Em busca de uma vida melhor, africanos morrem nas águas do Atlântico

Fonte El País
Tradução Luiz Roberto Mendes Gonçalves

No cemitério municipal de Santa Lastenia, em Santa Cruz de Tenerife, foram enterrados há algumas semanas os corpos de sete imigrantes mortos na tentativa de chegar às costas das Canárias. No dia 5 foram enterrados três subsaarianos. E no dia 16, outros quatro. Eles fazem parte dos 496 corpos recuperados este ano entre o arquipélago e a África.

Alejandro Santana, coveiro do cemitério, mostrou na última sexta-feira os nichos onde jazem sete homens. Sem nome, nem mesmo um número. Uma tampa branca de polietileno coberto de gesso diferencia esses desconhecidos dos outros mortos.

“Não há ser humano que não se comova com isto”, diz Alejandro. Por causa da profissão, já viu muitas lágrimas na vida. Talvez por isso, o que o impressiona realmente é a ausência delas. “O enterro [dos subsaarianos que chegaram em botes] é assistido por nós e algum representante da prefeitura”, explica uma responsável pelo cemitério. Ninguém reclama os mortos. “Quantos terão ficado no mar! Esses barcos em que eles vêm, alguns afundam”, exclama o coveiro.

A Cruz Vermelha e o Crescente Vermelho estimam que entre 2 mil e 3 mil imigrantes morreram no Atlântico, transformado em cemitério marítimo. Com um suave sotaque canário, Alejandro prevê junto às tumbas: “Faltam três anos para me aposentar e tenho a impressão de que enterrarei muitos outros [africanos].”

Infelizmente, parece que tem razão. Esta semana um membro do Salvamento Marítimo afirmava que é muito difícil conter essa onda. “Não sei o que é o Frontex, é como um remendo em um buraco enorme”, ironizou. “Sabe quantas milhas de costa existem?”, perguntou, indicando o mar.

O aumento espetacular de “sem papéis” que chegam ao arquipélago multiplicou as imagens de moradores e turistas assistindo à tragédia humana desses africanos. Um exemplo: no último sábado, 38 pessoas chegaram a Los Cristianos no navio Punta Salinas, do Salvamento Marítimo. “No cais, duas centenas de curiosos observavam horrorizados, em silêncio. Como numa partida de xadrez prestes a começar, o branco olhava para o negro e vice-versa. No cais, banhistas, sandálias, óculos escuros, telefones celulares. Na coberta do barco, homens esgotados. Descalços, com o olhar absolutamente perdido, náufragos do desespero.

Sofreram apenas quatro dias de angústia no mar. Uma ninharia, comparados aos nove, 12 ou 17 dias que alguns subsaarianos demoram para pisar em solo europeu, em barcaças lotadas de gente. Os que chegaram a Los Cristianos no sábado foram resgatados a 90 milhas das Canárias. Tiveram sorte de escapar de uma morte segura.

O governo local afirma que está muito preocupado com a morte de seres humanos. O porta-voz da Coalizão Canária no Congresso, Paulino Rivero, disse ontem que o oceano Atlântico “está se transformando num cemitério”. O mar já tragou milhares de pessoas. Nas Canárias continuam chegando subsaarianos. Em Los Cristianos esperava-se ontem a chegada de mais de 200 africanos, resgatados pelo navio do Salvamento Marítimo.