Protestos
Audiência Pública irregular mobiliza militância contra construção de termoelétrica no Vale do Paraíba/SP
Por Felipe Gemelli/MST Vale do Paraíba
Da Página do MST
Na contramão do desenvolvimento energético sustentável o Vale do Paraíba, região metropolitana do interior de São Paulo, vem vivendo uma intensa batalha contra a construção da maior termoelétrica movida a metano da América Latina, a ser instalada na cidade de Caçapava, e que afetará diretamente todas as cidades da região.
Na última semana, a empresa São Paulo Geração de Energia S/A tentou realizar duas audiências públicas, desobedecendo a decisão judicial expedida pela 3ª Vara Federal de São José dos Campos do Ministério Público Federal (MPF), que impede a realização das audiências. Marcadas para os dias 2 de julho em Caçapava e 4 de julho em São José dos Campos, as audiências públicas desrespeitaram o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (IBAMA), que determinou que a empresa Natural Energia, responsável pelo projeto e pelo empreendimento no Vale, refaça o Estudo de Impacto Ambiental (EIA-RIMA) apresentado, pois continha uma grande quantidade de erros técnicos.
O projeto de termoelétrica de Caçapava tem um histórico grave de desrespeito às normas ambientais, aos processos de transparência e à consulta popular. Desde o início deste ano, o MPF cancelou uma audiência pública marcada pela empresa para o dia 31 de janeiro e suspendeu o licenciamento ambiental do projeto, diante de provas apresentadas por movimentos, ONGs e da sociedade civil que demonstraram a falta de cumprimento das normas do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA).
Tais normas requerem que a empresa disponibilize o EIA-RIMA com um tempo mínimo de 45 dias para apreciação e análise da população e especialistas. Além do prazo não ter sido respeitado, a audiência pública também não contou com ampla divulgação nos meios de comunicação regionais, dificultando o conhecimento e a participação da sociedade. O projeto também não possuía aprovação de uso e ocupação do solo no município, o que impediria o prosseguimento do licenciamento.
Especialistas e pesquisadores da região metropolitana do Vale do Paraíba analisaram o Estudo de Impacto Ambiental apresentado pela empresa Natural Energia e apontaram equívocos, erros técnicos e a ausência de informações que impediriam o andamento do licenciamento ambiental do projeto no IBAMA. O IBAMA, então, determinou que a empresa refaça o EIA-RIMA para que o licenciamento ambiental do projeto volte a ter andamento. A empresa Natural Energia enviou um ofício ao IBAMA solicitando uma inversão na ordem do licenciamento ambiental do projeto, requerendo que as audiências públicas fossem agendadas mesmo antes da apresentação de um novo EIA-RIMA. O pedido foi indeferido pelo IBAMA.
Mesmo com todas essas decisões judiciais da justiça federal e as determinações da área técnica do IBAMA, a Termoelétrica São Paulo Geração de Energia S/A conseguiu marcar duas audiências públicas para dar andamento ao licenciamento ambiental do projeto. E pior, apenas duas audiências para uma região com 2,5 milhões de habitantes que têm o direito de participar e acessar as informações pertinentes ao licenciamento ambiental. A Frente Ambientalista do Vale do Paraíba Paulista, uma coalizão da sociedade civil e de movimentos suprapartidários do Vale do Paraíba Paulista, recorreu ao Ministério Público Federal e ao Instituto Internacional Arayara, para que comuniquem à justiça que a empresa responsável pelo projeto está desobedecendo às decisões judiciais.
Apesar de toda mobilização jurídica e parlamentar, as audiências foram mantidas. Nos dias 2 e 4 de julho a população compareceu e superou as capacidades de assentos dos auditórios nos hotéis. Em Caçapava a audiência não se iniciou e foi cancelada após tentativas de silenciar os manifestantes. Em São José dos Campos tentaram dar continuidade, mas a apresentação durou apenas 30 minutos e também foi cancelada. No segundo dia, a empresa se utilizou de diversos artifícios para intimidar e barrar a entrada de manifestantes: proibiu a entrada de instrumentos de som, como apitos, intensificou a segurança privada, solicitou acompanhamento policial ostensivo, abriu a entrada apenas 20 minutos antes do evento, manteve uma grande fila de espera que chegou a 50 minutos e acomodou pessoas favoráveis em fileiras separadas com entrada antes da geral.
Segundo Altamir Barros, da direção estadual do MST no Vale do Paraíba hoje vivemos um momento da história que não se pode vacilar, pois os impactos causados ao meio ambiente já são irreversíveis. “Mas como movimento social e classe trabalhadora, é fundamental nos empenharmos na luta contra a construção dessa termoelétrica no Vale do Paraíba”.
“Compreendemos que a não realização das audiências é uma vitória, mas continuamos em luta, cobrando do governo federal e de todas as instâncias pela não construção desse projeto, que vai contra todo o projeto de desenvolvimento sustentável e agroecológico, que vem sendo construído na região”, ainda destacou o dirigente do MST.
O MST está organizado na região em seis territórios e vem construindo um importante trabalho de preservação e recuperação de áreas degradadas da Mata Atlântica, impulsionando a produção de alimentos saudáveis. A construção de uma termoelétrica teria impacto direto sobre as áreas, como a alteração da temperatura, além da alteração dos ciclos de chuva, ou a possibilidade de chuvas ácidas, representando inúmeras perdas de produção, não somente nos assentamentos, mas em toda a área rural do Vale do Paraíba, que abriga milhares de pequenos agricultores familiares.
*Editado por Solange Engelmann