Celebração
Festa pela conquista de assentamento do MST em Cascavel (PR) cobra avanços na Reforma Agrária
![](https://mst.org.br/wp-content/uploads/2025/02/unnamed-17-1024x768.jpg)
Por Setor de Comunicação e Cultura do MST no PR
Da Página do MST
Mais de mil pessoas participaram da festa pela conquista do assentamento Resistência Camponesa, em Cascavel, oeste do Paraná, neste sábado (08). A celebração reuniu aliados e amigos do governo federal, estadual e de municípios da região, dos poderes Executivo e Legislativo, além de lideranças religiosas. Churrasco e almoço foram partilhados gratuitamente com o público, feira e baile garantiram os festejos pelo assentamento de 71 famílias.
A comemoração chegou 26 anos depois que os primeiros barracos foram erguidos no local. A simbologia ficou maior por se tratar da mesma cidade em que o MST realizou seu encontro de fundação, há 41 anos. “Essa luta é uma conquista, da ajuda dos companheiros que se somaram, do nosso Movimento sempre ativo nas orientações pra que a gente pudesse chegar nessa conquista”, afirmou Serlei da Silva Lima, produtora de alimentos agroecológicos uma das coordenadoras da comunidade.
Somado à valorização da conquista do novo assentamento, falas de dirigentes do Movimento cobraram maior rapidez do governo federal em efetivar a Reforma Agrária, para assentar mais de 60 mil famílias acampadas em todo o Brasil, 7 mil somente do Paraná.
“Não temos mais tempo pra esperar, tem áreas de 20, 30, 40 anos de ocupação. É hora da gente regularizar”, disse José Damasceno, da direção do MST, assentado no norte do estado. “Nossas conquistas têm nome e sobrenome: fruto de uma luta popular do povo, companheiros das organizações populares, sindicais, igrejas progressistas. Tudo isso é cravado pela resistência popular”, enfatizou o dirigente.
Integrante da coordenação nacional do MST, João Pedro Stedile também esteve na atividade e reforçou a urgência da ação do governo para a obtenção de terras e concretização dos novos assentamentos. Diante da profunda crise ambiental em curso mundialmente, Stedile vê o modelo do agronegócio próximo a ficar inviável. “Mudou a luta de classes. Não estamos mais disputando hectares com a burguesia, e sim disputando o futuro da sociedade. A meta fundamental da nossa luta é produzir alimentos, plantar árvores e defender a natureza”.
Gleisi Hoffmann, presidenta do Partido dos Trabalhadores e deputada federal, reforçou a necessidade de haver prioridade no orçamento público para Reforma Agrária e Agricultura Familiar. “Isso é produção de alimentos, isso é dinheiro circulando. Mais do que a justiça, direito pela terra é também circulação do dinheiro. Precisamos voltar o crédito pro feijão, arroz, comida, não só soja”.
O prefeito de Cascavel, Renato Silva, também participou do ato e almoçou com a comunidade. Ele garantiu a cooperação com o assentamento e a Reforma Agrária: “Contem com a gente, precisamos continuar lutando pelo bem comum […]. Temos muito que avançar ainda, precisamos ajudar as pessoas que mais precisam”.
Stedile frisou a trajetória de luta do povo do campo no Paraná, de indígenas, posseiros, caboclos e Sem Terra. “Esse território do Paraná traz a herança de uma história de povo guerreiro, que começou lá com os Guarani, passando por diversas outras lutas”. Como tarefa para o Movimento e para as organizações populares do estado, Stédile enfatizou a urgência do apoio popular aos Avá-guarani de Guaíra (PR), que têm sofrido violência constante por fazendeiros da região. A festa foi um ponto de arrecadação de alimentos para a população indígena vítima do conflito.
Entre os presentes estavam Rose Rodrigues, do Incra Nacional; Gessica Leite, assessora de participação social do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS); João Pedro Stedile, da direção nacional do MST; Roland Rutina, Superintendente Geral de Diálogo e Interação Social (Sudis) do governo do Paraná; presidenta nacional do PT e deputada federal Gleisi Hoffmann; Darci Frigo, da coordenação da Terra de Direitos; Hamilton Serighelli, Conselho Permanente dos Direitos Humanos do Paraná (Copedh); deputados federais Elton Valter e Zeca Dirceu; os deputados estaduais Luciana Raffagnin e professor Lemos, ambos do PT. Os prefeitos Renato Silva, de Cascavel; e Vitor Antônio, de Diamante do Oeste; Luiz Carlos Gabas, reverendo da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil; além de outras lideranças religiosas e vereadores de diversos municípios.
Comunidade consolidada
Ao longo de 26 anos de existência do acampamento, a organização coletiva garantiu a melhora das condições de vida das famílias e a estruturação da comunidade.
Os camponeses/as construíram um barracão comunitário, igrejas e campo de futebol. Outra conquista é a ampla produção de alimentos, em grande parte, livres de veneno, além da implantação de uma agrofloresta e o plantio de árvores em todo o espaço comum do assentamento. As famílias também conquistaram uma agroindústria para comercialização da produção de mandioca, destinada às escolas públicas por meio do Programa Nacional da Alimentação Escolar (PNAE).
A festa deste sábado também expressou a grande participação das famílias. O ato político com as autoridades estreou um novo barracão de madeira no centro da comunidade, construído em mutirão especialmente para o evento.
No fundo do palco, um mural produzido pelo artista Sem Terra Acir Batista, assentado na região, trouxe cores e simbologias da luta, com povo, alimentos e o nome do assentamento. Entre a parede de madeira e o mural, um painel de taquara entrelaçada mostrou a marca da cultura indígena e cabocla naquele território.
Marcha da conquista
Os 26 anos de luta pela conquista do assentamento deixou grandes marcas, entre elas a organização da Vigília Resistência Camponesa: Por Terra, Vida e Dignidade, uma forma de luta inédita nas comunidades do MST até aquele momento. A ação ocorreu às margens da Rodovia BR 277, próximo à comunidade.
A mobilização foi em reação a uma ordem de reintegração de posse, autorizada pelo governo Ratinho Junior, que ameaçou despejar 212 famílias de três acampamentos – estavam em risco as comunidades Dorcelina Folador, 1º de Agosto, além da Resistência Camponesa. Ao todo, eram cerca de 800 pessoas, sendo 250 crianças e 80 idosos.
Foram 83 dias de vigília, iniciada no dia 27 de dezembro de 2019 até março de 2020, quando precisou ser interrompida pela pandemia de Covid-19. Durante a pandemia, as famílias acampadas se somaram às ações de solidariedade do MST que doaram alimentos para a população urbana, que enfrentava a fome naquele período de crise sanitária.
Para relembrar este período recente e decisivo de resistência, a comunidade iniciou a celebração do assentamento no mesmo local dos 83 dias de vigília. Após uma mística em que recuperaram a memória da vigília, o público foi convidado a participar de uma marcha até o centro da comunidade, onde a festa continuou. Em quase um quilômetro de caminhada, bandeiras hasteadas, foices, canções e gritos de ordem fizeram reviver a força necessária daqueles dias de ameaças de despejo.
Antes do início da caminhada, o camponês agroecológico Adair Gonçalves, integrante da coordenação da comunidade, falou sobre a simbologia daquele pedaço de terra à beira da rodovia. “Esse espaço significa o lugar da resistência. Por isso o primeiro momento tinha que ser nesse lugar, é simbólico. O Movimento nos ensina a lutar. As famílias escolhem lutar, pela vida, pela terra e pela dignidade […]. Aqui é um espaço que nos lembra da certeza de que quando a gente luta, dá certo”, garantiu, em frente à placa fixada no local, com a pintura da inscrição Assentamento Resistência Camponesa, a bandeira do MST e a frase do Papa Francisco: “Nenhuma família sem casa, nenhum camponês Sem Terra, nenhum trabalhador sem direitos”.
*Editado por Solange Engelmann