Violência: estudantes africanos da UnB sofrem preconceito racial
O estudante Galdencio Costa (foto) disse que africanos que moram nos alojamentos da Universidade de Brasília (UnB) são perseguidos por preconceito racial há mais de cinco anos. Apartamentos de africanos na UnB foram queimados essa semana e mensagens de ódio foram pichadas nas paredes
Janari Damasceno
Rádio Nacional
Estudantes africanos que moram nos alojamentos da Universidade de Brasília (UnB) estão sendo perseguidos por causa de preconceito racial há mais de cinco anos, afirma o estudante de administração Samony Guilherme, de 28 anos, de Guiné Bissau – país africano de língua portuguesa. Ele conta que brigas entre brasileiros e africanos começaram há muitos anos por um grupo pequeno e essa rixa foi herdada por gerações seguintes de estudantes, mesmo sem saber o motivo que originou o conflito.
Segundo conta, esses fatos nunca foram expostos para a sociedade ou para a reitoria da UnB, pois eram casos isolados. Mas a situação se agravou na madrugada de da última quarta-feira, 28, quando um grupo de pessoas ateou fogo na porta de três apartamentos onde moravam apenas africanos. Nas paredes, pixações com a frase “morte aos estrangeiros”.
Quem viu a forma como o incêndio começou relata que houve um crime premeditado, tendo em vista que camisas foram postas em baixo da porta para evitar que os estudantes sentissem o cheiro da fumaça. Esponjas com tijolos foram presas contra a porta, para que o fogo realmente consumisse a madeira. Os extintores de incêndio do primeiro e segundo andar foram esvaziados e gasolina foi usada para atear o fogo.
O estudante Quebá Carimo Cairabá, de 28 anos, aluno de administração, está tão assustado que quer deixar o país. Segundo ele, “foram moradores do prédio mesmo, que têm preconceitos e dizem que não temos o direito de morar aqui na UnB, porque temos dinheiro e estamos tirando as vagas que são de brasileiros. Quero me formar o mais rápido possível e ir embora pra Guiné Bissau, o que é muito triste, pois sempre tive o sonho de vir para cá conhecer o país pacato do samba, futebol e das praias”.
De acordo com o vice-reitor da UnB, Edgar Mamia, a universidade fará uma investigação própria com a criação de uma comissão – os envolvidos serão expulsos. A Polícia Federal também investiga o caso e o Itamaraty publicou uma nota dizendo que “o governo brasileiro reitera seu repúdio a quaisquer atos de violência que não se coadunam com o espírito aberto, tolerante e acolhedor do povo brasileiro”. Todos os 17 alunos africanos foram levados para um hotel que permanece em sigilo.
Manifestações contra o racismo acontecerão durante as próximas semanas na UnB.
Segurança reforçada
O diretor de Serviços Gerais e Segurança da UnB, Weglisson Medeiros Ferreira, disse que a segurança no prédio da Casa dos Estudantes foi reforçada com um guarda em cada andar, além da portaria.
Segundo Medeiros os atritos entre estudantes brasileiros e africanos já aconteciam há pelo menos seis meses, inclusive com episódios de luta corporal. Medeiros disse que no dia 28, quando chegou ao local do incêndio o fogo já havia sido apagado. “Chegamos para dar apoio aos estudantes”, disse.
Ele é uma das oito pessoas que a Polícia Federal deve ouvir hoje, dia 30, sobre o incêndio em três apartamentos ocupados por estudantes africanos em alojamento da UnB. Ontem, a PF instaurou inquérito para investigar o caso.
A assessoria de imprensa da PF informou que os depoimentos começaram por volta das 9h. Serão ouvidos alunos, funcionários e seguranças. No final da tarde de hoje a PF deve divulgar um balanço sobre o início das investigações.
Representantes do Congresso Nacional, da Polícia Federal e da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir) do governo federal se reuniram ontem, 29, com o reitor da Universidade de Brasília (UnB), Timothy Milholland, para discutir o incêndio na Casa dos Estudantes.
O dia 28 de março foi instituído como o Dia da Igualdade Racial na UnB. A decisão foi anunciada ontem pelo reitor da universidade Timothy Milholland.