Transnacionais européias ameaçam serviços básicos como acesso à terra e água

O Tribunal Permanente dos Povos sobre as Transnacionais Européias, que aconteceu entre 10 e 12 de maio em Viena, na Áustria, chegou à conclusão de que a forma de atuação das empresas na América Latina representa ameaças a serviços básicos essenciais como o direito à terra, à soberania e segurança alimentar, o direito dos povos indígenas, direitos ambientais, políticos e civis.

O Tribunal, que foi um dos eventos paralelos organizados pelas redes e organizações sociais presentes na Cúpula Presidencial Europa-América Latina, teve três sessões onde recebeu documentos, estudos de caso e denúncias sobre o impacto das atividades das transnacionais européias na América Latina e Caribe.

Entre as empresas julgadas estavam Suez, da França, em relação ao serviço de privatização da água em cinco países; a Repsol, da Espanha e a Bayer, da Alemanha, pelos efeitos dos agrotóxicos no Peru; a Telefónica, também da Espanha, por desrespeito aos direitos trabalhistas, e a Aracruz, pela violação ao meio ambiente e aos direitos humanos ao plantar eucaliptos no Brasil.

O Tribunal recebeu o testemunho de 30 pessoas de 11 países da América Latina e Caribe e identificou elementos e ameaças comuns das transnacionais européias:

– Ameaça ao direito de acesso aos serviços básicos essenciais. A água tem sido transformada em mercadoria. As políticas de comercialização e distribuição implementadas pelas empresas, com o apoio das instituições financeiras internacionais, impedem que amplos segmentos da população (principalmente os mais pobres) tenham acesso a um direito humano fundamental. A privatização e a liberalização da eletricidade tem resultados semelhantes.

– Ameaças ao direito à terra. A expansão dos monocultivos para exportação (essencialmente soja e celulose) está destruindo as formas de vida dos camponeses e pequenos produtores rurais, ao lhes impedir o acesso justo e eqüitativo à terra.

– Ameaça aos direitos à soberania e segurança alimentar. A produção industrial de alimentos para exportação e a privatização da biodiversidade e das sementes, promovidas por interesses corporativos e desigualdade do comércio internacional, estão destruindo a capacidade dos países latino-americanos de satisfação de tais direitos.

– Ameaças aos direitos trabalhistas. A chamada “flexibilização”, a busca de cada vez mais lucro pelas empresas privadas, a necessidade de produzir bens baratos para mercados globais, junto à repressão dos sindicatos da América Latina, debilitam as bandeiras básicas dos trabalhadores. Mais ainda, as empresas usam a força de trabalho barata para manter os baixos custos, expandindo todo um setor informal.

– Ameaças aos direitos dos povos indígenas. As empresas européias e os governos latino-americanos colaboram para a invasão e exploração dos territórios indígenas sem o consenso ou participação das comunidades afetadas, violando seus direitos fundamentais e sua identidade cultural.

– Ameaça aos direitos ambientais. A negligência e o abuso das corporações transnacionais européias sobre os frágeis ecossistemas, já com a biodiversidade e a vida silvestre se esgotando, assim como sobre as bio-regiões chaves para a estabilização climática, têm aumentado a devastação florestal por motivos econômicos, contaminando as águas e expandindo a infra-estrutura, resultando em uma dívida ecológica substancial, que contradiz o compromisso público da União Européia com o desenvolvimento sustentável.

– Ameaças aos direitos políticos e civis. As corporações transnacionais européias podem desenvolver suas atividades sem serem perturbadas graças à cumplicidade de governos locais e nacionais. Tudo isso pode ocorrer apesar do rechaço popular, já que os mesmo governos não duvidam quando reprimem a mobilização ambiental social e sindical.

O tribunal foi formado por Elmar Altvater (Presidente, Alemanha), Miren Etxezarreta (Espanha), Susan George (França), Lilian Manzella (Estados Unidos), Francesco Martone (Itália), Freda Meissner-Blau (Áustria), Sandra Quintela (Brasil), Roberto Schiattarella (Itália), Gianni Tognoni (Secretario General, Itália).