Sem Terra negam acusações de depredação

Diante da repercussão dos últimos episódios que envolvem o MST, queremos esclarecer os fatos e questionar algumas “verdades” apresentadas na mídia burguesa sobre a ocupação da fazenda grilada pela multinacional Cutrale, no interior de São Paulo. A ocupação

Diante da repercussão dos últimos episódios que envolvem o MST, queremos esclarecer os fatos e questionar algumas “verdades” apresentadas na mídia burguesa sobre a ocupação da fazenda grilada pela multinacional Cutrale, no interior de São Paulo.

A ocupação

No dia 28 de setembro, cerca de 250 famílias sem terra ocuparam pela terceira vez uma área de aproximadamente 3 mil hectares, grilada pela empresa transnacional de sucos Cutrale. A mobilização pretendia fazer pressão para que o governo federal agilizasse a retomada das áreas griladas (pertencentes a União) e efetuasse o assentamento das famílias acampadas na região.

Logo após a ocupação, os trabalhadores rurais iniciaram a organização do acampamento. Como forma de denúncia, as famílias derrubaram cerca de 3 mil pés de laranja – que representam o grilo.

Se, neste momento, por conta das imagens repetidas exaustivamente e da ausência das informações da situação da luta pela terra na região, parte da sociedade e daqueles que sempre apoiaram nossa luta, reprovam essa forma de protesto, afirmamos que compreendemos e que estamos a disposição para quaisquer esclarecimentos.

Somos os primeiros e mais interessados em fazer com que as terras agrícolas realmente produzam alimentos. No entanto, não podemos nos calar enquanto terras públicas continuarem sendo utilizadas em benefício privado; enquanto milhares de famílias sem terra continuarem vivendo na beira de estradas, debaixo de lonas pretas. A produtividade da área não pode esconder que a Cutrale grilou terras públicas. Aos olhos da população, por mais impactantes que sejam, as imagens não podem ocultar que uma multinacional extrai riqueza de terras griladas. Mais do que somente esclarecer os fatos, é preciso entender a complexidade e a dimensão da luta pela terra naquela região.

O MST está presente na região de Iaras desde 1995. Ao passo que o enfrentamento aos latifúndios ia avançando, mais famílias se organizavam nos acampamentos – algumas delas já acampadas há quase dez anos. Com a confirmação de que o Complexo Monções, uma área de mais de 100 mil hectares, é terra pública pertencente a União, uma pequena parte dele foi destinado a Reforma Agrária e algumas famílias assentadas. Mas ainda existem 450 famílias a espera de terra.

Por que elas não são assentadas nos outros 90 mil hectares restantes? Será que é por que todas as áreas que ainda poderiam ser retomadas são terras públicas que estão sendo utilizadas indevidamente por grandes empresas multinacionais como a Cutrale?

É dever do Incra e do governo federal arrecadar terras públicas, patrimônio do povo brasileiro, para atender as famílias sem terra, sem que seja necessário ir ao extremo da necessidade humana em permanecer mais de 10 anos sob lonas, na chuva, no frio, no sol forte em beiras de estradas, para nelas produzir alimentos saudáveis e fazer cumprir a função social prevista na Constituição.

Aliado a tudo isso, há também a forte atuação do Poder Judiciário para emperrar o processo de Reforma Agrária. É preciso chamar a atenção para a decisão da Justiça Federal de Ourinhos (SP) que, em agosto, decretou a extinção do processo em que o Incra reclama a fazenda como terra pública. A Justiça alegou que o Incra, órgão federal responsável pela execução da Reforma Agrária, é ilegítimo para reivindicar a área. Quem poderá fazê-lo então?

Esperamos que essa decisão judicial, um exemplo dos entraves existentes para impedir o avanço da Reforma Agrária em nosso país, seja revertida nas instâncias superiores do Poder Judiciário. Queremos saber por que uma fazenda grilada não pode ser destinada a Reforma Agrária?

A depredação da fazenda

Repudiamos a versão construída para responsabilizar o MST pela depredação da fazenda. Admitimos que, assim como derrubamos pés de laranja, fizemos algumas pichações para deixar registrado o nosso protesto contra a grilagem da área. Porém, estamos sofrendo acusações e queremos esclarecer que:

Destruição e roubo das casas: logo após a ocupação, em acordo com os trabalhadores que moram na fazenda, as casas foram desocupadas e trancadas. Mais tarde, alguns deles decidiram retirar seus pertences de dentro da área. Em todas as nossas ocupações sempre respeitamos os trabalhadores e zelamos por sua segurança.

Depredação de tratores: uma empresa com esse porte possui oficina mecânica dentro das fazendas e, portanto, faz a manutenção das suas máquinas dentro da própria área. As imagens mostram tratores e peças que já estavam abandonadas e desmontadas antes das famílias chegarem lá. Quem tem que responder pelo estado dos equipamentos é a Cutrale e não o MST.

Roubo de combustíveis e venenos: como seria possível as famílias furtarem 15 mil litros de combustíveis e toneladas de veneno sendo escoltadas pela PM e transportadas em cima de uma carroceria de caminhão?

Essas acusações são infundadas. Como tudo isso poderia ter sido feito por famílias que estiveram o tempo todo cercadas pelas tropas da Policia Militar, sempre munida de câmeras filmadoras, com apoio de helicópteros e que no despejo foram colocadas em cima de dois caminhões da própria multinacional Cutrale?

Não cometemos aqueles atos de vandalismos e exigimos que os mesmo sejam identificados e punidos. Se às vezes acontecem excessos isolados em nossas ocupações, buscamos avaliá-los e corrigi-los. Diante do conflito estabelecido na hora do despejo, os integrantes do MST não puderam acompanhar a entrada da PM na fazenda após a desocupação. O que realmente aconteceu após a saída das famílias acampadas?

Por que tendo recebido imagens da destruição dos pés de laranja ainda no dia 28 de setembro, somente no dia 5 de outubro a Rede Globo resolveu exibi-las e fazer de forma tão apelativa?

Os representantes do agronegócio e a bancada ruralista precisavam de algum argumento que justificasse mais uma tentativa de instalação de uma nova CPI contra o MST. Com isso, a verdadeira intenção, é inviabilizar a atuação de um movimento social que há 25 anos luta pela terra no Brasil.

Convidamos toda a sociedade, cidadãos e cidadãs brasileiros, autoridades e parlamentes, para visitar a região, a área ocupada, conversar com as famílias acampadas e tirar as suas conclusões.

São Paulo, 9 de outubro de 2009.

MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA

DIREÇÃO ESTADUAL/ SP