“Mudança é para destruir florestas”, diz Marina Silva

Por Danilo Augusto. Da Radioagência NP Parlamentares ligados ao agronegócio estão fazendo pressão para aprovar as mudanças no Código Florestal ainda neste ano. O novo texto é do deputado federal Aldo Rebelo (PcdoB-SP) e já foi aprovado em comissão especial.


Por Danilo Augusto.
Da Radioagência NP

Parlamentares ligados ao agronegócio estão fazendo pressão para aprovar as mudanças no Código Florestal ainda neste ano. O novo texto é do deputado federal Aldo Rebelo (PcdoB-SP) e já foi aprovado em comissão especial.

O texto do deputado é criticado pelos ambientalistas e movimentos sociais. Entre as principais críticas está a redução das áreas de Reserva Legal nas propriedades particulares, o perdão das multas aplicadas em proprietários que desmataram até julho de 2008 e a flexibilização da produção agropecuária em Áreas de Proteção Permanente (APPs). O texto também prevê a ampliação da autonomia dos estados para legislar sobre meio ambiente.

Em entrevista à Radioagência NP, a senadora Marina Silva (PV) – que ficou em terceiro lugar nas eleições presidenciais com 20 milhões de votos – concorda que deve haver mudanças no Código Florestal que já completou 45 anos. Porém, ela explica que os pontos que alimentam a polêmica são complexos e não podem ser tratados no imediatismo, como quer o setor ruralista. Ela defende uma votação somente para a próxima legislatura e afirma que “estão querendo usar o Código Florestal para promover a destruição da floresta.” Leia a primeira parte da entrevista

Como a senadora avalia o Código Florestal vigente no país?

Marina Silva: O código, há décadas, está ajudando as florestas brasileiras. É claro que ele precisa de atualização, mas não para flexibilizar, no sentido de permitir a destruição das florestas. Tivemos a Constituição de 1988 que estabelece o meio ambiente como direito de todos os cidadãos brasileiros. A atualização deve ser para que o uso sustentável da floresta possa ser viabilizado, e não para a finalidade que se propõe o relatório do deputado Aldo Rabelo, que é a flexibilização da legislação para permitir o avanço sobre as áreas florestadas e promover o perdão e a anistia para os devastadores ilegais.

Por que a senadora considera o texto um grande retrocesso na proteção dos recursos florestais?

MS: O texto é um retrocesso na legislação ambiental e parte de uma premissa errada. O Código Florestal é para proteger florestas, mas as pessoas estão invertendo a equação. Estão querendo usar o Código Florestal para promover a destruição da floresta. Isso é um contrassenso, um paradoxo total.

Quais impactos que serão causados no meio ambiente se o texto for aprovado?

MS: A ampliação do corte raso sobre as áreas florestadas, pois vai mexer com a Reserva Legal. Outro problema é a anistia para os que desmataram 40 milhões de hectares de forma ilegal. A terceira consequência é as metas que o governo brasileiro assumiu em Copenhague. Se tiver a mudança no Código Florestal e na lei que regulamenta o artigo 23 que também está tramitando no senado, que graças a uma emenda do deputado Paulo Teixeira (PT/SP), que retira as competências do Ibama para fiscalizar desmatamento e aplicar multa, isso “vai juntar a fome com a vontade de comer” no que diz respeito no que concerne a destruição da floresta. Flexibiliza o Código de um lado, e retira a competência dos órgãos fiscalizadores que têm condições de algum controle de fiscalizar e aplicar multa.

A bancada ruralista quer a votação das mudanças ainda neste ano. Por que essa pressão está ocorrendo?

MS: Há um interesse muito grande do governo de aprovar essas questões ainda nesta legislatura. Isso é para não deixar nenhum desconforto para o próximo governo, fato que será lamentável. Primeiro porque houve um compromisso na campanha da Dilma de que se ganhasse, e essas propostas passassem, ela iria vetar. E se agora for votada, aprovada e sancionada pelo atual governo, a presidente não poderá vetar. Outro fato grave é que grande parte dos parlamentares dessa legislatura não foram reeleitos, ou seja, depois não terá como a sociedade cobrar.

Então a senadora defende a votação para a próxima legislatura?

MS: Esse debate tem que ficar para o próximo ano. Deve ser ampliado para a participação da sociedade, da comunidade científica e principalmente com os novos parlamentares. Como vamos fazer um debate tão importante na última hora, no final de uma legislatura?

A proposta de um novo Código veio do deputado Aldo Rebelo (PCdoB). Foi uma surpresa?

MS: Nem PT, nem PSDB, nem qualquer partido de transição democrática de esquerda foram capazes de perceber a questão ambiental na sua complexidade e essência. Eles tratam essas questões como se fosse um empecilho para o desenvolvimento, como se fosse interesses externos querendo prejudicar os interesses nacionais. É uma visão não atualizada do problema. Não conseguiram perceber que esse é o desafio do século. Não devemos ter uma visão mesquinha do problema. É preciso ter atitude integradora dos diferentes seguimentos. Ninguém pode ser exclusivo em relação a essa bandeira.

Senadora, o setor do agronegócio diz que o atual código atrapalha no desenvolvimento do Brasil, principalmente no setor agrícola, a senadora concorda?

MS: É perfeitamente possível ter uma agricultura vigorosa, tanto para a pequena e média com a proteção das florestas. Não é correto colocar essa oposição; proteção das floretas e agricultura. Alias, a destruição das florestas levará, necessariamente, a um prejuízo para a agricultura brasileira. Se não diminuirmos a emissão de CO2 vamos ter a elevação do clima, fato que vai prejudicar todas as culturas brasileiras. A proteção da biodiversidade promove vantagens para a agricultura em função dos serviços ambientais que ela presta.

O governo vai apresentar uma proposta como alternativa de mudança. É uma proposta mais avançada?

MA: Não conheço a proposta do governo. Para mim, qualquer proposta que seja feita em quatro paredes, de uma discussão complexa como essa, e que não seja debatida com diferentes segmentos da sociedade, ouvindo também os especialistas, no meu entendimento não nos levará a lugar nenhum. Temos que compatibilizar os resultados que queremos e o processo que nos levará ao resultado. Para se ter uma boa proposta é preciso um grande respaldo da sociedade e dialogar com vários setores. Os ajustes para serem feitos, não devem ser feitos em prejuízos dos avanços da legislação ambiental, mas sim, no sentido de corrigir alguns aspectos que precisam ser corrigidos.

Para movimentos sociais e ambientalistas a proposta de alteração beneficia os latifundiários do agronegócio. Em contrapartida a nova proposta prejudica os pequenos produtores e a reforma agrária?

Essa nova proposta vai prejudicar todo mundo. É por isso que essa questão ambiental não tem um recorte muito claro em relação entre grandes e pequenos, pobres e ricos. Mas é claro que os mais prejudicados serão os pequenos agricultores. O avanço sobre as florestas com certeza vai prejudicar terras indígenas, ribeirinho e extrativista de modo geral.