Criada em SP a Frente Parlamentar pela Reforma Agrária

Verena Glass
Agência Carta Maior

Articulada pelos deputados Simão Pedro (PT) e Raul Marcelo (PSOL), foi lançada ontem, dia 3, a Frente Parlamentar pela Reforma Agrária na Assembléia Legislativa de São Paulo (ALESP), contando com a adesão de 19 nomes (10 deputados petistas, dois do PSOL, dois do PMDB, e os outros do PV, PSB, PDT, PTB e PP) – o que perfaz cerca de 20% dos 94 deputados da casa.

Com o objetivo principal de acompanhar e apoiar as ações sociais de luta pela terra, monitorar as políticas públicas de reforma agrária e sua implementação pelo governo do estado e, na medida do necessário, criar legislações específicas para acelerar o processo de atendimento da demanda dos sem-terra, a Frente pretende fazer inicialmente um mapeamento da situação agrária do estado, explica Raul Marcelo, uma vez que existiria um falso consenso de que São Paulo tem relativamente poucos problemas fundiários ou demandas por reforma agrária.

Segundo o deputado, as periferias e bolsões de pobreza das áreas urbanas de São Paulo continuam sofrendo um inchaço com a chegada de uma população de perfil predominantemente camponês, problema que pode ser agravado pelo crescente
investimento nas monoculturas canavieiras e de eucalipto e pinus para papel e celulose no estado.

Por outro lado, ponderam os parlamentares, São Paulo ainda tem extensas áreas de terra ocupadas ilegalmente e que deveriam ser recuperadas pelo estado para destinação à reforma agrária. Apenas na região do Pontal do Paranapanema, onde os conflitos fundiários têm sido mais agudos no estado, cerca de 400 mil hectares são comprovadamente terra devoluta ocupada irregularmente por grandes fazendeiros, segundo dados do governo do estado.

Uma primeira tentativa de regularização fundiária na região se deu em 2003, quando a ALESP aprovou um projeto que criou mecanismos de legalização das posses de até 500 hectares, explica o deputado Simão Pedro. “Mas este projeto nunca foi encaminhado ou aplicado pelo governo porque a maioria dos grandes fazendeiros do Pontal ocupam áreas muito maiores. Regularizados apenas 500 hectares, eles perderiam grande parte de suas terras [muitas com mais de 2 mil ha], que seriam retomadas pelo estado”.

Um novo projeto de lei, em gestação no Executivo, deve propor agora um outro tipo de regularização das terras do Pontal, explica o deputado Mauro Bragato (PSDB). Segundo ele, a intenção é negociar a titulação das áreas com os fazendeiros de forma que eles acabem pagando um preço pelas terras públicas ocupadas. “Ou em dinheiro, ou em terra mesmo para fazer assentamentos. Ou seja, queremos resolver as pendências jurídicas e sociais na região, regularizando as grandes áreas e destinando terras para os assentamentos”.

Segundo o deputado Ed Thomas (PMDB), a maioria dos processos envolvendo terras griladas está se arrastando na Justiça, mas os fazendeiros estariam propensos a negociar. “A UDR já está buscando compensação, ninguém aguenta mais tanta invasão de terra no Pontal. Por conta dos conflitos, a terra na região está muito desvalorizada. O que vai acabar acontecendo é que todo mundo vai arrendar as terras para plantar cana por lá. O gado mesmo já foi transferido todo para Mato Grosso, onde os produtores têm vantagens fiscais. Mas acho que temos que esperar para ver qual a proposta de regularização que virá do Executivo”, pondera.

“Este projeto é um absurdo”, reage Simão Pedro, para quem o estado teria que encaminhar a regularização de 500 hectares, já aprovada. “O governo não usa os instrumentos que tem para recuperar terras públicas, porque o único setor com quem dialoga são os grileiros”. Tanto ele quanto Bragato e Ed Tomas concordam que a nova proposta de regularização do Pontal vai gerar um grande debate na ALESP.

Desafios

Para o dirigente nacional do MST, Delwek Matheus, a criação da Frente é bem-vinda principalmente como mais um instrumento de apoio às reivindicações dos movimentos sociais perante a opinião pública. Segundo Matheus, apenas o MST tem mais de 3 mil famílias acampadas no estado, e a pressão da ALESP para regularizar áreas públicas e devolutas – além do Pontal, a região do Ribeira do Iguape e de Iaras também teria grande volume de terras griladas – poderá ser um reforço ao avanços da reforma agrária.

Por outro lado, a Frente também poderia criar instrumentos de proteção e fomento da agricultura familiar no âmbito legislativo, avalia Matheus. Neste sentido, um dos projetos já aventados com parlamentares da Frente é a criação de instrumentos que limitem a expansão das monoculturas canavieira e de reflorestamento para proteger as propriedades familiares. Por outro lado, também poderiam ser criadas linhas de crédito e fomento para a agricultura familiar e orgânica, instrumentos de facilitação de escoamento e comercialização da produção, entre outros.

Segundo o deputado Raul Marcelo, os parlamentares da Frente têm ciência de que tirar o setor da agricultura familiar e da reforma agrária da marginalidade não será uma tarefa simples; mesmo porque nomes fortes do governo, como o secretário do Meio Ambiente, ex-deputado Francisco Graziano, membro da CPMI da Terra que criminalizou os movimentos sociais do campo, são considerados oponentes da reforma agrária.

Os deputados da Frente Parlamentar pela Reforma Agrária em São Paulo são:
Simão Pedro, Carlinhos Almeida, Donizete Braga, Enio Tatto, Hamilton Pereira, José Candido, José Zico Prado, Marcos Martins, Vanderlei Siraque e Roberto Felício (PT), Raul Marcelo e Carlos Gianazzi (PSOL), Ed Thomas e Uebe Rezeck (PMDB), Afonso Lobato (PV), Edson Ferrarini (PTB), Rafael Silva (PDT), Vinicius Camarinha (PSB) e Antonio Salim Curiati (PP).