Defensoria Pública obtém suspensão da desocupação

Antonio Biondi e Bia Barbosa
Agência Carta Maior

Os 1.630 moradores da ocupação Prestes Maia, em São Paulo, conseguiram uma vitória importante na Justiça ontem, dia 22. A Defensoria Pública de São Paulo, que apóia o movimento dos sem-teto ameaçados de despejo, obteve a suspensão por 60 dias da reintegração de posse do edifício, prevista para este domingo (25). Iniciada em 2002, a ocupação vertical, de 22 andares, é a maior da América Latina, e abriga 468 famílias. A reintegração de posse foi movida na Justiça pelo ex-candidato a vereador Jorge Hamuche (PHS), um dos proprietários do prédio, avaliado pela Caixa Econômica Federal em R$ 7 milhões – mas cuja dívida acumulada com o município devido ao não-pagamento de IPTU (Imposto Predial Territorial Urbano) pode chegar aos R$ 5,8 milhões.

O pedido de reconsideração foi feito depois do Juiz da 25ª Vara Cível, que havia determinado a reintegração, não considerar o acordo feito na última sexta (16) entre a Prefeitura de São Paulo e o Movimento dos Sem Teto do Centro (MSTC) e manter o despejo para domingo. Pelo acordo, a Prefeitura havia se comprometido a pagar uma bolsa-aluguel no valor de R$ 300 por mês, pelo período de seis meses, para as famílias residentes no edifício, até que todas fossem inseridas num programa habitacional definitivo. Isso requeria, no entanto, um tempo mínimo para ser executado.

Por isso, o acordo previu também uma “ação conjunta dos Poderes Públicos envolvidos junto à Polícia Militar e à Justiça Estadual para prorrogar a reintegração de posse do Edifício Prestes Maria e facilitar a remoção das famílias de forma ordeira e organizada aos locais de atendimento e moradia”. Daí veio o pedido de reconsideração feito pela Defensoria Pública e pela Secretaria Estadual de Direitos Humanos.

“Era só uma questão de tempo, porque fazer a retirada de todas as famílias em um dia só e tentar, neste prazo, colocá-las em uma locação seria muito complicado. A idéia foi ganhar tempo para fazer a remoção de forma ordenada e permitir que as pessoas recebessem o auxílio do bolsa aluguel até serem inseridas definitivamente nos programas da Caixa Econômica Federal e do CDHU”, explica a defensora pública Renata Tibyriçá.

“Foi uma boa notícia. O juiz atendeu ao pedido de todo mundo, inclusive da Polícia Militar, de reconsiderar a decisão. A PM fez um ofício dizendo que poderia executar a reintegração, mas que teria uma série de problemas para tal”, completa Manoel Del Rio, advogado do MSTC (Movimento dos Sem-Teto do Centro).

Nos últimos dias, integrantes dos governos municipal, estadual e federal têm se reunido com representantes dos moradores para definir os mecanismos e medidas para implementar o acordo realizado com a Prefeitura. Há reuniões com representantes da Secretaria Municipal de Habitação e Cohab, da Secretaria de Habitação do Estado de São Paulo e CDHU, do Ministério das Cidades, da Caixa Econômica Federal. Uma agenda de ações em defesa da ocupação também foi preparada pelos militantes que dão apoio aos sem-teto.

Nesse sábado (24), das 9h às 17h, acontece a 1ª Jornada em Defesa da Moradia Digna na região metropolitana de São Paulo, que pretende reunir mais de duas mil pessoas. Durante o evento, serão dados à população atendimentos e orientações jurídicas relacionados à reintegração de posse, usucapião, financiamento, regularização fundiária e tarifas públicas. Também haverá oficinas sobre moradia digna, direito à cidade e programas habitacionais de interesse social no centro.

A Jornada, promovida pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo, Uninove, Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos, Caicó, Pastoral da Moradia da Região Sudeste, União dos Movimentos de Moradia de São Paulo, AnoregSP e Instituto Polis, acontece no Centro Universitário Nove de Julho, Campus Memorial, na Rua Adolfo Pinto, 57 (próximo terminal Metrô Barra Funda).

“Num momento como este, quando se trata de uma questão que envolve cerca de 1.500 pessoas, que ficariam, de uma hora para a outra, absolutamente sem lugar pra ir, a mobilização popular foi muito importante para que o juiz reconsiderasse sua decisão. O trabalho da imprensa em divulgar que essas pessoas estão morando ali, ainda que precariamente, mas melhor do que se estivessem na rua, também contribuiu muito, assim como a Interferência do Ministério das Cidades e atuação dos próprios órgãos públicos, que demonstraram boa vontade em resolver o problema”, afirma Renata.

Em 2003, a gestão Marta Suplicy da Prefeitura se dispôs a pagar a diferença entre o valor do prédio e a dívida acumulada pelos proprietários para desapropriar o edifício – medida defendida pelos moradores. Teve início, então, o processo de compra do Prestes Maia. No entanto, como a Justiça teria exigido que o valor da propriedade – R$ 7 milhões – fosse depositado integralmente e o poder público não pôde pagar, nada foi feito. A gestão Gilberto Kassab alegou diversas dificuldades, entre elas algumas de ordem legal, para a compra do edifício. A solução definitiva passa a ser então a remoção das famílias do local, com garantia de moradia para todos.

“Esperamos que, nesses 60 dias, haja um trabalho efetivo para que se consiga remover as famílias e alocá-las em outro lugar. É um trabalho que depende principalmente da Prefeitura”, completa a defensora pública.