Análise Internacional
Desmontando o extremismo venezuelano
Por Giovani del Prete*
As eleições na Venezuela têm suscitado muitas especulações e desinformação. Está em curso a guerra cognitiva e uma nova operação contra a Venezuela.
Antes de mais nada, recordemos alguns fatos antes, durante e depois do processo eleitoral de 28 de julho de 2024:
- Antes: Edmundo Gonzalez não assina o acordo dos candidatos presidenciais para o reconhecimento dos resultados. Em junho de 2024, 10 candidatos à eleição presidencial na Venezuela assinaram um acordo para reconhecer os resultados, no qual se comprometiam com um clima de respeito, paz e participação democrática, para que na jornada eleitoral e nos dias posteriores “não se interfira ou desconheça a vontade do povo da Venezuela com atos de violência e desestabilização que atentem contra o bem estar do país.”
O candidato da Plataforma Unitária Democrática, Edmundo González Urritia, foi o único que não assinou. Além disso, o candidato reconheceu que este acordo fazia parte do ponto 12 do Acordo de Barbados sobre “o reconhecimento público dos resultados dos comícios presidenciais”, que por sua vez foi assinado pelo governo nacional, liderado por Nicolás Maduro, e pelos setores da oposição venezuelana (incluindo aqui também o setor de Maria Corina e Edmundo Gonzalez). A contradição em seu discurso é notória ao expressar que é defensor do diálogo e da
democracia, mas quando se apresenta a oportunidade de materializar esse processo através de um ato concreto, se observa sua negação.
Sem dúvida alguma, esta negativa se apega a ala mais fascista da oposição, representada por Maria Corina Machado, quem rechaça categoricamente qualquer processo de diálogo ou conciliação política. Esta postura nos permite perceber algumas intenções contrárias a um processo meramente democrático: uma estratégia que, sob aparência de participar do jogo democrático, busca instrumentalizar uma disputa eleitoral com fins desestabilizadores, mediante a narrativa de fraude e não reconhecimento dos resultados para propiciar um clima de violência que busque a conhecida “mudança do regime”, como aconteceu em 2014 e 2017, quando estes mesmos setores da oposição apostaram nas guarimbas para desestabilizar o país.
- Durante: Os meios de comunicação e as redes sociais publicaram, antes mesmo da abertura dos centros eleitorais, fotos das grandes filas para votar. A oposição argumentava que estes eleitores nas filas eram cidadãos que derrotariam o chavismo, pois estas pessoas estavam ali desde cedo para votar por Edmundo Gonzalez. Entretanto, a partir do meio-dia, as filas foram diminuindo e tudo seguia funcionando com regularidade a nível nacional. Por outro lado, as lideranças do chavismo mantiveram sua mobilização permanente e ambas forças políticas se mantiveram presentes como testemunhas até o momento do encerramento da votação.
Posteriormente, ao encerramento dos centros eleitorais, ambos porta-vozes dos comandos de campanhas foram a público dizendo que tudo havia saído bem, que a jornada eleitoral transcorreu de maneira pacífica e tranquila.
Após a meia-noite do dia 28 de julho, o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) faz um pronunciamento, anunciando uma participação nacional de 59% do registro eleitoral venezuelano, segundo os dados preliminares do 80% das atas escrutinadas do CNE, Nicolás Maduro obteve 5.150.092 dos votos (51,2%), Edmundo Gonzalez recebeu 4.445.978 votos (44.2%), enquanto que os outros candidatos obtiveram um total de 462.704 votos (4.6%).
Também informaram sobre o hackeio ao sistema de transmissão do CNE e ataques cibernéticos às páginas do governo venezuelano. Neste contexto, Elon Musk, conhecido apoiador de figuras da extrema-direita mundo afora, saiu a público em defesa de Maria Corina, o que claramente leva a um indício da guerra cibernética e cognitiva levada a cabo para gerar cenários de desestabilização social e política.
- Depois: o comando de campanha de Edmundo González disse que só reconheceria os resultados eleitorais publicanos por um centro de contagem próprio, paralelo ao sistema do CNE. E com os dados correspondentes ao Conselho e a participação de acordo ao Registro Eleitoral Permanente (REP), a eleição tinha superado a participação de 12 milhões de pessoas, ao projetar-se 100% das atas escrutinadas.
Portanto, considerando que Edmundo González obteve, no primeiro boletim divulgado pelo CNE, 4 milhões 445 mil votos que, segundo Perkins Rocha (um analista de opositor), tinham-lhe “roubado” 5 milhões de votos, o que geraria um resultado de 78% na eleição, que contradiz os “resultados” da contagem “paralela” que realizou a oposição e que foram referidos por Maria Corina, na ordem dos 70%.
O marco aprontado por Maria Corina sobre uma votação de 70% para Gonzalez versus 30% para Nicolás Maduro é, também, um desafio à matemática, considerando que oito candidatos que não eram da Plataforma Democrática Unitária (PUD) participaram da disputa eleitoral. Machado defende o impossível, que os oito outros candidatos registraram, juntos, 0% de votos. Ou seja, como se esses oito candidatos não tivessem participado da contenda eleitoral.
- O que esperar?
Novamente, a manipulação dos algoritmos das redes sociais e o desterro do chavismo apontam o menosprezo das pessoas. Neste 1º de agosto de 2024, evidenciamos como as redes sociais são espaços de desinformação, polarização e caos para gerar medo nos cidadãos. Assim como para infundir incitar ao ódio contra aquelas pessoas que têm uma posição política chavista. Se tanto afirmam que houve fraude, por que Maria Corina e Edmundo Gonzalez até agora não fizeram uma denúncia formal ao Tribunal Supremo de Justiça? Afinal, o Acordo de Barbados prevê exatamente este caminho para denunciar legalmente uma fraude.
Lembram da estratégia do autoproclamado Juan Guaidó? O que vemos hoje na Venezuela é mais uma operação da extrema direita golpista, que não possui provas, mas sim convicções. Com este mesmo modus operandi Lula foi vítima de uma prisão política, assim Daniel Jadue é vítima de perseguição política no Chile.
A Venezuela é um país soberano e, assim como todo país soberano, tem suas leis e procedimentos garantidos pela Constituição e seu sistema de justiça. Não cabe a nenhum país pedir recontagem dos votos ou exigir de Nicolás Maduro que apresente provas de que ele venceu as eleições. Imaginem só se fosse o oposto, se quando Lula ganhou as eleições de 2022, Maduro saísse a público dizendo que só reconheceria os resultados em caso de que Lula provasse que ganhou, desconhecendo a justiça eleitoral do Brasil.
Uma coisa é certa, esse setor fascista da oposição venezuelana não representa nem toda a oposição ao chavismo e muito menos representa a população venezuelana. A maioria deste povo é de paz e derrotou o fascismo nas urnas mais uma vez.
*Analista internacional, membro da secretaria continental de ALBA Movimentos e militante do Movimento Brasil Popular
**Editado por Wesley Lima