Colômbia: entre surpresas e semelhanças

Latinautas*
Agência Carta Maior

Oitavo país visitado pelos Latinautas, a Colômbia vive o segundo mandato de Alvaro Uribe, presidente que obtém popularidade pela sensação de segurança que se espalha pelo país totalmente alinhado com as forças de dominação americanas, em pleno curso e aplicação do Plano Colômbia, que, sob a justificativa do combate ao narcotráfico, militariza o país e corrobora o poder dos paramilitares de extrema direita, estes sim pilares de sustentação do sistema que distribui pelas elites locais os assombrosos lucros obtidos com o tráfico de cocaína.

Sob as matizes de uma polarização social muito acentuada, a democracia colombiana vive estados de exceção que banalizam a tortura, a perseguição política, os deslocamentos de milhões de cidadãos. No plano dos Direitos Humanos, são bastante perceptíveis as discriminações contra os povos indígenas e contra a mulher.

Chegada à Cartagena

Chegamos à Colômbia de avião, o carro seguiu um dia antes de navio em direção a Cartagena. Não é possível atravessar o Estreito de Darien a bordo de um automóvel, pois não há estradas que liguem o Panamá à Colômbia. Alguns aventureiros tentam fazer o trajeto caminhando, outros vão até onde é possível de ônibus e dali tomam um barco para a Colômbia. A viagem foi tranqüila assim como a chegada ao país. O oficial da imigração foi simpático e não tivemos problemas em justificar o porquê de estarmos viajando somente com passagem de ida para a Colômbia.

Para retirarmos o carro do Porto, entretanto, foi um pouco mais complicado. No total, gastamos quase 48 horas. O conflito de informações e a má vontade dos funcionários foi decisiva para que um tramite que levaria apenas uma tarde demorasse quase dois dias inteiros. Tudo de acordo com o esperado, já estávamos preparados para enfrentar algum tipo de problema naquele momento. Ao menos, o carro chegou quase inteiro (a mangueira da gasolina furada), e todas as nossas coisas estavam intactas dentro do porta-malas.

Entre conversas, pão de queijo e noticiários de televisão

Durante as duas semanas que visitamos a Colômbia, descobrimos um país bastante acolhedor. Ficamos a maior parte do tempo em Cartagena, na região histórica da cidade, a qual lembra Cuba com suas casas antigas, imensa população negra e praias caribenhas. Os estrangeiros são bem-vindos e bem tratados, o país encontra-se aberto e muito receptivo para o turismo. Descobrimos na padaria da esquina que os colombianos também sabem fazer pão de queijo (pão de ouro, como eles chamam) e matamos um pouco as saudades do Brasil.

Nas estradas, a polícia e o exército pararam-nos diversas vezes, cumpriam com as perguntas de rotina e logo nos liberavam. A presença de “forças de segurança” é grande em todos os cantos, exército e Polícia misturam-se. O país, segundo dados oficiais, tornou-se muito mais seguro durante o último ano. Esse fator faz com que o atual presidente, Uribe, seja extremamente popular.

O povo Colombiano afirma-se, nesse momento, satisfeito com as políticas de Uribe. Com apoio total dos Estados Unidos, o presidente está colocando em prática o Plano Colômbia, para o combate às drogas e ao “terrorismo”. Nesse momento, existe um grave problema diplomático entre o Equador e a Colômbia. O Plano Colômbia prevê fumigação de campos de plantação de folha de coca, muitos dos quais se encontram próximos à fronteira norte com o Equador. Os produtos usados nesse processo são nocivos à saúde e o governo equatoriano vem recebendo denúncias de contaminação da população que vive na região fronteiriça.

Percebe-se também diversos cartazes do Plano Colômbia espalhados pelo principal porto de Cartagena. A mensagem, escrita em inglês e espanhol, pede que os cidadãos denunciem qualquer movimentação suspeita. Note-se que a central de atendimento a essas denúncias fica nos Estados Unidos.

Alguns cidadãos mostram-se um pouco preocupados, pelo fato de estarem “sozinhos em meio a vizinhos comunistas (Equador e Venezuela)” – comentou um colombiano que reside na Alemanha, em passagem por seu país. Diversos estabelecimentos comerciais exibem um cartaz de Uribe com a frase “Adelante Presidente!”.

Ao assistirmos aos noticiários pudemos observar uma Colômbia bastante conservadora e com extremos preconceituosos. Os índios são retratados pelos meios de comunicação como sendo aproveitadores por pedirem esmola com seus filhos nas ruas. O chefe da policia de Bogotá chegou a afirmar em cadeia nacional que “não se pode tomar medidas mais extremas em relação aos índios, pois eles estão protegidos por leis especiais”.

As mulheres, assim como no Brasil, estão quase sempre seminuas, rebolando em comerciais de cerveja e em programas de auditório. A maneira como a mulher é representada na televisão mostrou-se como uma grande mudança cultural em relação aos países que visitamos anteriormente. Nos EUA, México assim como em toda a América Central, não há a mesma representação feminina. Ainda que a cultura machista esteja presente em todas as nações que visitamos, a Colômbia é a única que apresenta suas mulheres como produto de exportação e comercialização.

Esta breve passagem pela Colômbia, com suas alegrias e tristezas, veio mostrar-nos que estamos cada vez mais perto de casa.

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(*) Latinautas é o apelido dado pela Carta Maior à equipe da expedição “Da América para as Américas”, formada por Milena Costa de Souza, Pedro José Sorroche Vieira, Thiago Costa de Souza e Ligia Cavagnari. Eles atravessarão as américas, passando por 17 países, percorrendo mais de 25 mil km em busca de uma identidade de resistência à hegemonia política, econômica e cultural exercida pelos EUA.