No Maranhão, 29 pessoas são libertadas de trabalho escravo

Da Agência Repórter Brasil

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Pela segunda vez, trabalhadores foram encontrados em condição de trabalho escravo na Fazenda Ilha, em Capinzal do Norte (MA). Fiscalização ocorrida no início de outubro libertou 29 pessoas do local – inclundo um adolescente de 17 anos e uma senhora de 58 anos. A operação foi uma iniciativa da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Maranhão (SRTE/MA), juntamente com a Procuradoria Regional do Trabalho da 16ª Região (PRT-16). Os agentes públicos foram conferir a situação após denúncia de um trabalhador que conseguiu fugir da fazenda, que tem 17 mil hectares.

A área pertence a José Rodrigues dos Santos, fazendeiro que faz parte da chamada “lista suja” do trabalho escravo – cadastro mantido pelo governo federal que relaciona empregadores que exploraram mão de obra escrava. A fiscalização apurou, contudo, que o terreno estava arrendado para seu irmão Edésio Antônio dos Santos. “Nós constatamos que o empregador era o arrendatário Edésio. Ele foi responsabilizado e efetuou o pagamento de todas as verbas da rescisão do contrato de trabalho”, explica Carlos Henrique da Silveira Oliveira, auditor fiscal do trabalho que coordenou a fiscalização.

O aliciamento da maioria dos explorados se deu em Codó (MA), há cerca de três meses. “Os empregados mais antigos estavam há mais de um ano no local. Alguns tinham de cinco a oito meses de trabalho”, acrescenta Maria Elena Moreira Rêgo, procuradora do trabalho que acompanhou a operação.

Segundo ela, o responsável pelo alojamento, pela contratação e pelo pagamento dos trabalhadores era o intermediário Antônio Altino Oliveira. “O proprietário, que reside em outro Estado, depositava o dinheiro na conta de Antônio. E este último repassava aos trabalhadores”, detalha Maria Elena.

Os trabalhadores eram responsáveis pelo “roço de juquira” – limpeza da área para posterior formação de pastagem de criação de gado. O empregador não fornecia Equipamentos de Proteção Individual (EPIs). “Como é impossível realizar o trabalho sem botas porque o local é cheio de tocos que machucam os pés, os trabalhadores eram obrigados a comprar suas botas no armazém da fazenda por preços superiores aos de mercado”, informa a procuradora.

De acordo com Maria Elena, as vítimas compravam inclusive as ferramentas de trabalho, que também não eram fornecidas. “Tudo era anotado em um caderno que ficava em poder de Antônio Altino. A dívida crescia como uma bola de neve e, no final do mês, a maioria dos trabalhadores não tinha mais nada para receber. E ainda continuavam devendo. A típica servidão por dívidas”, constatou a procuradora do trabalho. O pagamento era feito por produção e o totalizava um salário máximo de R$ 150 a R$ 180 por mês.

A situação dos alojamentos era “precaríssima”, segundo o auditor Carlos Henrique. O alojamento ficava em local de difícil acesso, escondido no meio do mato. Era apenas um casebre de palha, sem qualquer parede, que já tinha sido instalado em diversos pontos da fazenda, conforme as necessidades do trabalho. “O local não oferecia qualquer proteção contra chuva, vento, animais (cobras, aranhas e escorpiões são comuns na região). As redes se amontoavam uma ao lado da outra”, relata Maria Elena.

Não havia instalações sanitárias e os trabalhadores eram obrigados a usar o mato como banheiro. A água de riacho próximo à propriedade era utilizada para banho, para beber e para preparar a comida. Os animais também bebiam no riacho. A comida era feita em fogueiras. A carne ficava estendida ao relento, sem refrigeração.

O proprietário não assinou Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). Ele não compareceu ao local durante a fiscalização, segundo a procuradora. “O procedimento foi encaminhado no dia 13 de novembro para a Procuradoria do Trabalho de Bacabal (MA) [o município de Capinzal do Norte (MA) faz parte da jurisição da procuradoria]. Em regra geral, propomos um TAC. Caso haja recusa do proprietário, ajuizamos ação civil pública”.

Histórico

A primeira libertação na Fazenda Ilha/Veneza foi em dezembro de 2007. Na ocasião, os auditores fiscais encontraram 48 trabalhadores dormindo num curral e submetidos à servidão por dívida. EPIs, materiais básicos de higiene pessoal e gêneros alimentícios eram descontados dos “salários” dos empregados. Todos os dias, um dos empregados caminhava 12 km na ida e na volta até a sede da fazenda para pegar a comida dos outros. Por causa do flagrante ocorrido há cerca de dois anos, o proprietário José Rodrigues dos Santos entrou para a “lista suja” do trabalho escravo em dezembro de 2008.

Em maio de 2008, o Ministério Público Federal no Maranhão (MPF/MA) denunciou o fazendeiro José Rodrigues dos Santos e o “gato” Zé Carneiro pelo crime de submeter trabalhadores à condição análoga a de escravo (art. 149 do Código Penal). A denúncia está baseada em relatório apresentado pela equipe de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Segundo assessoria de comunicação do MPF/MA, o processo está sendo analisado agora na 2ª Vara da Justiça Federal do Maranhão.