Inimigo do Povo

O Congresso da Mamata é o mesmo que desmata

No fim das contas, o agronegócio pagou em ICMS, em 2019, a ridícula quantia de 16 mil reais. Dinheiro que faz falta

Congresso Nacional do Brasil. Foto: Marcello Casal Jr. / Agência Brasil

Por Miguel Enrique Stédile
Do Brasil 247

Nos últimos dias, cresceram as manifestações nas redes sociais criticando o comportamento do Congresso nacional em proteger os super ricos, ao mesmo tempo em que aumentavam as próprias regalias, com mais vagas e emendas para os parlamentares. Porém, as reações propondo a taxação de Bancos, Bets e Bilionários precisa incluir também um “B” para o boi da bancada ruralista e dos parlamentares e empresas que querem passar a “boiada” por cima da legislação ambiental e dos biomas para abrir espaço para soja e pecuária.

Graças à isenção de impostos, o agronegócio consome o solo e as águas, usa a estrutura do país, mas não deixa nada aqui. Segundo uma pesquisa conjunta da ACT Promoção da Saúde, Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), Observatório das Economias da Sociobiodiversidade (ÓSocioBio), Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC) e Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), considerando apenas o comércio do grão, compra de sementes, fertilizantes e agrotóxicos, a produção de soja recebeu mais de R$ 56,8 bilhões de incentivos fiscais e desonerações tributárias, em 2022. Se incluirmos transporte e distribuição, além dos benefícios da Lei Kandir, que isenta a exportação de matéria-prima de pagar ICMS nos estados onde foi produzido, os valores ultrapassam R$ 80 bilhões anuais em renúncia fiscal. 

No fim das contas, o agronegócio pagou em ICMS, em 2019, a ridícula quantia de 16 mil reais. Dinheiro que faz falta para construção de escolas e hospitais, por exemplo. 

Isto, quando o agronegócio paga o que deve. Em 2019, o governo deu 95% de desconto na liquidação de dívidas rurais. Segundo a própria Receita Federal, em 2022, foram R$101 bilhões do agronegócio que foram dispensados de pagar impostos.

Nada disso seria possível se o agronegócio não contasse com a ajuda do Estado. Na safra de 2023/24, o agronegócio acessou R$400 bilhões no crédito rural, adiantamentos ou empréstimos para financiar a produção. Já os agricultores, receberam apenas R$71 bilhões.  Como os juros no Brasil estão entre os mais altos do mundo, o governo assume a diferença entre o que o agronegócio pega no banco e os juros do mercado. Isso custou aos cofres públicos 13 bilhões de reais na safra 2023/24.

Toda esses recursos geram apenas riqueza concentrada e pouco desenvolvimento. Primeiro, ao contrário de toda a propaganda, a participação real do agronegócio no PIB não chega a 7%, segundo cálculos do IBGE. E, segundo uma pesquisa de 2021 da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), demonstrou que os municípios do “agro” têm indicadores sociais piores que os demais. Os municípios onde o agronegócio está mais presente, as pessoas têm menor expectativa de vida, estudam menos e ganham menos. A desigualdade é maior também nestes municípios, com o dobro da concentração da população considerada pobre em relação aos municípios onde o agronegócio tem menor peso. Nos municípios do “agro”, os níveis de pobreza estão acima de 40%.

E, coincidentemente, frequentemente os interesses do agronegócio se confundem com dos outros setores privilegiados da economia. Curiosamente, as bets são marcas cada vez mais frequentes em feiras do agronegócio no interior. Feiras que também não pagam impostos, graças ao Perse (Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos), criado na pandemia e estendido infinitamente por Arthur Lira. Muitas destas feiras também são financiadas pelas emendas parlamentares. E, curiosamente, os partidos do centrão governam 60 dos 70 municípios mais desmatados na região da Amazônia. 

E, não é coincidência que o mesmo Congresso que aprova e sustenta mamatas e protege os super ricos, tenha aprovado dias antes um PL da Devastação que irá soterra definitivamente toda legislação ambiental, realizando o sonho de Bolsonaro e Ricardo Salles, de “passar a boiada” e reduzir o país a um grande pasto ou uma grande mineradora.

Por isto, iniciativas como o Plebiscito Popular sobre a taxação dos super ricos e a escala 6 x 1 são fundamentais. O Brasil é um país atrasado em relação a outros países capitalistas, como os EUA ou a Suécia, onde referendo e plebiscitos populares são frequentes e a população é convocada a opinar sobre temas relevantes. E o Plebiscito também não lembra que não pode haver democracia política sem democracia econômica. Enquanto uma parcela da população trabalha em jornadas exaustivas, os impostos e as riquezas do país são direcionados justamente aos parasitas que pagam pouco impostos, mas tem muito tempo para influenciar os rumos políticos do país. 

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.