Seminário discute prevenção de despejos forçados

Por Mariana Martins

Teve início hoje no Recife (PE), o Seminário de Direitos Humanos e Prevenção de Despejos Forçados. O encontro marca a primeira vez que movimentos sociais, organizações de direitos humanos, poder judiciário, Estado e Ministério Público se reúnem para discutir amplamente o tema e propor alternativas viáveis para sua solução.

Na mesa de abertura estiveram presentes, Leandro Gorsdorf, Letícia Osório, Marcos Cosmo e Joba Alves, representando as organizações e movimentos sociais que organizam o seminário, a prefeita de Olinda, Luciana Santos, representando a Frente Nacional de Prefeitos, o vereador de Olinda, Marcelo Santacruz, representando a Frente Parlamentar pela Reforma Urbana, Maria Oliveira, representando o Incra, Daniel Nolaso, representante do Ministério das Cidades e Eleonora de Souza Luna, representando o Ministério Público Estadual.

O encontro conta com a participação de 150 pessoas de todo o país e que estão ligadas direita ou indiretamente aos despejos forçados, seja nas áreas urbanas ou rurais. O seminário acontece até a próxima sexta-feira em Boa Viagem.

Dados

A conferência de abertura do seminário contou com a participação do advogado popular e ex-promotor do Ministério Público do Rio Grande do Sul, Jacques Távora Alfonsín, que apresentou dados alarmantes sobre os déficits habitacionais e os problemas da Reforma Agrária no Brasil.

De acordo com os dados apresentados inicialmente pelo jurista, o Brasil hoje tem um déficit habitacional de 7 milhões de casas. Em contra partida, 5 milhões de unidades habitacionais, casa e apartamentos, encontram-se desocupadas. Segundo Alfonsín, confrontando minimamente os números percebe-se que com uma simples reforma habitacional o problema de metade dos que não tem moradia hoje estaria resolvido.

No campo, a situação é igualmente alarmante. As propriedades rurais com até 100 hectares, que representam 90% das propriedades, ocupam 20% do território nacional, enquanto, as propriedades que têm mais de mil hectares, e que representam apenas 1% das propriedades, ocupam 45% do território.

Depois de apresentar os dados, que ele mesmo os qualificou de irracionais. Alfonsín fez uma análise do aparato legal e constitucional e da aplicação dessas leis à realidade dos despejados. Para o advogado, a legislação brasileira e a Constituição Federal não tiveram poder para garantir uma justa distribuição de terras e casas. “Quem exerce este direito distributivo hoje é o mercado. Só que a lei é muito clara e exclui a possibilidade da terra ser encarda como mercadoria. A terra, na Constituição, tem uma função social a ser cumprida”, enfatiza o jurista.

Ainda nas suas considerações sobre as leis, o conferencista fez a reflexão de que os despejos forçados não consideram a pobreza e a miséria como sendo violações de direitos humanos, mas consideram as ocupações das terras e casas para fins de Reforma Agrária a habitacional como uma violação.

Alfonsín lamentou a sobreposição do direito patrimonial aos direitos humanos, que, segundo ele, é um direito vital, ao contrário do primeiro. Ele ainda fez questão de reafirmar que a mais importante crise pela qual a sociedade vem passando é uma crise constituinte, pois ela põe em xeque a condição de garantia do Estado Democrático e de Direito. “É importante nós entendermos que não vivemos em um Estado Democrático e de Direito, porque temos ainda grande parte dos nosso direitos fundamentais violados”, disse.

Nas considerações finais, o jurista discorreu sobre a soberania da dignidade humana a qualquer artigo das leis ou Constituição. “Qualquer legislação deve estar a serviço da garantia da dignidade humana. É isso que diz o primeiro artigo da Constituição Brasileira. Todos nós, juízes, advogados, e o povo, estamos autorizados constitucionalmente a desobedecer às leis se a dignidade humana estiver em risco. Ela é o elemento nuclear do princípio do Estado Democrático de Direito que tanto falamos”, concluiu Alfonsín.

Na parte da tarde, o seminário contou com duas mesas. A primeira sobre o diagnóstico da situação dos despejos forçados no Brasil, pela ótica do judiciário e da Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP). A segunda mesa procurou resgatar o mesmo diagnóstico através da visão dos movimentos sociais, representados pela Via Campesina, pelo Fórum Nacional de Reforma Urbana, pela Coordenação Nacional das Comunidades Quilombolas e pelo Movimento dos Atingidos por Barragens.