A crise e o assalariamento temporário do agronegócio

Os fazendeiros do agronegócio são muito espertos, ou melhor, oportunistas, do ponto de vista político. Quando se trata de barganhar vantagens, dizem que são os sustentáculos do país, os maiores produtores e exportadores. Na hora de saldar suas dívidas aos bancos públicos, alegam que estão em crise, que a agricultura está pagando com o custo da crise internacional, que o governo não pode atualizar os índices que medem a produtividade de suas fazendas.

Os fazendeiros do agronegócio são muito espertos, ou melhor, oportunistas, do ponto de vista político. Quando se trata de barganhar vantagens, dizem que são os sustentáculos do país, os maiores produtores e exportadores. Na hora de saldar suas dívidas aos bancos públicos, alegam que estão em crise, que a agricultura está pagando com o custo da crise internacional, que o governo não pode atualizar os índices que medem a produtividade de suas fazendas.

Sua postura em relação ao trabalho na agricultura tem sido a mesma. Quando se trata de jogar com a opinião publica alegam que dão muito emprego, que sustentam os pobres do campo. Mas escondem que, na verdade, quem produz nas suas fazendas são trabalhadores rurais, contratados de várias modalidades. Há alguns que são moradores antigos e usam sistemas de parcerias ou arrendamento. Mas essa é uma forma residual, insignificante. Outros, uma parcela também pequena, são os assalariados permanentes: gente que mora na fazenda – em geral os melhores profissionais de cujo trabalho os fazendeiros necessitam o ano todo – como capatazes, tratoristas, gerentes e técnicos. E há a imensa maioria de trabalhadores da agricultura empresarial, os assalariados temporários. Em geral, possuem trabalho apenas seis meses ao ano.

O período entre janeiro e julho é o de maior trabalho para o assalariado rural no país. Estima-se que a maioria dos trabalhadores temporários não tenham registro em carteira e, portanto, nenhum direito social assegurado. Mas, na área da cana, laranja, frutas, soja (em que há uma fiscalização maior do poder público), os fazendeiros se obrigam a registrar em carteira mesmo os trabalhadores temporários que trabalham apenas de 4 a 6 meses por ano, são dispensados e re-contratados no outro ano. Até que isso aconteça, amargam um desemprego sazonal, enquanto os fazendeiros ficam com o resultado de seu trabalho.

Depois que eclodiu a crise internacional do capitalismo, a partir de meados do ano passado, foram publicados vários artigos na imprensa brasileira e comentários de dirigentes de fazendeiros sobre suas conseqüências na agricultura. O oportunismo predominou, sempre com argumentos para proteger os interesses dos fazendeiros, nunca os dos trabalhadores. Alguns amplificaram a crise sobre a agricultura e outros a desdenharam – como se os fazendeiros brasileiros tivessem a capacidade de superá-la, independente do sistema, graças apenas à sua sabedoria, esperteza e capacidade empresarial.

Agora, acaba de ser publicado um importante estudo, feito por técnicos do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócioeconômicos) que pesquisam o tema do assalariamento rural dentro da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag).

O estudo é revelador da gravidade da crise para os trabalhadores assalariados temporários na agricultura. Vamos aos dados. Na safra de 2007, os fazendeiros contrataram, em janeiro, 1,3 milhões de trabalhadores; em junho, dispensaram 1,2 milhão – ficaram apenas com uma parcela residual. Em janeiro 2008, o nível de contratação aumentou para 1,4 milhões e a dispensa em junho foi de 1,3 milhões. Veio a crise em meados de 2008 e, em janeiro de 2009, os fazendeiros contrataram apenas 714 mil trabalhadores. Ou seja, uma taxa de desocupação de 50% em relação à safra anterior. Em junho de 2009, dispensaram 585 mil desses trabalhadores. Assim, os trabalhadores assalariados temporários, com registro em carteira, amargaram um desemprego de 50%. Essa foi a maneira de os fazendeiros enfrentarem a crise: compraram mais máquinas e dispensaram as pessoas. Ou reduziram o plantio?

Analisando os dados por estado, percebe-se que o movimento de desemprego atingiu todas as unidades da federação. No caso de Pernambuco, o desemprego chegou a 70%. O mesmo movimento se percebe analisando por produto. A cana-de-açúcar – a maior empregadora de trabalho temporário, em especial para a colheita – costumava empregar em todo país cerca de 270 mil trabalhadores por safra. A partir de janeiro de 2009, foram empregados apenas 150 mil trabalhadores.

No caso da pecuária de corte, extensiva, que ocupa a maior parte de nossas terras (em torno de 200 milhões de hectares), é também o setor em que os fazendeiros se mostram mais conversadores, atrasados e reacionários. Grande parte deles “conquistou” suas fazendas na base da força, invadindo terras públicas e de povos indígenas. Foi este mesmo setor, que tem tanto espaço no congresso nacional e na mídia, que em janeiro de 2009 contratou apenas 114 mil trabalhadores assalariados temporários. Cinco meses depois, demitiu 110 mil.

A taxa de desemprego em relação a 2008 foi de 50%, e o nível de ocupação da mão-de-obra, em função de suas características extensivas, resulta numa taxa de ocupação risível. Os estados do Mato Grosso do Sul, Goiás e Mato Grosso (tidos como os líderes da produção de gado bovino), contrataram ao redor de 10 mil trabalhadores em cada estado. Níveis parecidos com os de contratação de apenas uma grande fábrica nos centros urbanos. Para piorar, no meio do ano, desempregam esses poucos trabalhadores.

As péssimas condições de vida e de trabalho destas pessoas também aparecem nos dados, contrastando com o discurso “progressista” dos fazendeiros. Cerca de 83% de todos os assalariados rurais do país ganham até 1,5 salários mínimos, ou seja, até R$ 700. Cerca de 28% deles, menos que um salário mínimo, abaixo do permitido pela lei. Somente 2% dos trabalhadores ganham mais que 2 salários mínimos. O salário médio de toda categoria é de R$ 569,46, cerca de 69% desses trabalhadores têm até a 4ª série do ensino primário, e só 9% têm ensino médio completo!

Essa é a triste realidade do campo brasileiro. O estudo “ O mercado de trabalho formal rural” se baseou em dados oficiais fornecidos pelos fazendeiros ao Ministério do trabalho.

Veja as principais tabelas em anexo.

Setor de comunicação do MST