Mulheres em Luta

Da Radioagência NP

“As mulheres da Via Campesina em luta contra as transnacionais e o agronegócio”. Esse é o lema da jornada de lutas que será realizada pela Via – entidade que reúne movimentos sociais de quatro continentes – neste ano, todas ligadas ao oito de março – data em que se comemora o Dia Internacional das Mulheres. As manifestações vão ocorrer durante toda a semana em aproximadamente 18 estados brasileiros.

A Via Campesina, o MST e demais organizações, trazem novamente a bandeira de defesa da soberania alimentar e atacam a política irresponsável da CNTBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança), influenciada por empresas que visam a destruição do meio ambiente por meio da expansão do agronegócio. Empresas que tem os interesses voltados na produção de alimentos geneticamente modificados – os transgênicos – e na expansão da monocultura de cana-de-açúcar para a produção de etanol.

Para discutir os problemas existentes no meio rural brasileiro sob o ponto de vista feminino, a Radioagência NP conversou com a integrante da coordenação nacional do setor de Gênero do MST, Lourdes Vicente.

RNP: Conte sobre o oito de março e a luta histórica das mulheres.

A história das mulheres e a luta do oito de março tiveram inicio com a Clara Zetkin, na Segunda Internacional [socialista], onde ela sugeriu um dia específico para que as mulheres fossem às ruas levar suas bandeiras. Ao longo do tempo, essa idéia inicial da Clara Zetkin é alterada no sentido de tornar esse dia uma data em homenagem à mulher e não da mulher em luta, a mulher socialista. Então o MST está tentando ao longo dos anos, juntos com alguns movimentos de mulheres da cidade, retomar esse tema como um dia de luta das mulheres. Hoje essa luta tem crescido devido ao avanço do capitalismo e do agronegócio no campo. À medida que avança o agronegócio no campo as mais atingidas são as mulheres e as crianças.

RNP: Fale sobre a luta histórica da mulher na a defesa de sua soberania e seu reconhecimento enquanto um ser político.

Isso se inicia com a luta por voto e para melhores condições de trabalho, essa segunda é uma bandeira de luta que permanece até hoje. As péssimas condições de trabalho ainda continuam voltadas principalmente para as mulheres. Há também essa luta por reconhecimento como sujeito político, participante de um movimento social como o MST. Em segundo lugar, como mulheres com direitos tanto para melhorar a qualidade de vida, como para que elas se afirmem por direito à igualdade, autonomia e o reconhecimento do seu trabalho.

RNP: O trabalho das mulheres no campo doméstico ou não, nem sempre é reconhecido. Isso não implica em problemas previdenciários e trabalhistas?

No caso da Previdência temos uma luta para que as mulheres sejam reconhecidas como trabalhadoras rurais, como agricultoras, porque até então a maioria das mulheres do campo eram vistas como donas de casa. Isso gera problemas com aposentadoria e com o salário maternidade que é um direito. A afirmação das mulheres como trabalhadoras rurais é um trabalho de identidade que estamos tentando fortalecer e, ao mesmo tempo, fazendo uma luta para a garantia desses direitos.

RNP: E a educação, é precária?

A educação é precária em todos os aspectos, tanto para homens quanto para as mulheres, e isso no campo é ainda pior. Estamos tendo um trabalho para garantir não somente a participação igualitária das mulheres no que diz respeito ao acesso à educação, mas acima de tudo, para que não seja uma educação que discrimine. Essa educação deve levar em conta o reconhecimento das mulheres e não deve contribuir para a discriminação das mulheres, isso seja por meio de imagens [material pedagógico], textos ou linguagem que não pode ser sexista, e sim, deve levar em conta essa emancipação.

RNP: Quais os avanços registrados em políticas públicas e os desafios a superar?

São poucos os avanços. Temos uma bandeira de luta que é o acesso das mulheres à terra, porque as mulheres sempre foram vistas como dependentes dos maridos. Isso é um trabalho muito difícil porque envolve toda questão jurídica e além da decisão governamental, também envolve vários setores do governo que não são fáceis de mudar. Temos algumas conquistas pequenas nesse aspecto. Por exemplo, o cadastro de quem é acampado hoje deve ser em nome do homem e da mulher, mas isso ainda não é uma realidade para o conjunto do país. Isso exige todo um trabalho para que os Incra’s [Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária] estaduais possam implementar esse novo cadastro. Essa é uma grande conquista, mas é pequena ao mesmo tempo. Até o ano passado, na maioria dos assentamentos existentes, as mulheres ainda eram dependentes.