“Ao mesmo tempo, incidir para no âmbito do CNJ [Conselho Nacional de Justiça] para criar uma comissão de diálogo e acompanhamento das comissões nos estados e sobretudo debatermos qual o conteúdo da decisão e de resolução de conflito; compreendermos a natureza de transição para se efetivar um despejo, que minimamente respeite os direitos fundamentais daquelas famílias a serem despejadas”, conclui Ayala.
*Editado por Fernanda Alcântara