Resultado do julgamento de Carajás é insuficiente, afirma Nilmário Miranda

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Resultado de julgamento de Carajás é insatisfatório, afirma Nilmário Miranda

18/11/2004

Por: Jorge Pereira Filho
Fonte: Jornal Brasil de Fato

“O resultado não atende à expectativa da sociedade brasileira, das vítimas ou da comunidade internacional”, avalia o ministro Nilmário Miranda, responsável pela Secretaria Nacional de Direitos Humanos, sobre o julgamento do massacre de Eldorado dos Carajás. Ex-preso político durante o regime militar, Miranda foi também três vezes eleito deputado federal pelo PT de Minas Gerais. Propôs a criação da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados e foi seu primeiro presidente. Na entrevista abaixo, ele defende a federalização dos crimes contra os direitos humanos para evitar que julgamentos de graves violações, influenciados pelo poder local, acabem em impunidade.

O massacre de Eldorado ganhou ampla repercussão internacional. O senhor acha que a condenação de apenas dois oficiais corresponde ao repúdio e à indignação da sociedade perante o crime?

Nilmário Miranda – Acho difícil opinar sobre uma decisão judicial, mesmo porque não estão esgotados os recursos. Mas é claro que a gente fi ca insatisfeito. Eu acompanhei muito esse caso, era da comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, fui até à Comissão de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), sempre me empenhei nesse caso. Queríamos que fosse um caso emblemático e tivesse um resultado satisfatório. Por enquanto, o resultado não atende à ex-pectativa da sociedade brasileira, nem das vítimas nem da comunidade internacional, já que é um caso que ganhou o mundo.

Mesmo depois do massacre de Eldorado dos Carajás, o Estado de Pará continuou a registrar os maiores números de trabalhadores rurais assassinados no país, responde a mais de um terço do total no Brasil. O senhor acha que a impunidade está estimulando a violência?

Miranda – Prefiro ver a coisa em outro ângulo. Desde o início do atual governo, não houve mais nenhuma morte provocada por agentes públicos. Avançou muito o instrumento de mediação de conflitos para evitar situações como aquelas. Avançamos a luta contra o trabalho escravo e a da reforma agrária.

O senhor é a favor da federalização dos crimes contra os direitos humanos. Que diferença isso faria?

Miranda – O Conselho de Defesa de Direitos da Pessoa Humana (CDDPH) fez um relatório que, se fosse um inquérito, daria outro rumo para o julgamento de Eldorado dos Carajás. Mas como não há federalização, o relatório do CDDPH não produziu efeitos judiciais, nem na denúncia do Ministério Público. Isso também ocorreu no caso do Carandiru e da Candelária. Sem a federalização, o relatório não tem valor de inquérito, mostra a verdade, mas não tem desdobramento. Com a federalização, se um caso estivesse caminhando para a impunidade, como o de Carajás, haveria a possibilidade de transferi-lo para a esfera federal e reparar os equívocos.

Em que estágio está o projeto da reforma judiciária, em tramitação no Congresso, que prevê a federalização?

Miranda – É importante que o Senado aprove essa proposta, mas há quatro destaques, em votação em separado, para a eliminação. O texto básico da reforma, que contém a federalização, já foi aprovado no Senado e na Câmara. Mas, agora, os senadores terão de confirmar se querem manter essa medida.

A federalização busca também impedir que o poder local interfira nas decisões da Justiça de crimes de direitos humanos?

Miranda – Há uma imensa confusão dos ministérios públicos estaduais, que são contra a federalização, achando que será reduzido o poder deles. Onde o sistema de garantia de direitos funciona, não vai ser preciso federalizar nada, pois não haverá impunidade. Agora, onde há impunidade, mesmo existindo o ministério público e há clara interferência do poder, a esfera federal poderia reparar uma impunidade, em qualquer fase do processo. O ideal seria que jamais a federalização fosse utilizada e, quando houvesse um massacre de Eldorado dos Carajás, tivéssemos uma punição exemplar. Essa não tem sido a realidade. A federalização seria um recurso de excepcionalidade, quando a Justiça não funciona a contento, como no caso de Carajás, que não responde pela gravidade da violação praticada.

Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH) – Colegiado formado por representantes do governo e da sociedade civil, que investiga denúncias de violações de direitos de abrangência nacional