Saúde Popular
MST realiza I Encontro de Saúde Mental
Encontro ocorreu entre os dias 2 e 3 de junho, na Escola Nacional Florestan Fernandes. Foto: Iara Milreu
Por Iara Milreu e Marília Fonseca
Da Página do MST
Aconteceu neste mês de junho, entre os dias 2 e 3, na Escola Nacional Florestan Fernandes (Enff), o primeiro Encontro presencial do Coletivo de Saúde Mental do MST, reunindo cerca de 40 profissionais, junto com dirigentes do Movimento, representantes dos setores de Gênero, Saúde, Coletivo LGBTI+, Comunicação, professores e coletivos parceiros, consolidando a iniciativa que surgiu em 2020 como uma frente da ‘Rede de Combate à Violência Doméstica’ do MST em São Paulo.
No início de sua organização, a Rede de Saúde Mental se expandiu a partir do Setor de Saúde do MST e passou a acompanhar de diversas maneiras a base social do Movimento Sem Terra e, após três anos de sua existência, estimasse que pelo menos 800 militantes já foram acolhidos por alguma das ações da Rede.
A programação percorreu a história do MST e apresentou os setores e coletivos que dão vida e trazem organização ao Movimento.
O encontro contou também com análise de conjuntura nacional e, posteriormente, debate sobre Saúde Mental e o atual cenário político. Todo o encontro foi permeado por diálogos, trocas de experiências, práticas de cuidado, bem como de acolhimento coletivo, que são intrínsecas ao ser coletivo que a Rede se tornou. No último dia os participantes realizaram ainda um balanço e projeções para o próximo período.
No diálogo sobre os setores e organicidade do movimento tiveram destaque os setores de Gênero, Saúde, Coletivo LGBTI+ e de Juventude, que trouxeram seus acúmulos, construção coletiva, desafios e potencialidades na construção da Reforma Agrária Popular.
Rosa Negra, do Coletivo de Gênero do MST, trouxe os princípios de igualdade do Movimento, a origem do setor, a conspiração e união das mulheres Sem Terra para o fortalecimento da luta das mulheres no MST, que foram trazendo acúmulo político e organizativo ao Movimento levando a elaboração e prática do feminismo camponês e popular como base para construção de um projeto emancipador para a sociedade, para espaços e territórios livres de violências.
Os debates apontaram ainda a prática de luta e organização das mulheres, LGBTs e juventude, que em suas ações concretas, radicalizam as pautas do Movimento, enxergando as problemáticas do cotidiano e trazendo proposições humanizadoras que foram e vão formando o que hoje é o MST em sua essência.
Kelvin Nicolas, do Coletivo LGBTI+ Sem Terra no estado de São Paulo, destacou o papel da organização desses sujeitos no Movimento Sem Terra. “Humanizar o campo faz parte de um processo de construção de uma nova cultura, somos forçados a construir outra cultura no campo em que não haja violências de gênero e opressões”, comentou.
No debate sobre Saúde Mental e Conjuntura, a professora Ianni Regia trouxe a história da luta do movimento de trabalhadoras e trabalhadores da saúde mental na década de 70, que lutavam contra todas opressões da ditadura cívico-militar e o fortalecimento da luta antimanicomial, na luta por humanizar a estrutura da sociedade, trazendo a contradição da impossibilidade da humanização dentro do sistema neoliberal racista, LGBTfóbico e patriarcal, trazendo saídas de mobilização e luta por uma mudança cultural e estrutural que seja humanizante de uma nova sociedade.
Atividade contou com momentos de debate sobre Saúde Mental e a atual conjuntura. Foto: Marília Fonseca
Já o professor Bernardo Parodi, dialogou sobre as situações de adoecimento e suas relações com o trabalho, apresentando experiências reais em fábricas com trabalhadores colocando a tona o modelo de objetificação dos sujeitos na lógica capitalista e os danos à saúde mental que decorrem destas relações.
Trazendo como possibilidades de saídas para esse problema político e psicológico, o professor destacou a participação criativa e a igualdade política na projeção de um horizonte para o futuro de mudanças estruturais. Para ele, “o cooperativismo, a economia solidária e o socialismo trazem experiências democráticas no trabalho, de igualdade no planejamento e execução. A vida em comunidade no MST colabora para a qualidade da saúde mental”, refletiu.
O Encontro contou ainda com a presença de Atiliana Brunetto, representando o Ministério das Mulheres, que debateu lógica de adoecimento no sistema capitalista nos corpos e nas vidas, em contrapartida, ressaltou a potência da atuação da Rede no fortalecimento da militância do MST. “A Rede é fundamental para ganharmos força e coragem para construirmos militantes com capacidade de vencer, de superar as dores da solidão de uma vida machucada”, pontuou Brunetto.
Como parte da programação, o Encontro realizou um momento de socialização da construção da Rede de Combate a Violência Doméstica, recuperando seus três anos de trabalho e existência, que possibilitou aflorar a potência de transformação para as relações saudáveis com a base do Movimento e de como é central o trabalho da Rede de psicólogas e profissionais da saúde, da comunicação e dos direitos humanos.
O espaço apresentou os processos de acolhimentos individuais, análise e psicoterapia por tempo indeterminado, oficina de arpilleras, grupo de cuidado com as mulheres de Minas Gerais e de São Paulo, os grupos com brigadas internacionais de solidariedade, grupo com turma de Medicina da ELAM, grupo aberto on-line, grupos no encontro LGBT, além de atividades presenciais no 1⁰ Encontro Estadual LGBT, acolhimentos na brigada de solidariedade às enchentes na Bahia, grupos de cuidado com turmas de mestrado, grupos de partilha de histórias de vida com a Brigada Oziel Alves e o conjunto de materiais produzidos pela Rede no último período.
No encerramento Paula Sassaki, Setor Gênero do MST, poeticamente aqueceu o coletivo com união e caminhos para o que está presente e por vir.
“Começamos com esse grande coração pulsante com muitas dúvidas mas oferecemos nosso coração. Não sabíamos o que tínhamos para oferecer naquele momento e como iríamos fazer com as ferramentas que tínhamos e fomos fazendo, íamos discutindo, fazendo, discutindo. Tivemos grupos que discutimos cada encontro antes e depois… E assim fomos bordando, colocando nossos pontos, e construindo o que somos hoje, essa Rede”, comentou.
Paula Sassaki, do Setor de Gênero do MST. Foto: Iara Milreu
“Apesar de sermos pequenininhos nesse processo, fomos aprendendo a fazer algo, esse algo é muito importante, chegamos em forma, metodologias, contribuições e hoje podemos dizer que temos até certo método que não é fechado, é construído dia a dia. Percebemos que estávamos construindo e desconstruindo novos paradigmas de mundo e relações – sobre o que é saúde, saúde mental, cuidado”.
Exposição Arpilleras: tecendo liberdade
A exposição “Arpilleras: tecedendo liberdade”, fruto da construção coletiva de cuidados e acolhimento da Rede, foi exposta no Encontro, nos espaços da Enff.
A montagem, que também pode ser encontrada na modalidade online a memória dos cinco ciclos de arpilleras da Rede, em suas sete turmas, que estão sendo construídas desde agosto de 2020.
Os materiais seguirão na Escola Nacional Florestan Fernandes até julho deste ano.
Exposição na Escola Nacional Florestan Fernandes. Foto: MST/São Paulo
*Editado por Gustavo Marinho