Crimes

Pulverização aérea de agrotóxicos atinge famílias assentadas no Pontal do Paranapanema/SP

Em duas últimas semanas foram registrados dois crimes socioambientais na região, com perda na produção de alimentos saudáveis, morte de abelhas e peixes
Pulverização mata peixes de famílias assentadas na região. Foto: MST Pontal do Paranapanema

Por Coletivo de Comunicação do MST no Pontal do Paranapanema
Da Página do MST

O Pontal do Paranapanema, região localizada no extremo Oeste do estado de São Paulo, possui 117 assentamentos de Reforma Agrária conquistados por meio da luta pela terra, protagonizada por trabalhadores e trabalhadoras Sem Terra ao longo dos anos de 1990 e início dos anos 2000. Ainda hoje, o MST atua na região para conquistar os mais de 500 mil hectares de terras públicas devolutas para a Reforma Agrária.

As famílias assentadas, ameaçadas pela contaminação ambiental, têm denunciado os recorrentes casos de pulverização aérea próxima aos assentamentos rurais e as manobras das aeronaves sobre as áreas de produção de alimentos e sobre as casas onde essas famílias vivem.

No dia 16 de fevereiro foram registrados casos de perda da produção de apicultura e piscicultura nos assentamentos Chico Castro Alves e Nova Conquista, em Martinópolis. E na última quinta-feira (23), foi registrado relato no assentamento Dom Tomás Balduíno, em Sandovalina. Casos semelhantes já vêm ocorrendo com produtores de no município de Mirante do Paranapanema, Pirapozinho, Teodoro Sampaio e outros municípios.

Luta pela Terra na região

O histórico de luta pela terra na região sempre foi marcado pelo intensos conflitos fundiários. Hoje, além da luta para alcançar novas áreas para a Reforma Agrária, as famílias lutam contra a pulverização aérea de agrotóxicos que há anos tem atingido a saúde humana e ambiental. Na região encontram-se cerca de 400 mil hectares em áreas cultivadas com a monocultura da cana-de-açúcar. Essa cana-de-açúcar chega até a borda dos assentamentos rurais sufocando os territórios camponeses com suas estratégias de ampliação de produtividade e uso intensivo de agrotóxicos.

Estudos desenvolvidos pelo Centro de Estudos em Educação, Trabalho, Ambiente e Saúde (Coletivo CEETAS de Pesquisadores) (nota 1), que nos últimos dez anos tem se dedicado à pesquisa científica sobre os impactos socioambientais da expansão da produção canavieira na região do Pontal, apontam que:

“(…) o modelo químico-dependente, âncora do processo de mecanização da cana-de-açúcar, revela-se nefasto e causador de uma lista sem fim de problemas e consequências para os trabalhadores diretamente envolvidos, para a sociedade e o meio ambiente, em geral.” Nesse contexto, o Centro de Estudos revela um “elevado consumo de princípios ativos e agroquímicos em geral, na 10ª Região Administrativa de Presidente Prudente, que alcançaram cifras alarmantes, o que nos estimula a repensar os 3 milhões de litros de princípios ativos que são lançados todos os anos ou os 300 milhões de litros de calda tóxica que se misturam com o ar, aos sedimentos, à capa de solo, se volatilizam, percorrem os vales e a extensa malha da rede hidrográfica (águas superficiais), para uma população de aproximadamente 1 milhão de habitantes, em 2,5 milhões de hectares, que atingem os aquíferos, os solos, as plantações, os animais, os humanos etc., e que reserva a média per capita de 300 litros para cada habitante/ano.”

É importante observar o histórico de ocupação do Pontal do Paranapanema com a cana-de-açúcar nos últimos períodos. Como demonstram os mapa a seguir, a área de produção canavieira cresceu significativamente.

Mapeamento e Análise do Território do Agrohidronegócio canavieiro no Pontal do Paranapanema – SP. Fonte: Unesp/Presidente Prudente

O pesquisador Fernando Henrique Camargo Jardim, ao estudar as condições climatológicas da região e as condições legais para a aplicação de agrotóxico via aérea (nota 2) concluir que, não há viabilidade para esse tipo de pulverização na região. “Após a análise de dados de cinco estações meteorológicas automáticas de observação de superfície, instaladas no Pontal do Paranapanema ou limítrofes à esta área, em comparação com os parâmetros meteorológicos recomendados para esta atividade, indicaram que em raríssimos momentos há combinação concomitante dos fatores velocidade do vento, umidade relativa do ar e temperatura atmosférica, de modo a possibilitar a utilização do avião agrícola para tal fim. (…) Em todas as estações analisadas os resultados são praticamente idênticos e mostram que não é possível a utilização da aviação agrícola para pulverização aérea de agrotóxicos no Pontal do Paranapanema, sem a concreta e real possibilidade da ocorrência de deriva dos venenos aspergidos sobre os canaviais (…).”

Rosana Abbud Olivete, advogada e pesquisadora da área, em pesquisa de mestrado (nota 3) sobre o tema constatou, com base em Inquérito Civil (IC 30/09) presidido pelo Ministério Público Estadual (MP/SP) que “houve inúmeras perdas de produção dos sericicultores e demais produtores localizados no entorno de usinas agroindústrias situadas nas Comarcas, que foram objeto de estudo: Pirapozinho (abrangendo os municípios de Estrela do Norte, Narandiba, Sandovalina, Tarabai e Pirapozinho) e Mirante do Paranapanema, no estado de São Paulo, e que foram ocasionadas pela atividade de pulverização aérea realizadas em seus plantios de cana-de-açúcar (…)”.

O MST no Pontal do Paranapanema denuncia o monocultivo da cana-de-açúcar, o uso indiscriminado de agrotóxicos e a grilagem de terras na região. As terras devolutas devem ser destinadas para a Reforma Agrária para que os trabalhadores e as trabalhadoras Sem Terra possam viver com segurança e se dedicando à produção de alimentos saudáveis, produzidos com base na agroecologia.

Notas

1. Pesquisa financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Pailo (FAPESP Processo 2012/23959-9).

2. Pesquisa de Mestrado Profissional em Geografia, disponível em: https://repositorio.unesp.br/handle/11449/182219

3. Pesquisa de Mestrado Profissional em Geografia, disponível em: https://repositorio.unesp.br/handle/11449/192137 

*Editado por Solange Engelmann