Sonho realizado
Entrevista: Sem Terrinha conquista vaga de jogadora de futebol e encoraja mais crianças a sonhar
A concretização do sonho da Sem Terrinha Nicoly só foi possível com muito treino e a parceria entre o MST e o Ferroviária Futebol S/A, de Araraquara (SP)

Por Solange Engelmann
Da Página do MST
Sabe aquele sonho alimentado por muitas crianças Sem Terrinhas, com uma bola no pé ‘de verdade’ ou improvisada, brincando pelos campos de terra, de barro e quadras de futebol nas escolas do campo e assentamentos e acampamentos do MST pelo país? O sonho de se tornar jogadora ou jogador de futebol profissional.
Antes mesmo de frequentar a escola ou aprender a ler e escrever muitos Sem Terrinhas sonham com essa conquista. Para alguns parece só mais um sonho distante, mas não foi assim com a Sem Terrinha Nicoly Gonçalves Dias, de 12 anos, que após acreditar e tentar viver esse desejo, conquistou uma vaga para jogar futebol profissionalmente no Ferroviária Futebol S/A (FSA), de Araraquara (SP).
Nicoly vive com os pais no assentamento Eli Vive, no município de Londrina, Paraná. Ela conquistou a vaga há duas semanas, a partir de uma parceria entre o Movimento Sem Terra e o Clube do Ferroviária, formalizada em agosto deste ano, com a intenção de valorizar e difundir o futebol feminino nas áreas de Reforma Agrária, contribuindo com a capacitação técnica e profissionalização. Por outro lado, a Associação Ferroviária é pioneira no investimento de profissionalização de atletas no futebol feminino, quando a modalidade ainda não era obrigatória e a estrutura era precária no clube.
Porém, inicialmente a Sem Terrinha também enfrentou várias dificuldades, como treinos, falta de recursos e algumas recusas de clubes, até a conquista da vaga, que agora também vai exigir dela a adaptação a uma nova realidade, jogar bola em um clube de futebol paulista, longe da família e da sua comunidade. Mas para ela só há o que comemorar!
Para mim é gratificante estar vivenciando tudo isso, porque futebol é minha paixão”, afirma a Sem Terrinha.
Nicoly também encoraja as crianças do MST a lutar e acreditar nos sonhos e, juntamente com seus pais, agradecem a parceria que o Movimento estabeleceu com o Ferroviária, que tornou esse sonho real e tem o potencial e abrir novas portas para a realização de muitos Sem Terrinha e jovens do Movimento, que sonham em ganhar a vida com a bola no pé.
Confira a entrevista na íntegra:
Página MST: Faz quanto tempo que você se interessa por futebol de campo?
Nicoly: Eu comecei me interessando por futebol, acho que eu tinha uns cinco a seis anos. Para mim está sendo muito gratificante estar vivenciando tudo isso, porque para mim futebol é minha paixão.
Como está sendo para você a conquista dessa vaga no time do Ferroviária, para jogar feminino profissionalmente?
Para mim é um passo muito a frente, porque disso eu tenho certeza, que vou ser uma nova jogadora. Nesse momento estou muito feliz e muito grata por tudo que vem acontecendo. Ainda estou meio confusa, com tudo que vem acontecendo na minha vida. Mas tudo tem sua hora. Agora tenho que me preocupar em jogar bola. Então eu também quero agradecer ao meu pai, ele sempre foi um guerreiro, está comigo em tudo, ele e minha mãe sempre me apoiam. Minha família é muito especial para mim. E eu me espelhei nisso, porque eu amo muito eles. Muito obrigada!

Na sua opinião, como a parceria entre o MST e o Ferroviária Futebol S/A te ajudou na seleção e conquista da vaga no futebol profissional?
Quero agradecer muito ao MST por essa parceria com a Ferroviária. Eu sou muito grata, e achei muito especial também, porque quando eles olharam para mim e falaram, que eu poderia fazer uma seletiva, e foi lá onde passei. Isso é muito gratificante para mim, porque através dessa parceria do MST eu consegui essa vaga.
Eu queria agradecer de coração por tudo que as pessoas do MST me ensinaram nesse período. E só tenho a pedir a Deus que dê tudo certo nessa nova caminhada da minha vida.
Qual a sua expectativa em seguir na carreira do futebol feminino, após conseguir a vaga na categoria de base do Ferroviária?
Minha expectativa agora é treinar, treinar, não me machucar e ter um bom preparo psicológico, mental para que eu consiga chegar em mais clubes, e dando cada vez um passo à frente. Conseguir evoluir, de degrau em degrau.
Como está sendo o processo de mudança para Araraquara, onde vai jogar no Ferroviária?
A ideia no próximo mês é fazer uma logística para que eu tenha uma convivência com o clube e uma convivência de moradia em Araraquara.
Como você acha que a sua conquista de jogar futebol profissionalmente no Ferroviária pode ajudar outras meninas dos assentamentos e acampamentos do MST na busca dos seus sonhos?
A mensagem que eu deixo para elas é que lutem pelo seu sonho. Se têm um objetivo, corram atrás, que tudo tem sua hora. Se hoje você leva um não, você fica triste, mas volta lá e treina, treina, treina, o treino é tudo. E ter fé em Deus.
Vai com fé e com “sangue no olho”, que tudo vai dar certo! Nunca desista do seu sonho ou do seu objetivo!
– Sem Terrinha, Nicoly Dias.
Também conversamos com os pais da Sem Terrinha Nicoly Gonçalves, de 12 anos, Helena Gonçalves Barboza e Jauri Dias, sobre a importante conquista da filha.
Como a família recebeu a notícia da seleção da Nicoly para jogar futebol feminino profissionalmente no Ferroviária?
Helena e Jauri: Foi uma notícia já esperada, tendo em vista que ela era muito elogiada nas escolinhas onde jogava. Ela já tinha uma experiência de ter feito uma avaliação de uma semana no time do Ferroviária faz cinco meses. Levada por um observador do Ferroviária. Então, agora estamos muito contentes de ela ter passado.
Como a parceria entre o MST e o Ferroviária ajudou a Nicoly na seleção e conquista da vaga para jogar profissionalmente no time?
Essa parceria com o MST foi muito importante para que ela tivesse essa nova oportunidade tão rápida novamente. E a partir da nossa organização política em construir uma parceria de futuro com o Ferroviária, esperamos que a Nicoly seja apenas o primeiro fruto dessa parceria. Estamos muito felizes.
Como a vivência da Nicoly no assentamento e na escola do assentamento do MST incentivou essa conquista na seleção do Ferroviária?
Então, ela estudou até o 5º ano na escola do nosso assentamento, sempre tendo a disciplina da nossa organização, sempre jogando bola nos espaços coletivos e seguindo os princípios do nosso Movimento, isso foi decisivo.
*Editado por Fernanda Alcântara



