Índios chilenos em 53 dias de greve de fome devem apelar à OEA

Por Verena Glass
Fonte Agência Carta Maior

Um protesto no Chile contra a empresa Florestal Mininco (um dos maiores grupos econômicos do país que ocupa mais de um milhão de hectares com plantações de eucalipto e pinus para a produção de papel e celulose) em meados de 2001 rendeu uma condenação de 10 anos e uma multa de 423 milhões de pesos a Juan Marileo, Juan Carlos Huenulao, Florencio Marileo e Patricia Troncoso, quatro lideranças do povo Mapuche, maior grupo indígena do pais, que vem lutando há mais de dez anos pela recuperação de territórios ocupados pela empresa.

Presos desde agosto de 2004 após um julgamento baseado na Lei Antiterrorista – promulgada em 1984 pelo então ditador Augusto Pinochet para reprimir a oposição ao regime militar – e duramente criticado por movimentos internacionais de Direitos Humanos em função de inúmeras falhas jurídicas no processo, no último dia 13 de março os quatro indígenas iniciaram uma greve de fome pela revisão da pena, que completa, nesta quinta (4), 53 dias.

O caso vem mobilizando defensores dos direitos humanos de todo o mundo, mas está empacado no sistema jurídico chileno. No final de abril, o relator especial da ONU para o Direito Humano dos Índígenas, Rodolfo Stavenhagen, junto com a Federação Internacional dos Direitos Humanos e a Organização Mundial contra a Tortura, solicitou à presidente do Chile, Michele Bachelet, que abra um diálogo com o movimento indígena para chegar a um acordo que interrompa a greve de fome. Por um lado, segundo as organizações humanitárias, os últimos boletins médicos apontam que o estado de saúde dos quatro ativistas é muito preocupante. Por outro, como afirma a ONG Observatorio para la Protección de los Defensores de Derechos Humanos, a utilização da Lei Antiterrorista contra os movimentos sociais seria “absolutamente desproporcional” e lesiva para a democracia do país.

Apelação negada

Apesar de declarações de Bachelet de que o governo combateria a criminalização dos movimentos sociais e que suspenderia a utilização da Lei Antiterrorista, nesta quinta a Suprema Corte chilena negou, de forma definitiva, a apelação da defesa pela revisão do julgamento.

“O recurso de revisão foi negado pela Corte Suprema. Havíamos pedido que a sentença fosse cancelada por que não avaliou as provas e não realizou análises que expliquem a convicção de que há conotação terrorista no ato [dos réus]. Esperávamos que o tribunal revisasse essa sentença”, declarou a advogada dos indígenas, Alejandra Arriaza.

Segundo Arriaza, também não houve avanços nas negociações com o poder executivo, e, em termos jurídicos, as possibilidades jurídicas no Chile se esgotaram. “Agora, é possível apelar apenas à Comissão Internacional de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA). Vamos continuar buscando um indulto ou anistia especial para os réus”.

Histórico

A ação que levou ao julgamento e à prisão dos quatro líderes Mapuches (a queimada de áreas da empresa Florestal Mininco) faz parte de uma luta pela retomada de cerca de 1,6 mil hectares do território ancestral mapuche, desapropriados na década de 1970 pela ditadura militar no processo de contra-reforma agrária de Pinochet.

Entre 1982 e 1986, estas áreas foram adquiridas pela Forestal Mininco SA, mas em 1995 se constitui na região a comunidade indígena Tricauco, que continua solicitando ao governo a devolução das terras agora ocupadas pela empresa florestal com apoio do órgão indígena federal.

A falta de resposta às demandas indígenas levou, em 2000, a uma ocupação de 100 hectares da Mininco pelo movimento indígena, e a partir deste momento são adotadas outras formas de mobilização e luta, como ações diretas sobre a área. Entre janeiro de 200 e novembro de 2001, foram 12 ações reivindicatórias deste tipo. E no dia 19 de dezembro de 2001, um grupo de ativistas indígenas colocaram fogo em focos isolados da área, o que levou ao processo e à prisão, em 2004, das lideranças da ação.

*Colaborou Priscila Carvalho, jornalista do CIMI