LGBT e Agroecologia
“A Reforma Agrária Popular só acontecerá se respeitar os corpos e eliminar a violência”
Por Wesley Lima
Da Página do MST
Na tarde desta quinta-feira (15), o MST realizou mais um espaço de lançamento da Campanha Permanente Contra a LGBTI+fobia no Campo. A atividade fez parte da programação do Curso de Agroecologia, Saúde e Diversidade Sexual, que teve início no último dia 13, na Escola Latino Americana de Agroecologia (ELAA), localizada no assentamento Contestado, no município da Lapa (PR).
Com poesia, músicas e em memória aos mártires LGBTI+ Sem Terra, o lançamento emocionou os participantes do Curso e convidados da Escola Latina. A ideia do espaço foi de construir uma mística em torno da Campanha, para impulsionar as iniciativas de lançamento e construção de processos de formação, estudo e enfrentamento à LGBTI+fobia nos assentamentos, acampamentos, escolas, centros de formação, entre outras estruturas do Movimento.
Para subsidiar a construção desse momento, o Coletivo LGBTI+ do MST elaborou uma cartilha e um cartaz da Campanha para que possam ser utilizados como ferramentas que fomentem o processo de organização de ações em torno do enfrentamento à violência. Flávia Tereza, da direção nacional do MST pelo coletivo LGBTI+, diz que a campanha é um espaço de denúncia, mas também de anúncio do projeto político defendido pelo MST: a Reforma Agrária Popular.
“Quando pensamos em violência, pensamos em que corpo? Quando sofremos alguma violência, somos nós, é você é ele? Quem está sendo violentado? O que é violência?”, essas questões foram realizadas por ela para provocar uma reflexão sobre as principais vítimas dos crimes de ódio no Brasil.
Somente em 2021, foram registradas pelo menos 316 mortes violentas de pessoas lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e pessoas intersexo (LGBTI+). Esse número representa um aumento de 33,3% em relação ao ano anterior, quando aconteceram 237 mortes. Os dados constam no Dossiê de Mortes e Violências contra LGBTI+ no Brasil. Entre os crimes ocorridos, 262 foram de homicídios (o que corresponde a 82,91% dos casos), 26 de suicídios (8,23%), 23 latrocínios (7,28%) e cinco mortes por outras causas (1,58%).
Reforma Agrária Popular contra as violências
Para Kelvin Nícolas, do coletivo nacional LGBTI+ do Movimento pelo estado de São Paulo, a Reforma Agrária Popular não deve ser desassociada do processo de construção de novas relações no campo.
Durante o lançamento da Campanha ele destacou também a simbologia da coletividade na construção desse debate e a importância da conspiração. “É nesse coletivo que nós temos construído esses espaços e essa força coletiva para impulsionar o nosso Movimento rumo ao processo de humanização do campo. Humanização essa que só se efetivará, se nós e nossos corpos, fizerem parte desta construção”, destacou Nícolas.
Para ele é central posicionar a Campanha nas comemorações dos 40 anos do Movimento, que acontecerão durante todo o ano de 2024. “Nosso Movimento, rumo a mais um aniversário, tem se dedicado a debater tantos temas, que são muito caros para o conjunto da sociedade, mas que muitas das vezes só um Movimento dessa dimensão e dessa grandeza consegue colocar na ordem do dia temas que mexem com as estruturas de dominação, de opressão e de repressão sobre a terra e sobre os nossos corpos.”
E continua: “nós temos aprendido que a Reforma Agrária Popular só tem sentido se nós compreendermos os corpos, se nós compreendermos as relação humanas que vamos construir a partir disso, se nós compreendermos quem são os sujeitos construtores do nosso projeto coletivo. A reforma agrária só vai acontecer se respeitar os nossos corpos e eliminar a violência. Nós temos entendido que para nós, não nos basta um pedaço de terra, nós também queremos escola, saúde de qualidade. Nós queremos viver dignamente, em plenitude. Compartilhar afetos, amar a terra, assim como se ama a semente ao germinar a terra, que quando entrelaça com ela, faz ela germinar. E quando entrelaçada cria um processo de conspiração, e é esse processo que nós temos feito dentro do coletivo LGBTI+.”
Para o dirigente LGBTI+ do Movimento, esse “processo de conspiração” precisa ser permanente, de maneira cotidiana. “Só é possível chegar aqui, lançando a campanha e debatendo esse tema, porque o movimento entendeu que precisamos colocar em cheque as violências sobre os nossos corpos”, concluiu.
Próximos passos
No ponto de vista metodológico, a ideia é que durante todo o ano de 2023 sejam realizados diversos espaços de lançamento da campanha, com o objetivo de mobilizar e sensibilizar as famílias Sem Terra, militância e dirigentes do Movimento na luta contra todo o tipo de violência.
A campanha prevê ainda, um conjunto de outras ações como conferências online, debates, cursos de formação e articulação com outros movimentos e organizações populares, e parceiros para a construção de uma rede de denúncia, apoio e acolhimento às pessoas que sofreram algum tipo de violência, entre elas, a LGBTI+fobia.
*Editado por Fernanda Alcântara