MST denuncia crimes de empresa pública em Santa Catarina

Num exemplo de solidariedade entre os trabalhadores do campo e da cidade, o MST promoveu na quinta-feira, dia 25, em Caçador, meio oeste catarinense, uma mobilização estadual, congregando diversos movimentos, entidades e parlamentares. Cerca de 500 pessoas saíram em caminhada do acampamento Sebastião Siqueira, na área da Embrapa cedida à Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural (Epagri), em direção ao centro da cidade.

O objetivo da marcha foi denunciar os problemas na gestão das terras, que
pertencem à Embrapa e são utilizadas pela Epagri e, ao mesmo tempo, prestar solidariedade aos companheiros em luta nos estados do RS e PR que sofrem com a violência do latifúndio articulado com empresas transnacionais. Entre os problemas na gestão das terras coordenadas pela Epagri, são evidenciados agressões ambientais, direcionamento da pesquisa apenas para fins privados e armazenamento irregular de embalagens de agrotóxicos.

Durante os dez quilômetros de caminhada, os trabalhadores receberam apoio da população de Caçador. Professores e alunos de uma escola pública entregaram uma moção de apoio à luta do MST. Ao passar em frente do prédio da Justiça Federal, os marchantes entregaram pratos com ramos de pinus na portaria do prédio, que estava cercado pela Polícia Federal. O ato simbólico denunciou que, “ao continuar produzindo somente pinus nas nossas terras, as futuras gerações irão comer pinus e eucalipto”.

O coordenador do MST, Vilson Santin, destacou que o principal debate que a sociedade deve fazer trata do destino das pesquisas da Epagri na área de Caçador. “Questionamos a função das pesquisas. A Epagri devia trabalhar com pesquisa e extensão direcionada às pequenas ropriedades, contudo, prioriza somente as grandes empresas privadas”, afirma.

Santin destaque que os pequenos agricultores da região não contam com apoio e que a Epagri não consegue gerir a área de pesquisas em Caçador. “Eles mesmos admitem que não têm controle sobre a Área de Preservação Permanente (APP) que fica nas terras e que as pesquisas são direcionadas para o grande agronegócio”, complementa.

O Incra realizará levantamento completo na propriedade, o que segundo Santin permitirá ao MST destacar todas as denúncias apresentadas à sociedade. A intenção do movimento é cassar a liminar que concedeu à Embrapa, que é a responsável pela terra, a reintegração de posse da área. Ele, explica que o ato também repudia o ataque de uma milícia armada, no último domingo, a um acampamento do MST em Santa Tereza do Oeste, no Paraná. A ação acabou com a morte de um agricultor do MST e outros seis feridos gravemente.

Proposta

A proposta do MST é compatibilizar na área três interesses. O primeiro é investir, de forma conjunta e com o apoio do MST, na preservação da Área de Preservação Permanente de 800 hectares, que está nas terras. Isso intensificaria a fiscalização e impediria a degradação do local.

O segundo ponto trata do comodato entre Embrapa e Epagri. Como ele não está sendo cumprido, o movimento propõe que parte da área pública seja transformada em um assentamento para 40 a 50 famílias de agricultores.

Eles trabalhariam de forma cooperada, em um assentamento modelo que levaria em conta as peculiaridades do local, como a Área de Preservação Permanente e o fato de estar próximo de uma área de pesquisa.

O terceiro ponto propõe que a Epagri mantenha todos os laboratórios e uma grande área destinada à pesquisa. O Incra e o Ministério do Desenvolvimento Agrário propõem-se a assinar convênio com a Epagri para disponibilizar recursos para pesquisas em parceria.

A área
A área pertence à União, contudo, está cedida em comodato pela Embrapa à Epagri. É uma espécie de posse precária que a Epagri detém para realizar pesquisas e experimentos agropecuários direcionados à pequena agricultura.

Os dados sobre seu tamanho são contraditórios: a Epagri afirma que são 1.530 hectares, enquanto o MST defende nova medição, o que já foi autorizado pelo Incra. Desse total, cerca de 800 hectares são Área de Preservação Permanente (APP), portanto, não cultiváveis. Sobrariam, conforme a medição da Epagri, 730 hectares, destinados à realização dos experimentos.

Contradições

– A Polícia Ambiental já foi até o local averiguar as denúncias do MST. Fotos comprovam que diversas áreas foram desmatadas e a terra foi deixada nua.
– Em diversos desses locais desmatados, como apontam as imagens, há lavouras de pinus implantadas onde havia mata nativa.
– O MST questiona se é plausível que uma área tão extensa de terras seja utilizada para pesquisa. Conforme relatos dos próprios funcionários da Epagri, a empresa não consegue acompanhar e fiscalizar as atividades, principalmente na Área de Preservação Permanente.
– Ainda segundo relato de funcionários, a área dá prejuízo para a Epagri, que para sustentar a pesquisa é obrigada a plantar milho.
– Denúncias indicam que, em outros anos, a área foi arrendada a terceiros, o que a legislação proíbe.
– A pesquisa, segundo o movimento, é fundamentalmente direcionada para o agronegócio, para as grandes empresas do ramo madeireiro e pouco ou nada
do que se produz de pesquisa em Caçador é direcionado às pequenas propriedades, uma das principais missões da Epagri.
– O MST alerta que a exploração da monocultura do pinus, em várias regiões, já é extremamente prejudicial ao meio ambiente. Contudo, o caso de Caçador é ainda mais grave, já que a pesquisa sobre a cultura ocupa uma área da União e que contém uma extensa Área de Preservação Permanente.
– O movimento denuncia que não há controle sobre a Área de Preservação Permanente, principalmente em relação à caça e extração irregular de madeira da mata nativa. Foram registrados pinheiros derrubados e toras prontas para o carregamento ao lado da Estrada.
– Mais de 10 casas, na propriedade, serviam como depósitos precários de
embalagens de defensivos agrícolas. Apesar do perigo de contaminação do
lençol freático e da exposição das pessoas às embalagens, a Epagri somente
preocupou-se com o fato quando afirmou que os poços artesianos poderiam
ser contaminados pela presença de pessoas sobre a área. O veneno, segundo
eles, não apresentava qualquer risco.
– A Epagri, que deveria zelar pela área, usa todo tipo de agrotóxico para depois jogar em qualquer lugar, sem os mínimos cuidados de segurança exigidos pela legislação.
– Dois dias depois da ocupação do Movimento os agrotóxicos foram retirados do local também de forma precária.
– O MST ainda denuncia que está se utilizando o dinheiro público da Epagri exclusivamente para empresas privadas, ao invés de fomentar, de forma preferencial, a agricultura familiar, já que na região a ampla maioria das áreas, cerca de 90%, é de pequenas propriedades.
– A extensão rural, que aproxima pesquisa e o homem do campo, não está sendo implementada pelo fato dos recursos serem direcionados exclusivamente a pesquisas pontuais, que beneficiam grandes empresas.
– A afirmação de um dos diretores da Epagri impressionou o movimento: “investir e pesquisar somente o que dá lucro”.