Milhares vivem na informalidade

Por Anamárcia Vainsencher
Fonte Jornal Brasil de Fato

No Brasil, há mais de 10,5 milhões de pequenas empresas não-agrícolas, das quais a quase totalidade – 98%, ou 10,3 milhões, na informalidade. Nelas trabalham 13,9 milhões de pessoas. Segundo especialistas, esses números indicam que o setor informal acaba desempenhando a função de absorver mão-de-obra. Os dados são da pesquisa de Economia Informal Urbana 2003, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em parceria com o Sebrae.

Em relação à pesquisa anterior, de 1997, o número de pequenas empresas em geral cresceu 10%, enquanto o de empreendimentos informais aumentou 9%. O aumento dos postos de trabalho nas empresas informais foi de cerca de 8% no mesmo período. São Paulo, Minas, Rio de Janeiro, Bahia e Rio Grande do Sul concentram, juntas, cerca de 58% das empresas do setor informal do país.

Dentre as pessoas ocupadas nestes empreendimentos, 69% são trabalhadores por conta própria; 10% empregadores; 10% empregados sem carteira assinada; 6% com carteira assinada; e 5% não remunerados. Nesse universo, a maioria é homem (64% do total). Entretanto, entre os trabalhadores não remunerados, a maior parte (64%) é mulher, que corresponde a 3% da população ocupada. São elas que ganham menos: o IBGE mostra que, no setor informal, o rendimento mais baixo é o das mulheres empregadas sem carteira: R$ 275, pouco acima do salário mínimo de R$ 240 em 2003.

Universo amplo

Desde a última pesquisa do IBGE, em 1977, o número de trabalhadores em negócios informais cresceu quase 8%, o dobro do aumento, no mesmo período, no total de empregados em atividades não-agrícolas no Brasil, com exceção do serviço doméstico. Ou seja, sem o setor informal, o desemprego urbano, entre 1997 e 2003, teria crescido muito mais.

A informalidade alcança 98% dos empreendimentos não-agrícolas com até cinco empregados. É um amplo universo que inclui de camelôs a microempresários. No conjunto, 69% são trabalhadores por conta própria, 10% são empregadores, 16% são funcionários com e sem carteira assinada e 5% trabalham sem remuneração.

No geral, estão na informalidade por falta de oportunidade: 31% começaram seus negócios por não encontrarem emprego e 18% porque precisam de complementação de renda. Na avaliação de especialistas, o setor informal funciona mais como rede de proteção do que como trampolim.

Sem opção

Em sua grande maioria (88%), as empresas do setor informal pertencem a trabalhadores por conta própria. Que não estão nessa situação por escolha, mas por falta de alternativa. Nestes estabelecimentos, a quase totalidade (95%) tem um único dono, e a maioria (80%), só uma pessoa ocupada.

As principais atividades econômicas no setor informal são comércio e reparação (33%), construção civil (17%) e indústria de transformação e extrativa (16%). Do total de pequenas empresas de construção, todas são informais.

Devido aos custos e à burocracia do mercado formal, a maioria (53%) das empresas não faz qualquer tipo de contabilidade. Entre as empresas de trabalhadores por conta própria, 57% não registram nada. Do total das empresas do setor informal, 88% não têm constituição jurídica, nesse universo, 93% são de conta própria. Entre as que têm constituição jurídica, 93% faturam mais de R$ 2 mil por mês, enquanto 72% das sem esse registro obtêm, em média, até R$ 1 mil mensais.

Quem está na informalidade teve maiores perdas de renda do que os demais, em função das crises econômicas por que tem passado freqüentemente o país. Assim, entre 1997 e 2002, a receita do setor diminuiu quase 20%, ao passo que a renda média dos brasileiros encolheu menos de 19%.

Nos pequenos empreendimentos informais, o recuo nos rendimentos vem acompanhado de jornadas de trabalho mais longas, contratos mais precários e maior concorrência. Os ganhos dos trabalhadores por conta própria diminuíram 19,5%.

No já precário mercado informal, as relações de trabalho estão ainda piores. Em 1997, 72% dos empregados no setor informal, menos os donos dos negócios, tinham uma relação de trabalho por tempo indeterminado. Em 2003, só 61% tinham esse vínculo. E cresceu o número daqueles que ganham por tarefa.

A fragilização do vínculo com o trabalho ocorreu em meio a um aumento da já excessiva carga horária: 15% de proprietários e por conta própria têm jornada superior a 60 horas semanais.

Receita cai

Em 1997, 93% das empresas do setor informal eram lucrativas. Em 2003, a proporção caiu para 73%. No período, houve queda significativa no lucro médio real dos empreendimentos de conta própria, enquanto os de empregadores mantiveram o lucro no mesmo patamar anterior.

Dentre as empresas lucrativas, a maior parte delas, 36%, é do segmento de comércio e reparação. Cabe destacar, ainda, que a receita média mensal obtida pelas empresas de empregadores é cinco vezes maior do que a das empresas de conta própria.

A grande maioria das empresas do setor informal (94%) não utilizou crédito nos três meses anteriores à pesquisa no desenvolvimento da atividade. Entre as que o fi zeram, a principal fonte de recursos foi bancos públicos ou privados (para 58% das empresas), seguida de o próprio fornecedor (16%) e parentes ou amigos (16%). Em novembro de 2003, assim como em 1997, 83% das empresas informais não possuíam qualquer tipo de dívida.

Concentração

A maioria dos empreendedores informais não tem qualquer tipo de proteção social. Entre os que trabalham por conta própria, 20% não contribuem para a Previdência Social. A pesquisa também mostra que, entre os por conta própria, 39% têm apenas primeiro grau incompleto. No conjunto, 45,6% têm entre 40 e 59 anos e 37,%, entre 25 e 39 anos.

A maior parte (58%) das empresas informais está nos Estados de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Bahia e Rio Grande do Sul. Nessas cinco unidades da federação também está a maior proporção (56%) dos 13,9 milhões de trabalhadores informais.

Apenas São Paulo concentra 25% (2,6 milhões) de empresas informais; em seguida vem Minas Gerais, com 10,3% ou um milhão de empresas; e Rio de Janeiro, com 8,4 % ou 863,4 mil empresas informais. A participação do setor informal dentre as pequenas empresas foi mais evidente no Espírito Santo e no Acre, onde 99,45% se encontravam na informalidade.

Funcionamento

A pesquisa do IBGE mostra que boa parte (65%) dos empreendimentos desenvolve suas atividades produtivas somente fora do domicílio, e aproximadamente um terço exclusivamente na casa do proprietário. Isso resulta do peso de atividades como comércio e construção civil.

Entre as empresas pertencentes a trabalhadores por conta própria, 63% funcionam apenas fora do domicílio de seu proprietário, enquanto entre as pertencentes a pequenos empregadores, essa proporção atinge 79%.

Aproximadamente 89% das empresas pesquisadas funcionam todos os meses do ano, sendo a maior parte delas de trabalhadores por conta própria. Cerca de 70% das unidades produtivas utilizam equipamentos e/ou instalações próprios. Em relação a 1997, cresceu a proporção de unidades produtivas que utilizaram imóveis, barracas ou trailers.