Alimentação

PNAE: Campanha reivindica reajuste anual após 42% de perda no poder de compra em 14 anos

Sem reajustes, programa começará 2025 com poder de compra 42% menor, em comparação com 2010; são R$ 4,2 bilhões a menos em valores atualizados
Imagem: ÓEA

Por Yuri Simeon
Do Observatório da Alimentação Escolar (ÓAÊ)

O Observatório da Alimentação Escolar (ÓAÊ) lança nesta quinta-feira (10) a campanha “Reajusta Pnae Sempre”. A iniciativa propõe a aprovação de uma lei que estabeleça o reajuste anual e permanente do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae), protegendo o orçamento diante da inflação dos alimentos.

Estudo publicado pelo Observatório constata a redução de 42% no poder de compra do Pnae ao analisar a série histórica da inflação dos alimentos e comparar com os reajustes realizados entre 2010 e 2024. A proposta de reajuste anual defendida utiliza como indicador o grupo Alimentos e Bebidas do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).

A redução no poder de compra do orçamento federal para a alimentação escolar se acumula diante de reajustes esporádicos com valores abaixo da inflação dos alimentos. Para retomar o poder de compra de 2010, seria necessário um reajuste de 72%, totalizando um acréscimo de R$ 4,2 bilhões ao orçamento federal do programa.

Com o reajuste das perdas acumuladas, o orçamento do Pnae subiria para R$ 9,9 bilhões, quase o dobro dos R$ 5,7 bilhões atuais – valor obtido considerando o número de estudantes em 2023, baseado no Censo Escolar.

Entre 2010 e 2024, o número de matrículas na educação básica pública teve crescimento de 7,7%, passando de 43,9 milhões de estudantes para 47,3 milhões. No mesmo período, o valor médio da cesta básica em 17 capitais brasileiras subiu 210% – de R$ 211,12 para R$ 654,79, segundo dados do Dieese.

“De acordo com dados da FAO, o custo de uma alimentação saudável no Brasil, priorizando o consumo de frutas, legumes, verduras, arroz, feijão, aumenta a cada ano”, destaca a assessora executiva e de pesquisa do ÓAÊ, Débora Olimpio.

A assessora do ÓAÊ salienta que o reajuste não isenta estados, municípios e o Distrito Federal da responsabilidade no cofinanciamento da alimentação escolar.

“Todos os entes federativos devem se comprometer com a qualidade e a adequação da alimentação escolar, destinando aportes financeiros para o cofinanciamento do programa em suas localidades e priorizando a compra de alimentos da agricultura familiar”, defende.

Necessidade imediata

A campanha também cobra a inclusão do reajuste da alimentação escolar para 2025 na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e na Lei Orçamentária Anual (LOA), a serem votadas ainda este ano pelo Congresso Nacional.

Para Mariana Santarelli, coordenadora do ÓAÊ e da FIAN Brasil, assegurar recursos para a alimentação escolar é uma importante medida no enfrentamento à fome e à insegurança alimentar.

“Todos os anos precisamos lutar para que o governo assegure o poder de compra do Pnae, com mais recursos na Lei Orçamentária Anual. Isso não faz o menor sentido, a alimentação escolar não pode ficar sujeita à vontade política do Congresso Nacional e aos constantes ajustes fiscais. Alimentação é direito”, enfatiza.

Tramitam no Congresso diversos projetos de lei sobre o reajuste anual automático do Pnae. Atualmente, apenas o Projeto de Lei 2.754/2023, da senadora Teresa Leitão (PT-PE), utiliza o IPCA Alimentos e Bebidas como indicador para a correção anual – indicado pelos estudos do ÓAÊ como o mais adequado para esta finalidade.

Planejar medidas que garantam a proteção do orçamento do Pnae pode beneficiar a agricultura familiar e fortalecer políticas sustentáveis diante do cenário global de mudanças climáticas, aponta o assessor de advocacy do ÓAÊ, Pedro Vasconcelos.

“O mecanismo de compras da agricultura familiar previsto na Lei 11.947 de 2009 (Lei do Pnae) é um forte incentivador do desenvolvimento de cadeias curtas de comercialização, responsáveis por aproximar produção e consumo e, ao diminuir distâncias, favorecer sistemas alimentares sustentáveis e com menos emissões”, conta. “Ao mesmo tempo, a priorização de alimentos in natura e minimamente processados contribui para a mitigação em comparação com dietas baseadas em maior proporção de produtos ultraprocessados.”

Consea também pede a medida

A relação entre o reajuste do Pnae e as mudanças climáticas também foi destacada pelo Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), em posicionamento favorável ao reajuste permanente.

“Em função da inexistência de um mecanismo permanente de reajuste anual, o Pnae se torna vulnerável à flutuação dos preços dos alimentos, com tendência de agravamento no contexto de coexistência de múltiplas crises, sobretudo a climática, que afetam os sistemas alimentares e, por consequência, a segurança alimentar e nutricional”, destaca o Conselho em recomendação destinada ao Governo Federal e ao Congresso.

O documento defende a instituição de “uma regra permanente de reajuste anual dos valores per capita do Pnae, com base no IPCA Alimentação e Bebidas”. Em nome da presidente do Consea, Elisabetta Recine, a recomendação foi enviada ao ministro da Educação, Camilo Santana, ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, à ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, e ao presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco. 

O Consea também propõe que o orçamento de 2025 incorpore as perdas inflacionárias entre 2010 a 2024, “resultando no aumento da dotação orçamentária atual de R$ 5,7 bilhões para R$ 9,9 bilhões”.