MST resiste e mantém agenda de lutas no Mato Grosso

A Estátua da Justiça fica na praça da República, em pleno Centro de Cuiabá, capital de Mato Grosso. Chama a atenção de quem passa porque deve medir quase 4 metros. É da deusa Têmis, a deusa da justiça na mitologia grega, talhada pelo escultor Jonas Corrêa e inaugurada nos meados da década de 90.

A estátua é, entretanto, uma Têmis de olhos vendados. Nas costas do monumento, vazam, pela cela, mãos de detentos imaginados pelo autor. Na inscrição “Ju $ tiça”, o cifrão também dá o recado. Trata-se de um protesto e quer dizer o seguinte: a justiça, no Brasil, é cega e só vê quando importam os interesses de alguns afortunados. Haveria lugar mais propício para uma coletiva com a imprensa, convocada pelo MST em Mato Grosso? Principalmente neste momento em que o MST é o alvo para o qual setores mais conservadores da justiça brasileira lançam fogo.

Na coletiva, o MST deu o pontapé inicial à Jornada de Lutas por Reforma Agrária no estado, onde o agronegócio avança imponente. A atividade principal neste mês em Mato Grosso será a marcha de 100 quilômetros a ser encarada por cerca de 300 trabalhadores do campo, homens e mulheres. E a presença do integrante da direçãonacional do Movimento, João Pedro Stedile, que participará não só de um dos atos públicos, mas também fará um seminário no dia 23/4, às 19h, no auditório da Adufmat (Associação dos Docentes da UFMT), que está apoiando a marcha.

“A Adufmat sempre foi solidária aos Sem Terra. Esse seminário é de extrema importância nesse momento e aproveito para convidar toda a comunidade da UFMT a participar”, convoca o presidente da Adufmat, Carlinhos Eilert.

Para inaugurar o movimentado abril, militantes do MST jogaram a bandeira do Movimento sobre a estátua. Pés calejados de trabalhadores rurais Sem Terra voltam a pisar o asfalto. Desta vez, na Marcha por Reforma Agrária, emprego e defesa do Meio Ambiente. Em Mato Grosso, um grupo de homens, mulheres e crianças saem de Jangada (a cerca de 100 quilômetros de Cuiabá), no dia 14/4, às 8h, após um ato de largada.

A marcha fará três paradas pelo caminho até o Trevo do Lagarto, em Várzea Grande, onde chegam no dia 19/4. No dia 17/4, em Cuiabá, será lançada a campanha “Limite da Propriedade da Terra: em defesa da reforma agrária e da soberania territorial e alimentar”, puxada pelas Assembléias Populares.

No dia 22/4, a marcha segue até a praça Alencastro, Centro da Capital, para outro ato público, desta vez em aliança com todos os movimentos do campo e da cidade, que respeitam a atuação do Movimento.

O MST-MT está fazendo também debates nas escolas, levando o tema Reforma Agrária para dentro da sala de aula. Em Mato Grosso, há cerca de 4 mil famílias assentadas. Isso não quer dizer que estejam com todos os seus problemas resolvidos. O abandono governamental após assentamentos é fato concreto. Por causa disso, problemas ambientais surgem em diversas áreas e tem sido insistente, na grande mídia, o discurso de que os assentados é que são culpados pelos graves problemas ambientais, como o desmatamento desenfreado. “Isso não é verdade. Quem desmata de modo feroz é o agronegócio, é a pecuária”, afirma Antônio Carneiro, da coordenação estadual do Movimento. Segundo ele, 3 mil famílias ainda amargam a vida debaixo de lonas pretas, à beira de estradas, dentro de território mato-grossense.

A seguir, leia a nota da direção estadual do MST em Mato Grosso sobre a marcha:

Nos mobilizamos, para enfrentar a crise política, econômica, social e ambiental, criada pelas elites que controlam o Estado: capital financeiro internacional e transnacional. Não aceitamos pagar a conta da crise, com a super exploração do nosso trabalho, baixos salários, aumento da jornada de trabalho e com o avanço da exploração sobre os recursos naturais. Por isso, DENUNCIAMOS:

O AGRO E O HIDRO NEGÓCIO SÃO INSUSTENTÁVEIS: os monocultivos, com destaques para a cana, soja e eucalipto e criação de gado causam fortes desequilíbrios ambientais, sérios problemas sociais, gerando graves conseqüências para a humanidade, através do uso intensivo de venenos. É um modelo que se apropria e domina a água, a terra, as fontes de energia, os minérios, as sementes e toda a biodiversidade. Exerce controle das sementes, através dos transgênicos, que provoca o aumento de doenças, especialmente em mulheres e crianças. Avança sobre os recursos naturais, a Floresta Amazônica, o Cerrado, a Mata Atlântica, os Pampas e o Semi-Árido nordestino, com a ganância de aumentar seus lucros.

A SUPER EXPLORAÇÃO DO TRABALHO: os grandes lucros deste modelo são obtidos através de baixos salários, precarização do trabalho, ameaça constante de desemprego e condições semelhantes de trabalho escravo. É esta super exploração do trabalho que permite que as empresas transnacionais e os bancos tenham no Brasil as mais altas taxas de lucros.

O FINANCIAMENTO DE ESTADO: este modelo é beneficiado através de investimentos públicos que tira dos pobres em forma de impostos e passa os recursos para os ricos através de isenção de impostos e benefícios fiscais. A sociedade brasileira gasta atualmente cerca de 150 bilhões de reais ao ano no pagamento dos títulos da dívida pública, que são repassados para 20 mil famílias: donos de bancos, especuladores nacionais e internacionais. Sem esses recursos, o governo não consegue investir em educação, empregos, saúde, direito previdenciário, habitação e reforma agrária. Este repasse se dá principalmente através dos recursos do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador) e do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) que são órgãos governamentais. É o modelo mais rentável para os capitalistas e o mais dependente de investimento público. Por gerar divisas em dólares, o Governo Federal e o Estado lhes dão total amparo, em especial em linhas de crédito. O Agronegócio recebe mais de 65 bilhões de reais por ano dos bancos públicos e tem isenção de impostos de exportação. Exportar apenas matéria prima não desenvolve o país, nem distribui renda a todos e todas.

ALIANÇA CRIMINOSA: Há uma aliança entre os capitalistas, os grandes proprietários de terras, as empresas transnacionais e o sistema financeiro, que controlam o fornecimento dos insumos industriais, adubos, fertilizantes, venenos e máquinas, controlam o preço e o mercado de cada produto. O Brasil continua priorizando a exportação de matéria primas, sem valor agregado, vendendo a baixos preços e transferindo grande parte de nossas riquezas naturais para os mega-capitalistas mundiais especialmente dos Estados Unidos e da Europa.

A CRIMINALIZAÇÃO DA LUTA: nos últimos tempos, o Estado tem utilizado todo aparato policial, o poder judiciário e a mídia para defender os interesses das grandes empresas, o Agronegócio e a propriedade privada e criminalizando as lutas e todos os Movimentos Sociais.

Reafirmamos a luta como única saída para as transformações sociais! Temos direito de lutar!
Nos mobilizamos para defender, a agroecologia, a biodiversidade, a agricultura camponesa cooperada, a produção de alimentos saudáveis, a Reforma Agrária, os direitos previdenciários, a saúde e educação gratuita e de qualidade para todos. Para defender a terra, a água e as sementes como bens da natureza a serviço dos seres humanos.

Marchamos: para resgatar a cultura e o conhecimento camponês, resgatar o nosso Brasil. E para isso convocamos todo o povo brasileiro a ir a luta. E nos unirmos para construir um novo projeto de desenvolvimento que beneficie o povo brasileiro e não as empresas e os bancos.

Seguiremos Sonhando, Lutando e Organizando as Mulheres, Homens, Jovens e Crianças da Classe Trabalhadora para defender os nossos direitos de viver no Brasil Justo, e Soberano.

MARCHA POR REFORMA AGRÁRIA, EMPREGO E DEFESA DO MEIO AMBIENTE

Somos trabalhadores e trabalhadoras rurais organizados no Movimento Sem Terra/Via Campesina, lutando e reivindicando o direito a um pedaço de terra, onde possamos plantar, colher e garantir uma vida digna às nossas famílias.

Viemos de várias partes do Estado de Mato Grosso, de diferentes comunidades, assentamentos e acampamentos para dialogar com a sociedade e os poderes constituídos com o objetivo de denunciar a condução das políticas em nosso país que favorece os ricos e aumenta a exploração e a miséria da classe trabalhadora. É por isso que marchamos:

Marchamos para reafirmar a necessidade da realização da Reforma Agrária como uma política de distribuição de terra, renda e riqueza para milhões de brasileiros que de forma direta ou indireta serão beneficiadas. O Mato Grosso não tem terra para os SEM TERRA, entretanto, é o Estado que mais tem estrangeiros donos de terras. O povo brasileiro precisa recolocar a Reforma Agrária na pauta do país e dizer que somente através dela é que vamos conseguir produzir alimentos de boa qualidade, a baixo custo e empregar milhares de pessoas que foram expulsas do campo pelo Agronegócio.

Somos contra a concentração da propriedade da terra, das florestas e da água, pois, além de causar a destruição da natureza, expulsa os camponeses, os pequenos produtores, os povos indígenas, os ribeirinho, os quilombolas. Condenamos a política agrícola e ambiental do Governo Blairo Maggi e do Governo Lula, pois só beneficia o agronegócio, seus interesses econômicos e incentiva a destruição ambiental.

Marchamos para reafirmar a necessidade da unidade de toda classe trabalhadora, do campo e da cidade para juntos construirmos um projeto popular para o Brasil, onde de fato possamos ter emprego, moradia, saúde, educação gratuita e de qualidade, alimentos saudáveis para todo o povo brasileiro.

Marchamos para denunciar a exploração da classe trabalhadora por seus patrões e fazer com que o nosso apelo seja ouvido e que soluções sejam tomadas: a cada dia aumenta o número de pessoas desempregadas, e agora com a crise dos ricos, sobra para nós, os empobrecidos, pagarmos a conta. Precisamos nos fortalecer enquanto classe trabalhadora para garantir que se cumpram os direitos trabalhistas e previdenciários; a maioria dos empregadores sequer assina a carteira de seus funcionários. É inadmissível e indignante vivermos ainda hoje com a existência de trabalho escravo em nosso país. Mato Grosso tem se destacado nesse índice tão perverso e desumano, alcançando o segundo lugar a nível nacional.

Marchamos para refletir e debater sobre a forma com que o meio ambiente está sendo tratado. O nosso Estado têm a riqueza de possuir três biomas: o Cerrado, a Floresta Amazônica e o Pantanal, porém, infelizmente a cada dia que passa, mais ameaçados estão nossas matas, florestas, rios, animais, clima e seres humanos…devido a busca desenfreada dos capitalistas pelo lucro. Precisamos viver em harmonia com a mãe terra. É preciso frear a ganância dos poderosos que, para seguir aumentando seus lucros passam por cima de tudo e de todos. Nos dias de hoje já vivenciamos vários problemas de ordem climática que é resultado da ganância dos ricos.

O povo não pode pagar a conta. Que os ricos paguem a conta da crise!

(Com informações da página da Adufmat)