Agrotóxicos
Publicação alerta para os impactos dos agrotóxicos na saúde reprodutiva
Documento lançado na 5ª Feira Nacional da Reforma Agrária aponta para os perigos associados à exposição aos venenos

Por Roberta Quintino/Equipe de texto da 5ª Feira da Reforma Agrária
Da Página do MST
Durante a quinta edição da Feira Nacional da Reforma Agrária, realizada em São Paulo, a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida promoveu o lançamento do almanaque “Quatro lições: as mulheres semeiam a vida, os agrotóxicos destroem a saúde reprodutiva humana e o ambiente” . A atividade aconteceu no espaço Café Zé Maria do Tomé, nome que homenageia o agricultor cearense assassinado por denunciar as violações provocadas pelos agrotóxicos. A atividade promoveu reflexões sobre os danos invisibilizados que o modelo do agronegócio impõe à saúde humana e ao meio ambiente.
Fruto de um esforço coletivo do Centro de Direitos Reprodutivos, da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (ENSP/Fiocruz), o material é um desdobramento do dossiê “Saúde Reprodutiva e a Nocividade dos Agrotóxicos”, que revisou 43 anos de publicações científicas sobre os impactos dos agrotóxicos na saúde reprodutiva, tanto feminina quanto masculina. Vale destacar que o documento denuncia a ausência de dados sobre os efeitos em povos indígenas, quilombolas e ribeirinhos, reforçando que essas populações seguem completamente invisibilizadas nas pesquisas oficiais.
O almanaque, dividido em quatro lições, compartilha informações sobre os efeitos dos agrotóxicos na saúde reprodutiva das mulheres, apontando para os perigos associados à exposição a essas substâncias químicas, incluindo seu impacto na fertilidade masculina e feminina, nos ciclos menstruais, em complicações durante a gravidez, no desenvolvimento fetal e na saúde das crianças. As lições são: Como é constituído o corpo humano?, Agrotóxicos e sua nocividade para a saúde humana, Os efeitos dos agrotóxicos na saúde reprodutiva e Considerações para uma perspectiva de vida saudável.
Mirele Gonçalves, da frente de formação da Campanha, destacou que o material é o primeiro ensaio mais amplo sobre o tema, mas, para ela, é importante avançar, “pois o problema é contínuo e muito grande”. Segundo ela, a proposta do almanaque é justamente traduzir dados técnicos em linguagem acessível, de modo a fortalecer o debate nos territórios. “Queremos conversar com companheiras e companheiros que estão nos locais mais atingidos. Levar para as escolas, conversar com nossas meninas e adolescentes, criar espaços de formação e proteção real”.

Para Jakeline Pivato, da secretaria executiva da Campanha, o debate sobre saúde reprodutiva vai além da medicina e alcança dimensões sociais, políticas e ambientais. “É preciso garantir o direito das mulheres de serem mães ou não, de decidirem quando, de terem acesso à informação, aos métodos contraceptivos, ao planejamento familiar. Mas também o direito à água limpa, a alimentos sem veneno, ao saneamento básico. Hoje, estamos em um cenário em que o leite materno já é contaminado, a água da chuva está envenenada, os cosméticos e as roupas estão carregados de resíduos tóxicos. Isso afeta diretamente nossa capacidade de garantir um ambiente saudável para as futuras gerações”.
Ela reforça ainda que os impactos da exposição aos agrotóxicos não se limitam à pessoa intoxicada, mas podem afetar inclusive seus descendentes. “Estamos falando de uma guerra química travada contra os corpos das mulheres, das crianças e dos povos do campo, das florestas e das águas. Falar de saúde reprodutiva hoje é enfrentar os dilemas do nosso tempo e denunciar a normalização do envenenamento coletivo promovido pelo agronegócio”.
Alan Tygel, da Campanha, apresentou informações alarmantes sobre as violações provocadas por agrotóxicos. Ele explicou que, de acordo com o Caderno de Conflitos no Campo 2024, publicado recentemente pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), houve um aumento de 762% nos casos de contaminação por agrotóxicos registrados em relação ao ano anterior, totalizando 276 ocorrências sistematizadas.
“Isso é apenas a ponta do iceberg. A imensa maioria dos casos sequer é registrada. Por isso, promovemos aqui na feira uma oficina sobre como denunciar e documentar essas situações. Não podemos mais aceitar como normal ver helicópteros pulverizando veneno sobre as casas”.
Tygel também destacou um caso grave ocorrido no Mato Grosso do Sul, onde uma gestante indígena Guarani Kaiowá, contaminada por agrotóxicos, sofreu um aborto e faleceu. “Trata-se de um crime ambiental e humanitário. As retomadas indígenas têm sido alvo direto da pulverização, como parte de uma guerra silenciosa para expulsar os povos de seus territórios”.
Nesse sentido, ele ressalta que o almanaque vai além da consolidação de um material técnico, é um convite à ação coletiva” para denunciar a violência cotidiana dos agrotóxicos e seus efeitos sobre a saúde, sobretudo das mulheres e dos povos tradicionais.
*Editado por Fernanda Alcântara