Violência de Gênero
Em Lusaka, debate sobre relações de gênero é realizado com a base do Partido Socialista
Por Brigada Samora Machel
Da Página do MST
No último sábado (10), mulheres e homens zambianas integrantes do Partido Socialista na Constituency de Lusaka Central participaram de um debate sobre violência de gênero. A ação formativa foi realizada junto com a Brigada Internacionalista do MST Samora Machel, e faz parte dos 16 dias de ativismo contra a violência de gênero (GBV – em inglês), que acontece mundialmente de 25 de novembro a 10 de dezembro, enfatizando a necessidade das organizações e as pessoas em geral enfrentarem a Violência Baseada em Gênero, especialmente contra mulheres e meninas.
Nos diálogos estabelecidos entre os participantes foi enfatizado a importância da sociedade zambiana discutir a fundo o que é a violência de gênero e como enfrentá-la. Foi colocada ainda a necessidade de compreender as diversas formas que essa violência pode apresentar, sobretudo, pela ausência do Estado em promover políticas que garantam direitos básicos para o bem estar da população, tais como, saúde, segurança, acesso à água e alimentação de qualidade, etc.
A violência baseada em gênero refere-se a atos prejudiciais dirigidos a um indivíduo com base em seu gênero. É um problema generalizado que afeta indivíduos, famílias, comunidades e sociedades em geral. A GBV abrange várias formas de abuso, inclusive violência física, sexual, emocional e econômica.
De acordo, Moddy Chisha, da Women’s League do Partido Socialista, a violência de gênero tem raízes profundas nos impactos socioeconômicos promovidos pelo sistema capitalista e isso é bastante perceptível na realidade zambiana.
A prevalência da violência de gênero em uma comunidade prejudica as interações sociais e os esforços coletivos destinados a promover o desenvolvimento econômico nas comunidades. Nesse sentido, a questão econômica social, que por outro lado, diz respeito às atividades econômicas e têm como objetivo principal o benefício social ou comunitário, é prejudicada no que se refere ao bem-estar e a produtividade dos indivíduos, principalmente das mulheres, que são afetadas de forma desproporcional por essa violência podendo podem ser observadas em diferentes setores da economia social, seja a falta ou as condições precárias de emprego, de saúde e educação.”
Moddy Chisha
É fato que essa condição instável econômica e socialmente afeta o bem estar de todos, aprofundando outras mazelas, e afetando principalmente as mulheres. Não precisamos recorrer a dados para compreender o quanto as mulheres zambianas apresentam um quadro de adoecimento precoce que está englobado no conceito multidimensional de saúde que demanda o bem-estar físico, mental, emocional e social de um indivíduo.
Segundo Mable Tabaaka, enfermeira, comunicadora popular e integrante da Women’s League, “esse bem estar social se refere aos relacionamentos e às conexões sociais que os indivíduos têm uns com os outros. Isso inclui fatores como apoio social, inclusão e desenvolvimento social e envolvimento com a comunidade. Uma boa saúde social pode ajudar os indivíduos a construir relacionamentos sólidos, manter um senso de pertencimento e acessar recursos e apoio quando necessário.”
Porém, na Zâmbia esses fatores tem altos deficits. Se olharmos os dados, os casos de violência de gênero têm aumentado; a Unidade de Apoio à Vítima da Polícia da Zâmbia relatou que o índice cresceu em pelo mesmo 16%. As estatísticas relatadas não são um reflexo verdadeiro da extensão deste tipo de violência no país, pois há muitos casos que não são relatados e, quando relatados, são marcados pela negatividade na mídia, inibindo assim outras denúncias.
Somente neste ano, vários casos de violência contra mulheres que foram relatados de forma negativa. Como nação, a Zâmbia precisa parar de atribuir culpa aos sobreviventes da violência de gênero, independentemente das circunstâncias em que foram abusados. Em vez disso, deve enfatizar que os perpetradores sejam contidos devidamente pelos seus crimes.
E a legislação zambiana?
Em 2011, a Zâmbia aprovou a criação da Lei contra a violência de gênero e que possibilitou a criação da Unidade de Apoio às Vítimas da Polícia da Zâmbia, que atende principalmente mulheres. No entanto, atua com recursos inadequados para que a mesma possa operar de forma eficiente e eficaz. Além de recursos econômicos, falta priorização política para se aplicar a lei adequadamente e assim operacionalize o fundo destinado para combater a violência de gênero para a construção e gerenciamento de abrigos temporários para sobreviventes de GBV, bem como a expansão de tribunais rápidos para agilizar a resolução de casos recorrentes desse crime.
Ainda nesse campo legislativo, em 2015, foi aprovada a Lei de Equidade e Igualdade de Gênero, onde se formou a Comissão de Equidade e Igualdade de Gênero, no entanto, a mesma ainda não foi operacionalizada. Há um apelo de algumas organizações não governamentais e grupos sociais zambianos para que o governo implemente as iniciativas legislativas já aprovadas, mas também faça uma revisão da política e da estrutura legal sobre a violência de gênero, de forma que, estas leis sejam conciliadas com outras peças da legislação zambiana das quais sua aplicação depende, incluindo o Código Penal e o Código de Processo Penal (CPC).
Para Elizabeth Conceição, da Brigada Samora Machel, essa dificuldade no âmbito legislativo reflete o fato de que, apesar dos esforços para promover a igualdade de gênero na política, as mulheres zambianas estão sub-representadas nos cargos de tomada de decisão.
São muitas as barreiras que as impedem de ter acesso aos recursos, tais como os estereótipos culturais e expectativas sociais sobre as mulheres que as impedem de participar ativamente nos processos políticos. Nesse sentido, para enfrentar esses desafios, são necessárias estratégias abrangentes que englobem reformas políticas, envolvimento da comunidade e iniciativas de empoderamento com o objetivo de promover a igualdade de gênero e melhorar a situação das mulheres na Zâmbia.”
Elizabeth Conceição
Algumas iniciativas
Nesse sentido, o diálogo apresentou ainda a necessidade em construir iniciativas, ainda que pequenas, para que se crie a conscientização do povo zambiano no que se refere ao enfrentamento deste tipo de violência. A promoção da educação sobre a igualdade de gênero e a realização de campanhas de conscientização sobre o impacto da GBV podem ajudar a mudar as normas e atitudes da sociedade. Isso pode criar um ambiente mais inclusivo e de apoio para a participação ativa de todos os indivíduos nas atividades sociais e econômicas de uma comunidade.
Algumas dessas iniciativas podem buscar capacitar economicamente as sobreviventes por meio de treinamento de habilidades, acesso a recursos financeiros e apoio ao empreendedorismo podem contribuir para a integração delas na economia social.
Logo, ficar em silêncio não muda a realidade. Abordar a violência baseada em gênero é essencial para promover uma economia social robusta. Ao reconhecer a interconexão dessas questões e implementar intervenções direcionadas, as sociedades podem trabalhar para criar ambientes em que todos os indivíduos tenham a oportunidade de contribuir de forma significativa para as atividades econômicas e para a comunidade.
*Editado por Fernanda Alcântara