Solidariedade Sem Terra
Apoiadores do MST e Armazém do Campo doam 400 refeições à comunidade no interior de SP
Por Cristina Valéria, Raquel Lima e Rosa Scaquetti
Da Página do MST
Em solidariedade a tradicional comunidade do Banhado, em São José dos Campos, interior de São Paulo, apoiadores do MST e do Armazém do Campo, se uniram no último dia 24 para arrecadar alimentos e produzir cerca de 400 refeições que foram distribuídas entre os moradores.
O Bairro fica em um núcleo urbano localizado em região central da cidade, habitado por trabalhadores e trabalhadoras, ameaçado de despejo. As ameaças de remoção e demolição de suas casas se arrastam por muitos anos, mas dessa vez, por uma ação movida pela prefeitura municipal, a comunidade viveu novamente dias de tensão e agonia quando o Tribunal de Justiça de São Paulo, em um julgamento virtual, autorizou – inclusive com uso de força policial – a retirada de parte dos quase 400 moradores que têm suas casas situadas dentro de uma área controversamente demarcada em 2011, como Parque Municipal do Banhado.
De fato, esse é mais um capítulo da batalha jurídica em que se transformou o Banhado, uma área central do município em que boa parte dos moradores é nascida no território e cuja ocupação começou há cerca de 70 anos. Devido a sua localização, área tem apelo às questões de preservação ambiental, chamada de cartão postal, e a comunidade foi sendo pressionada, estigmatizada e até violentada pelo poder público, que se recusa a estudar as possibilidades de fazer a regularização fundiária do bairro Jardim Nova Esperança, nome do local conhecido como Banhado.
Deixado, ao longo dos anos, praticamente sem qualquer infraestrutura, em condições de vida precária, muitos sofrem de insegurança alimentar, expostos à violência policial e constantemente ameaçados de remoção pelas ações movidas pela Prefeitura de São José dos Campos, mas a comunidade ainda assim não esmoreceu. Há anos o movimento Banhado Resiste na comunidade, uma força de organização das famílias e luta pela regularização fundiária do bairro.
Pelas características geográficas, históricas e culturais do Banhado, após anos de ataque e mobilização das famílias pelo direito de permanecer no local, um grupo formado por estudantes e professores da USP e da UNIVAP, em conjunto com as famílias, elaborou o Plano Popular de Urbanização e Regularização Fundiária do Banhado, que apresenta soluções urbanísticas de integração do bairro à cidade, revertendo a segregação geográfica e social criada face ao conflito pela ocupação da área verde e “nobre” do município.
Porém, esse plano nunca foi implantado, ao contrário, a gestão municipal atual tem como objetivo realizar a expansão do eixo norte do anel viário da cidade, passando pelo local uma grande avenida, em paralelo à área demarcada como parque, daí a luta da comunidade em salvar o Banhado, já que a permanência dos moradores no local, além de ser um território ocupado por seus ancestrais, garante que a região não seja mais um espaço para a classe média transitar, gerar poluição e, além disso, perpetuar a segregação dos moradores, garantindo apenas os interesses do capital a partir da especulação imobiliária.
Com a atual ordem de remoção, que chegou quase na véspera do Natal – felizmente revertida por um pedido da Defensoria Pública de São José dos Campos, que foi aceito através de uma liminar do Supremo Tribunal Federal (STF), expedida pelo ministro Alexandre de Moraes – a comunidade perdeu completamente a paz que a mantém. A exemplo de outro triste capítulo da história joseense, que foi a truculenta remoção do Bairro Pinheirinho, os moradores fizeram longas noites de vigília, assustados com a possibilidade de retirada à força das suas casas, alojados em abrigos, tendo que enfrentar barreiras no aluguel de casas, preconceitos, auxílio insuficiente, documentação precária, entre outros problemas.
Felizmente, a Associação de Moradores do Banhado e apoiadores têm dado diversas respostas à tentativa de desocupação do local. Com apoio de organizações de esquerda, progressistas e reforços jurídicos, de caráter municipal, estadual e no âmbito federal, a Associação vem conseguindo derrubar as liminares de remoção, enquanto se esforça para que o poder público passe ao processo de regularização do bairro e implante alternativas de urbanização, já amplamente aceitas pela sociedade.
A comunidade do Banhado reside no local há décadas, muitas casas, inclusive, têm escritura; o que falta mesmo é decisão política da administração municipal para com as pessoas mais humildes da cidade, que optou por privilegiar a expansão viária e imobiliária, com obras faraônicas e pouco úteis, de olho no cartão postal da cidade.
Ao invés de adotar a regularização fundiária associada às melhorias ambientais, o município insiste em agir de modo a sacrificar o direito à moradia, com consequências graves à vida dos trabalhadores e trabalhadoras que vivem ali, em atendimento de outros interesses, sem estar subsidiado em estudos técnicos ou participação popular que daria legitimidade à decisão.
Depois de realizar o almoço na véspera do Natal, no dia 26, os/as companheiros/as do Armazém do Campo e do MST, juntamente com outras organizações da região e do país participaram de um ato público, demonstrando apoio e disposição em, cada vez mais, estreitar as relações de solidariedade de classe. Uma forte demonstração de que a luta continua.
*Editado por Leonardo Correia