Barragens: país tem energia de sobra

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Barragens: país tem energia de sobra

17/12/2004
Por Alexania Rossato
Fonte Jornal Brasil de Fato

Um dos maiores eventos organizado pelo Ministério de Minas e Energia, o leilão realizado em São Paulo, dia 7, somou 17.008 megawatts (MW) negociados, com a circulação de cerca de R$ 74,9 bilhões. Foi leiloada a chamada energia “velha”, que corresponde à produção de geradoras que já amortizaram seus investimentos, ou seja, que já tiveram todos os custos pagos.

O governo argumenta que a venda dessa energia foi fundamental para evitar racionamentos e determinante para o setor atrair, nos próximos anos, investimentos nacionais ou estrangeiros em usinas hidrelétricas. Considerando o modelo do setor elétrico anterior inadequado, a ministra de Minas e Energia, Dilma Rousseff, disse que o leilão marcou “o fim de um momento traumático, que foi a crise de energia”. Segundo Dilma, houve racionamento por falta de investimentos.

O leilão também foi marcado pelo espírito competitivo, principalmente das empresas privadas que deixaram de negociar sua energia para vendê-la por preços mais rentáveis. A Tractebel e a Duke Energy, as duas principais geradoras de energia privadas do país, colocaram à disposição no leilão uma quantidade ínfima de energia. No entanto, a demanda para o momento foi suprida, mas ainda existe muita energia sem ser negociada, principalmente de geradoras privadas, o que evidencia uma oferta maior que a demanda.

5ª tarifa mais cara

Segundo estimativas do governo, devido aos preços do leilão pela venda de energia velha, a tarifa da energia para os consumidores deverá cair em média 5% no ano que vem. Isso porque, até agora, as distribuidoras de energia estavam pagando caro pela eletricidade, entre R$ 81 e R$ 82 o megawatt (MW) médio gerado por Furnas, por exemplo. O preço médio do leilão foi de R$ 57 e, como o custo de compra de energia é repassado ao consumidor, a perspectiva é de que os consumidores paguem menos. O deputado estadual Frei Sergio Gorgën (PT-RS) contesta essa possibilidade: “Nada indica que os distribuidores repassarão a diminuição do custo para o consumidor. A tendência é de que incorporem para aumentar seus lucros. Quem sai perdendo sempre é a população mais pobre”, afirma Görgen.

Apesar do indicativo de diminuição do custo, dados do Instituto de Desenvolvimento Estratégico do Setor Elétrico (Ilumina) dizem que o Brasil tem a 5ª tarifa mais cara do mundo, sem levar em conta os impostos – nesse caso, poderia chegar ao primeiro lugar. “Pagar 16,60 dólares de luz nos Estados Unidos não tem o mesmo peso que teria no Brasil. No orçamento do povo brasileiro, comprometer esse valor só com energia ‘desloca’ a compra de outros produtos”, conclui o estudo do Instituto. Além disso, com a estrutura tarifária brasileira, as famílias pagam mais que as indústrias pelo consumo, pois de acordo com o levantamento, de 1995 a 2004, a tarifa residencial teve aumento de cerca de 50%, enquanto a industrial foi de 23%.

Frente a isso, ficam dois questionamentos: é possível diminuir o preço da energia em um modelo essecialmente mercantil? Se o Brasil tem um modelo energético baseado na matriz hídrica – barragens -, tida como a energia mais barata, por que a tarifa brasileira está entre as mais caras do mundo? Com o leilão ficou evidente que há energia sobrando, o que não justifica a construção do grande número de barragens previstas até 2015 – quase 500 grandes barragens. A ministra diz que essa oferta é temporária, e se o país continuar crescendo entre 4% e 5%, ocorrerá uma nova crise de abastecimento.

Repotenciação das usinas

No entanto, especialistas não consideram a construção de novas barragens a melhor solução para o problema. Segundo o professor Célio Bermann, da Universidade de São Paulo, um programa de repotenciação leve das antigas usinas hidrelétricas poderia acrescer em 10% a capacidade instalada, com custo bem inferior à construção de novas obras. “O custo do megawatt produzido por uma usina repotencializada é de três a cinco vezes menor que o custo em uma usina nova”, afirma Bermann. Os dados do livro A repotenciação de usinas hidrelétricas como alternativa para o aumento da oferta de energia no Brasil com proteção ambiental, elaborado pela WWF, afirmam que inúmeras usinas antigas, geradoras maiores que 30 MW e com mais de 20 anos em operação, têm condições de ser repotencializadas com altos índices de ganhos de capacidade, chegando a 34.374,7 MW só das grandes barragens. Além disso, a repotenciação das barragens tem grandes vantagens, entre elas o curto prazo de instalação, o pequeno impacto ambiental e social.