Escola Politécnica aposta na parceria com movimentos sociais

Apostar na cooperação técnica e na força dos movimentos sociais. É isso que vem fazendo a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, ao investir nas relações institucionais com o MST. A parceria formal começou em 2005, quando João Pedro Stedile, dirigente nacional do MST, apresentou a aula inaugural dos cursos técnicos da Escola. De lá para cá, já são mais de dois anos de trabalho conjunto. “A proximidade com os movimentos sociais é importante porque nos permite lidar diretamente com as demandas das camadas populares sobre educação e saúde. No caso do MST, é interessante também porque nos aproxima da discussão sobre essas questões em relação à população do campo”, explica a vice-diretora de pesquisa e desenvolvimento tecnológico da EPSJV, Isabel Brasil.

A representante do MST do Rio de Janeiro, Fernanda Matheus, também acha que é importante para os movimentos sociais acompanhar e fazer parte do processo educacional porque isso garante que a sociedade, de alguma forma, participe na formação dos profissionais. “Quando começamos a organizar atividades relacionadas à saúde, como projetos de discussão e prevenção do HIV e cursos de técnicos em saúde comunitária, buscamos instituições que pudessem nos auxiliar. A EPSJV apareceu como referência na área da Saúde Pública e uma oportunidade de termos acesso à produção tecnocientífica que a Escola desenvolve”, afirma Fernanda.

A cooperação tem se dado, principalmente, por meio de oficinas sobre questões relativas ao ensino e cursos. Em 2005 e 2006, Isabel e Marise Ramos, coordenadora da pós-graduação em Educação Profissional em Saúde da EPSJV, promoveram assessorias junto ao setor de Educação do MST. Já este ano, Isabel participou do Seminário ‘Que Educação, Para que Trabalho e Para que Campo’, promovido pelo Instituto Técnico de Capacitação e Pesquisa da Reforma Agrária (Iterra) com o objetivo de discutir a formação profissional realizada e desejada pelo movimento da Reforma Agrária do Campo na Região Sul do País. “Temos organizado debates que buscam a troca de conhecimentos e percepções em torno da Educação. Tanto o MST quanto a EPSJV trabalham na perspectiva da formação técnica integral e da iniciação científica no Ensino Médio e no técnico. Nossos projetos institucionais se assemelham também na construção coletiva do processo educativo, na preocupação com a formação docente e no entendimento de que essas questões não são apartadas da crítica ao capital e da possibilidade de se construir um outro projeto de sociedade”, diz.

Em 2007, com o ingresso da pesquisadora Virginia Fontes na EPSJV, a parceria se estendeu para a Escola Nacional Florestan Fernandes, instituição criada pelo MST, em Guararema, São Paulo, para a formação política de quadros do Movimento. Professora da pós-graduação em Educação Profissional, Virgínia já trazia uma larga experiência de trabalho com o MST: ela participa de convênios do Movimento com universidades públicas e é responsável pela implantação de cursos conjuntos como, por exemplo, um de ‘Realidade Brasileira’, desenvolvido na Universidade Federal Fluminense. Na opinião da pesquisadora, os projetos do MST e da EPSJV se cruzam na medida em que buscam explorar a relação entre Trabalho, Educação e Saúde. “É importante estabelecer a interface entre situações que são semelhantes, embora, à primeira vista, pareçam diferentes. Um exemplo é o exercício de pensar a saúde coletiva junto com a socialização dos serviços públicos”, explica a pesquisadora, que representou a EPSJV no 5° Congresso Nacional do MST.

Outro tema que tem mobilizado a cooperação entre o MST e a Escola Politécnica é a pesquisa. Recentemente, Isabel Brasil foi convidada a discutir com eles o desenvolvimento da iniciação científica no ensino técnico, tendo como referência principal o Projeto Trabalho, Ciência e Cultura da EPSJV, por meio do qual os alunos são formados para produzir uma monografia de conclusão de curso. O Iterra, que coordena as atividades de ensino e pesquisa do MST e abarca o Instituto de Educação Josué de Castro, voltada para a formação de técnicos, e a Escola Nacional Florestan Fernandes, de educação política não-formal, já tem um termo de referência em pesquisa, mas está debatendo caminhos para aperfeiçoá-lo. A EPSJV também tem aproveitado essas discussões para sistematizar o seu próprio termo de pesquisa. “O maior ganho da parceria com o MST se dá na troca de concepções em torno desses pontos em comum nos projetos, que ajuda a Escola a pensar a questão do trabalhador de nível técnico da saúde e do campo”, explica Isabel.

A mesma preocupação com as condições da população rural e com os profissionais em saúde para o campo levou o Laboratório de Vigilância em Saúde (Lavsa) da EPSJV a desenvolver o projeto ‘Demandas de Saúde do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST: elementos para a formulação de proposta didático-pedagógica voltada para a promoção à saúde da população do campo’. O objetivo é elaborar uma proposta didático-pedagógica para a formação de profissionais de nível médio em saúde para o trabalho no campo. Para traçar as ações mais eficazes na melhoria da saúde do campo, o projeto de pesquisa se concentra nas condições e demandas de saúde dos assentados do MST. O co- coordenador do projeto, José Paulo Vicente, explica a escolha: “O MST é a melhor representação que poderíamos ter, pois é o movimento mais expressivo na luta pela Reforma Agrária e pela melhoria das condições de vida da população do campo. Além disso, ele visa romper com o modelo econômico vigente, que exclui a parcela rural da sociedade das riquezas produzidas, não privilegia o desenvolvimento sustentável e acarreta subemprego, êxodo rural, desemprego nas cidades, formação de periferia, ou seja, um modelo atrasado e sem infra-estrutura” .

Os integrantes do projeto realizam pesquisas qualitativas que englobam a análise de bibliografia sobre o tema, trabalho de campo e entrevistas em assentamentos e acampamentos do MST do Rio de Janeiro e do Rio Grande do Sul. “Na formulação do projeto está a noção de olhar para o sujeito para o qual se dirige a Política Pública — aquele cuja visão, historicamente, não é levada em conta. Por isso é importante incorporar os movimentos sociais. O projeto se dispõe a olhar diferente para o campo, buscando estabelecer políticas públicas focadas nessa população e ainda reunir elementos necessários para pensar políticas de vigilância e promoção da saúde para o campo”, afirma José Paulo.

Um dos desdobramentos desse projeto foi o “I Encontro com o Coletivo Estadual de Saúde do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra”, que promoveu, no dia 1º de junho, uma mesa-redonda para discutir os “Desafios para a Reforma Sanitária, saúde da população do campo e formação humana para o SUS”. O objetivo do encontro era preparar os alunos do Curso de Saúde Alternativa do MST/RJ para o Encontro Nacional do MST, realizado em Brasília entre os dias 11 e 15 de junho. Participaram do debate o pesquisador Eduardo Stotz, da ENSP/Fiocruz, a representante do MST/RJ Fernanda Matheus e Isabel Brasil. Para Fernanda, o debate foi norteado pelo grande desafio da formulação de uma proposta didático-pedagógica, que é equilibrar a formação técnica com a formação política e assim formar trabalhadores politicamente engajados.

Fonte: www.epsjv.fiocruz.br