Finapop
Vidas traçadas pela luta pela terra e o cooperativismo
O que as histórias de Arnaldo, Olair e Gorete têm em comum? Eles conquistaram um pedaço de chão e escolheram produzir coletivamente

Por Katia Marko/ MST no RS
Da Página do MST
Conhecer as histórias de vida dos assentados e assentadas da Reforma Agrária, nos territórios conquistados pela luta do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), é uma aula de determinação, resistência, resiliência, fé e amor.
Os desafios para a conquista da terra são muitos, mas as conquistas são celebradas diariamente. Principalmente por quem escolheu produzir de forma cooperada e acredita que a agroecologia é o único futuro possível para o planeta.
Arnaldo Monte Pio é produtor de arroz agroecológico no assentamento Santa Rita de Cássia II, em Nova Santa Rita (RS). Olair Nunes dos Santos e Maria Gorete Menezes Argolo Nunes são do grupo das hortas orgânicas, no assentamento Itapuí, também em Nova Santa Rita.
O que eles têm com comum? São associados da Cooperativa Terra Livre que busca captar mais de R$ 2 milhões por meio do Financiamento Popular para Produção de Alimentos Saudáveis (Finapop). O objetivo é a formação de capital de giro e compra de produtos, com a intenção de adquirir a produção dos cooperados e cooperadas e garantir a comercialização no mercado institucional.
A trajetória de Arnaldo

Arnaldo, cuja família tem uma história de origem camponesa, sempre ligada ao campo, ingressou no movimento social por volta de 1996. Sua motivação pessoal para a luta pela terra surgiu da percepção de que os 20 hectares de terra de seu pai seriam insuficientes para os seis irmãos.
Em 2001, Arnaldo se somou a um acampamento do MST em Lagoa Vermelha, na região norte do estado, em um período de intensa luta social. Ele tinha quase 30 anos na época. Após quatro anos acampado, conquistou a terra em 2005.
O assentamento onde hoje vive, em Nova Santa Rita, era uma fazenda do exército leiloada que foi desapropriada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para contemplar 100 famílias. Arnaldo lembra que a área era inicialmente um “deserto”, com poucas cabeças de gado e sem produção de arroz, e levou um ano para que as famílias conseguissem chegar e se estabelecer.
“A produção de arroz orgânico no assentamento começou como uma experiência em 2008-2009, impulsionada por um grupo de 10 a 12 famílias, com um olhar para essa produção. Inicialmente, cultivamos um hectare na área de moradia para aprender, mas a falta de água nos levou para a área de várzea, onde expandimos a produção”, recorda.
Atualmente, segundo ele, de quase 700 hectares de área de várzea, 430 hectares são de arroz certificado orgânico, com o objetivo de alcançar 100% de certificação. “Embora apenas seis assentados gerenciem a produção devido à mecanização, a atividade articula-se com as 100 famílias do assentamento, cada uma com 8 hectares, garantindo que todas conheçam o processo.”
Conforme destaca Arnaldo, a Cooperativa Terra Livre é central para a vida econômica da produção. “Ela é a financiadora e articuladora do processo produtivo, adiantando valores para cobrir custos como a manutenção do sistema de irrigação de mais de 10 km, com os agricultores devolvendo o valor em arroz e produção.”
Também lembra que a cooperativa foi fundamental em momentos de crise, como a pandemia da covid-19 e as enchentes de maio, que causaram perdas de até 75% da produção. “A Terra Livre forneceu oxigênio econômico, avalizando empréstimos e buscando recursos para que não desistíssemos, mantendo-nos organizados. Sem essa ferramenta, nós não estaríamos vivos na produção hoje.”
Refletindo sobre sua trajetória, Arnaldo afirma que faria tudo de novo pelo sonho de vida, embora reconheça que o cenário atual da Reforma Agrária é muito mais difícil, com poucas novas famílias assentadas nos últimos anos.
Arnaldo também compartilha que sua decisão de investir na agroecologia teve uma motivação pessoal ligada à saúde, pois sofria de problemas como dor de cabeça devido à intoxicação por venenos em produções anteriores. “Pra mim, produzir alimento limpo tornou-se um princípio pessoal e organizativo, reforçado pelo apoio dos consumidores nas feiras. E a cooperação é essencial para a agricultura familiar e assentamentos, sendo a cooperativa a ferramenta que garante nossa existência.”
Olair e Gorete, uma relação que nasceu na luta

Olair é natural de Redentora, no Rio Grande do Sul, e Gorete, de Sergipe, no Nordeste. Se conheceram e se casaram sob a lona preta, no primeiro acampamento do MST no estado nordestino.
Ele participou das primeiras ocupações do movimento no Rio Grande do Sul, sendo uma das lideranças do acampamento da Fazenda Nonoai. Ela contribuiu com movimentos sociais desde a infância, como a Pastoral da Juventude e a Comissão Pastoral da Terra, até se unir ao MST.
Dessa união de sonhos, nasceu uma família que labuta unida na produção da alimentação saudável. Em 1988 chegaram a Nova Santa Rita, na Fazenda Itapuí. Mas antes enfrentaram mais de três anos acampados, sob pressão diária e perseguição, especialmente no período pós-ditadura militar. Gorete recorda as dificuldades no Nordeste, onde a perseguição de jagunços era intensa e o trabalho de base era sigiloso, feito as “escondidas”.
Gorete foi fundamental na primeira ocupação do MST, na Fazenda Monte Santo, em Sergipe. Com a ajuda de uma diocese solidária, a ocupação foi realizada de forma sigilosa, usando uma “santa missão” como disfarce.
A luta pela terra para Olair e Gorete significava a possibilidade de produzir alimentos saudáveis, por uma melhor qualidade de vida e por uma educação diferente para seus filhos. Eles também foram pioneiros na educação dentro do movimento. Gorete ensinava crianças sob um pé de manga, usando a terra para escrever, e Olair, professor de história, foi um dos fundadores da escola Nova Sociedade, que já formou 13 médicos filhos de agricultores, através de parcerias com universidades.

Desde o início, a família de Olair e Gorete optou por um sistema cooperativado, sendo a Associação do Grupo Erval, no assentamento Itapuí, o primeiro no Rio Grande do Sul a buscar a certificação orgânica. Eles lembram que ajudaram a emancipar Nova Santa Rita, que hoje é conhecida como a “capital do orgânico”. Em sua propriedade de quase 14 hectares, produzem mais de 50 tipos de plantas comestíveis, incluindo frutas e verduras, e são grandes incentivadores do plantio de árvores para proteger vertentes de água, ou seja, nascentes.
A comercialização de seus produtos orgânicos é feita diretamente em feiras em Porto Alegre e na região Metropolitana, além da entrega para o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e para o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).
Segundo eles, a Cooperativa Terra Livre e a Cooperativa de Trabalhadores Assentados de Porto Alegre (Cootap) são cruciais para o escoamento da produção e para a busca de recursos, especialmente para enfrentar os desafios climáticos como secas e enchentes. Em momentos de dificuldade, como as enchentes recentes, a cooperativa providenciou apoio com sementes e insumos.
Olair e Gorete veem o MST como uma “grande família”, onde se sentem em casa em qualquer lugar do Brasil. Eles celebram o legado de seus filhos e netos, que também estudaram nas escolas do movimento, com a filha mais velha sendo dirigente e o filho Sandino, técnico agrícola, trabalhando na terra.
Para Olair, o cooperativismo é indispensável. “Sozinhos não vamos em lugar nenhum.” Ele destaca também a importância das parcerias com instituições como o Banco do Brasil e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), que apoiam suas técnicas de produção avançadas, como o plantio direto.
O casal expressa profunda felicidade e gratidão pelo movimento e suas conquistas, reafirmando que fariam tudo de novo. Para eles, a reforma agrária é vital para o desenvolvimento do Brasil, evitando que famílias inchem as cidades e aumentem o desemprego, e promovendo a produção de alimentos.
“Temos orgulho do nosso movimento ser um dos maiores protetores de áreas de preservação ambiental nos assentamentos. Mesmo quem não produz para comercialização pratica a agricultura de subsistência, cultivando hortas, frutas e criando animais.”
A terra em que vivem, que antes era um campo de lazer, sem árvores, do ex-governador Ildo Meneghetti, apoiador da ditadura militar, foi inteiramente cultivada e reflorestada por eles. Para Olair e Gorete, a luta pela terra é uma luta pela vida, saúde e pela formação das futuras gerações, com a convicção de que o povo não precisa passar anos debaixo de lona se houver mais reforma agrária. Eles carregam a bandeira da luta com “muita honra, com muito orgulho”.
As visões sobre o cooperativismo, expressas por Arnaldo, Olair e Gorete, convergem na ideia de que a cooperação é uma ferramenta indispensável e vital para a sobrevivência e o sucesso dos assentamentos e da agricultura familiar. Eles a veem não apenas como um modelo econômico, mas como um pilar de sustentação social e organizativa, especialmente diante de desafios.
Como investir na Cooperativa Terra Livre através do Finapop?

O Finapop foi criado em 2020, com a intenção de que as pessoas tenham motivos para “Investir com propósito: Investimento sustentável, saudável e seguro”, anuncia a plataforma, que tem se tornado uma iniciativa inovadora e essencial na busca de crédito produtivo, com menos burocracia e obstáculos para o avanço da cooperação e produção de alimentos nas áreas de Reforma Agrária.
Qualquer pessoa que tiver interesse em investir na captação de recursos da Cooperativa Terra Livre pode acessar a plataforma do Finapop (https://finapop.com.br/plataforma/), até o próximo dia 7 de julho. O investimento conta com uma rentabilidade de 11% ao ano, com duração de total de 18 meses e carência de seis meses, para o investidor começar a receber os pagamentos de juros e do valor.
Passo a passo: Para ter acesso a oferta de investimento, o primeiro passo é o investidor se cadastrar na plataforma, em seguida terá acesso a informações sobre como investir, entre outros dados, tornando o investimento mais democrático.
Ao acessar a plataforma do site do Finapop (https://finapop.com.br/), é só clicar no menu do lado esquerdo e selecionar a opção “Como investir”. Lá a pessoa terá acesso a mais informações sobre a remuneração, prazos e as características da atividade produtiva, das cooperativas e famílias que serão beneficiadas pelo investimento. No link da plataforma https://finapop.com.br/plataforma/ também é possível tirar dúvidas com a equipe do Finapop, acessando o bate-papo exclusivo.
*Editado por Fernanda Alcântara