Saúde Popular
“Às vezes a própria escuta é já uma cura”: a Saúde na Feira em MG
O cuidado como princípio da Reforma Agrária popular esteve presente nas práticas de saúde da Feira Estadual da Reforma Agrária, realizada entre os dias 17 e 19 de outubro em MG

Por Diego Armando Cohecha*
Da Página do MST
A feira foi celebrada no Parque Municipal Américo Renné Giannetti, em Belo Horizonte. E ali, próximo ao palco onde ocorreram as apresentações artísticas e as rodas de conversa sobre agroecologia e a defesa da natureza, estava uma barraca branca que dizia: “Espaço de saúde popular Diva França”, nomeada assim em honra a uma destacada militante mineira do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, que morreu há alguns anos.
Durante os três dias de Feira Estadual da Reforma Agrária, feirantes e visitantes puderam vivenciar, na prática, o que são os princípios de cuidado do setor de saúde do MST. A experiência aqui narrada se constrói a partir do olhar de um jornalista popular colombiano, em imersão profunda com o MST e a partir da tenda da saúde, que esteve em funcionamento entre os dias 17 e 19 de outubro.
Segundo a dirigente do setor de saúde do MST em Minas Gerais, Terezinha, “o setor da saúde nasceu por necessidade, assim como as primeiras ocupações, e surge de um grupo de mulheres com conhecimentos de plantas para cuidar”. A militante, considerada uma anciã da luta pela terra, tem mais de 15 anos de experiências no setor.
Sobre esse processo de formação do setor, ela logo acrescenta: “As mulheres têm esse poder de salvar vidas”.
Tereza Sabino de Souza, mais conhecida pela militância como Terezinha, além de ser uma assentada da reforma agrária, é dirigente do MST. Aquela mulher com trinta e um anos de luta nas costas teve sua inserção na luta quando o Movimento tinha apenas 10 anos de organização. Ela vem do Assentamento Oziel Alves Pereira, um marco na luta pela terra no estado, que fica localizado na região do Vale do Rio Doce, estado de Minas Gerais. Terezinha faz parte de uma turma de vinte pessoas responsáveis por cuidar de quem chegou à V Feria da Reforma Agrária.
“Tem um povo que há duas semanas tá pegando pesado e precisa de atendimento, de cuidado. Para isso também estamos nós”, comenta Terezinha sobre os voluntários, feirantes e as equipes que vieram dos diferentes regiões do estado e até de outros estados para organizar o evento. O compromisso da militante no cuidado corrobora com uma das definições de saúde dos Sem Terra: “Ter saúde é ter a capacidade de lutar contra tudo o que nos oprime”.

Detrás dela, perto da mesa onde os visitantes são cadastrados para receberem atendimento, tem um letreiro pendurado com os serviços de saúde que os visitantes, voluntários e feirantes podem acessar. Alguns desses são: massagens, auriculoterapia e ventosas. São realizados por terapeutas profissionais acompanhados por aprendizes capazes de replicar o ensinamento nos assentamentos, acampamentos e outros territórios.
Daiane Candanda, uma acampada do MST na região da Zona da Mata, explica que os serviços são de graça para os trabalhadores da Feira e que os preços são sugestões para os visitantes. Cabe notar que em um consultório da cidade, o preço médio de uma massagem corporal como a brindada no espaço da saúde pode chegar a mais de R$ 180. Com o meu olhar, o valor sugerido no espaço de saúde é pensado mesmo para a classe trabalhadora.

“As fáscias (tecido fibroso muscular) têm uma ligação muito forte com a psicossomática”. Ou, em outras palavras, “grande parte dos adoecimentos físicos têm uma origem emocional”, falou Kauê Roque de Sousa, terapeuta profissional e parceiro do Movimento, depois de aplicar uma ventosa num visitante que está deitado de bruços em uma maca dentro da barraca. A ventosa é uma técnica milenar, usada para tratar dores musculares e drenar toxinas. Junto com as ventosas, a auriculoterapia, também é milenar e de origem chinesa, técnicas que são praticadas em muitos territórios do MST.

Enquanto Kauê atende dentro da barraca com os aprendizes, Terezinha explica as parcerias que tem o Movimento com o SUS, mostrando as diferenças que tem no jeito de atender. “Aqui você pode falar da sua história, não é uma simples triagem. Ela comenta isso aclarando que saúde, cuidado e escuta têm uma profunda ligação, funcionando holisticamente. “No corre-corre da vida das pessoas não têm quem as escute. E às vezes a própria escuta é já uma cura”.
*Diego Armando é jornalista popular, amigo do MST e fez parte da equipe de comunicação da Feira Estadual da Reforma Agrária em Minas Gerais como voluntário
Editado por Agatha Azevedo