Ivan Valente saúda jornada de lutas da Via Campesina

 

Leia discurso do deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP), no Plenário da Câmara dos Deputados, que faz uma saudação à Jornada de Lutas da Via Campesina, que mobilizou 20 estados e Brasília nesta semana.

 

Senhor Presidente, senhoras e senhores Deputados,

Venho a esta tribuna saudar a Jornada de Lutas da Via Campesina, que acontece em todo o país neste mês de agosto, para exigir mudanças no modelo agrícola e apresentar propostas para a agricultura brasileira.

 

Leia discurso do deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP), no Plenário da Câmara dos Deputados, que faz uma saudação à Jornada de Lutas da Via Campesina, que mobilizou 20 estados e Brasília nesta semana.

 

Senhor Presidente, senhoras e senhores Deputados,

Venho a esta tribuna saudar a Jornada de Lutas da Via Campesina, que acontece em todo o país neste mês de agosto, para exigir mudanças no modelo agrícola e apresentar propostas para a agricultura brasileira.

É preciso muita mobilização para resistir à brutal ofensiva do agronegócio em nosso país, que ameaça não apenas as condições de sobrevivência no campo como impede a realização da reforma agrária e a preservação ambiental no Brasil.

Não bastasse o brutal retrocesso que esta Câmara aprovou em nossa legislação ambiental, com as mudanças no Código Florestal patrocinadas pelo agronegócio – que esperamos reverter agora no Senado -, a bancada ruralista desenha agora, e pretende colocar em pauta, um cardápio de atrocidades. São iniciativas retrógradas, que permitirão não apenas que os tratores passem de vez sobre nossas florestas como atacam a dignidade humana da forma mais profunda.

Beneficiado direto das mudanças no Código Florestal, porque pode ser anistiado das multas que recebeu do Ibama pela prática de crime ambiental, o deputado Rubens Moreira Mendes (PPS-RO), presidente da Comissão de Agricultura e coordenador da Frente Parlamentar da Agropecuária, propõe agora a revisão das normas para a criação de reservas ambientais, indígenas e quilombolas e a flexibilização da legislação sobre o trabalho escravo.

Quer trazer para o Congresso Nacional, onde o poder político e econômico dos grandes coronéis dita regras, a decisão sobre a criação das Unidades de Conservação e a demarcação de terras indígenas e quilombolas, atualmente sob responsabilidade do Ibama e da Funai. Em vez de funcionários públicos especialistas nesses assuntos, que utilizem critérios técnicos para tomar suas decisões, Moreira Mendes quer transformar tudo num suposto “debate político”.

O deputado também teve a desfaçatez de defender “uma nova legislação trabalhista para o campo”, “separada” da legislação trabalhista geral, com “novas idéias” e “nenhuma possibilidade de interpretação sobre a caracterização do trabalho escravo”. Ora, senhoras e senhores deputados, o que quer dizer isso? Em pleno século XXI, a bancada ruralista se sente tão à vontade a ponto de defender a flexibilização do combate ao trabalho escravo contemporâneo, que envergonha este país com as condições desumanas ainda impostas por muitas fazendas aos seus trabalhadores? É a oficialização da barbárie.

Segundo Moreira Mendes, a lei que trata do trabalho escravo dá muitos poderes a quem a interpreta, “tirando a tranqüilidade de quem trabalha no campo”. Mas não é a tranquilidade dos ruralistas que deve ser defendida pelo Estado brasileiro, e sim a dignidade de seu povo. É por isso que precisamos aprovar com urgência a PEC do Trabalho Escravo, para, em vez de diminuir os poderes dos fiscais do Trabalho, aumentar a punição para aqueles que ousam reduzir pessoas a condições análogas a de escravos em nome do lucro. Vale lembrar que hoje ninguém está cumprindo pena no Brasil pela prática do trabalho escravo. Metade dos empregadores flagrados do Ministério do Trabalho sequer responde pelo crime na Justiça. Ou seja, a impunidade prevalece.

O deputado Moreira Mendes, inclusive, não acredita que exista trabalho escravo contemporâneo no Brasil. Acha que o resgate de mais de 33 mil trabalhadores pelos Grupos Móveis de Combate ao Trabalho Escravo realizados entre 2003 e 2010 são “fiscalizações abusivas”, como disse. Para quem acha que o trabalho escravo é obra de ficção daqueles que não aceitam este modelo de produção em nosso país, o programa “A Liga”, veiculado na última semana pela TV Bandeirantes, mostrou a cruel realidade brasileira, no campo e na cidade. Nas carvoarias e fazendas do Pará até butiques de grifes internacional como a Zara, o trabalho escravo persiste no Brasil. As denúncias mostram que até a Secretaria de Educação do governo de São Paulo contrata empreiteira que utilizam mão de obra escrava. É de um absurdo sem tamanho, Senhor Presidente!

Enfim, já passou da hora de colocar a PEC do Trabalho Escravo em pauta nesta Casa, para que os verdadeiros interesses daqueles que, no debate do Código Florestal, se esconderam por trás dos pequenos produtores, sejam finalmente desvelados. Desde março de 2004 este assunto espera um desfecho.

Senhor Presidente Marco Maia, também é hora de instalar a CPI do Trabalho Escravo. As assinaturas requerendo a CPI já foram conferidas, não há razões – que não as políticas, de interesse do governo federal – para não colocar esta comissão em funcionamento. É uma vergonha que três parlamentares deste Congresso respondam hoje no Supremo Tribunal Federal pelo crime de trabalho escravo. Alguém tem dúvidas de que, mais uma vez, estes senhores votarão em benefício próprio nesta questão?

Outras propostas da agenda ruralista são acabar com a idéia de função social da terra, com a idéia de meio ambiente como direito, como diz nossa Constituição, com o próprio Estatuto da Terra e com a atualização dos índices de produtividade no campo, defasados há décadas. É uma agenda arcaica, que vai na contramão do que esperamos para o desenvolvimento do nosso país, defendida pelos mesmos que mudaram nesta Casa o Código Florestal, que aprovaram a MP da grilagem de terras, que se colocam contra as ações da Anvisa na regulação e controle do uso de agrotóxicos.

Aproveito a oportunidade para compartilhar a informação de que retomaremos nosso requerimento para a realização de uma audiência pública sobre o uso de agrotóxicos no Brasil na Comissão de Defesa do Consumidor. Somos atualmente o país que mais consome estes venenos: 5,2 litros/ano por habitante. Segundo a Anvisa, cerca de 30% do que comemos apresenta níveis de agrotóxicos muito acima da quantidade tolerável ou estão contaminados por produtos químicos sequer autorizados no país. Os riscos para são tanto para o consumidor final quanto para os agricultores expostos diariamente à intoxicação. E quem lucra são as mesmas empresas transnacionais, como a Monsanto, Syngenta e a Bayer.

Por fim, fazemos um chamado aos movimentos populares e organizações da sociedade civil para que se somem à iniciativa do Comitê Nacional em Defesa das Florestas e do Desenvolvimento Sustentável e venham conosco às ruas coletar assinaturas no abaixo assinado comum que estamos distribuindo contra as mudanças no Código Florestal. A campanha está disponível na página www.florestafazadiferenca.com.br. Vamos aumentar a mobilização popular para barrar este retrocesso que foi aprovado nesta Casa.

Abaixo, a pauta de reivindicações da Jornada de Lutas da Via Campesina, que conta com todo o nosso apoio.

Muito obrigado.

Ivan Valente
Deputado Federal PSOL/SP


Jornada de Lutas da Via Campesina

Por mudanças no modelo agrícola: para que todos tenham terra, condições de produção, emprego e renda no meio rural. E alimentos saudáveis para toda a população.

Os movimentos sociais da Via Campesina:  Comissão Pastoral da Terra(CPT), Movimento dos Atingidos por Barragens(MAB), Movimento dos Pescadores e Pescadoras, Quilombolas, Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Movimento de Mulheres Camponesas (MMC), Sindicato dos Trabalhadores na  EMBRAPA, CIMI (Conselho Indigenista Missionário) e diversos movimentos do campo, estamos mobilizados em todo o país, para debater com a sociedade e com os governos, municipal, estadual e Federal, para exigir mudanças no modelo agrícola e apresentar propostas para a agricultura brasileira.

O modelo do agronegócio é o jeito das grandes empresas estrangeiras controlarem a produção e o comércio de nossa agricultura, dos bancos ganharem dinheiro, em aliança com os grandes proprietários de terra e apoiados pela mídia. Ele concentra a produção, a propriedade da terra, expulsa os trabalhadores do campo, só produz para exportação, usa de forma intensiva  venenos e máquinas, e desequilibra o meio ambiente.

É um modelo apenas para d ar lucro para alguns, enquanto a maioria da população paga o preço. Por isso, o Brasil é o maior consumidor mundial de venenos! Nós defendemos um novo modelo agrícola, baseado na agricultura familiar, camponesa, que fixe as pessoas no meio rural, garanta terra, gere emprego e renda.

Para isso, os governos precisam implementar urgentemente:

 

1 A desapropriação dos grandes latifúndios improdutivos, muitos em mãos do capital estrangeiro, e distribuir para assentamento das milhares de famílias acampadas. Além de garantir um plano de assentamento de 100 mil famílias por ano.

2 Uma nova política de crédito rural, mais acessível aos pequenos agricultores, diferente do PRONAF. Começando pela anistia de todos os que devem até dez mil reais por família e renegociação das dividas.

3 Apoio à educação no campo. Proibição de fechamento de qualquer escola no meio rural. Instalar escolas de ensino fundamental, ensino médio e Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia (Ifets), garantia de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional aplicado em educação e 50% de toda renda do petróleo do pré-sal.

4 Proibição do uso de agrotóxicos e garantia de produção de alimentos saudáveis para população

5 Investir recursos e transformar a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab)  numa grande empresa que compre  todos os alimentos produzidos pela pequena agricultura.

6 Garantir a democratização da gestão pública na Embrapa e se priorize pesquisas e políticas voltadas ao interesse do povo brasileiro, de alimentos e da agricultura familiar e camponesa.

7 Não podemos aceitar as mudanças propostas no Código Florestal, aprovadas na câmara no projeto Aldo Rebelo. Exigimos que o senado atenda as demandas dos movimentos, da sociedade e convoque um plebiscito popular para decidir. Em defesa do meio ambiente, para nossa saúde e das gerações futuras. Não precisamos desmatar mais nada para seguir aumentando a produção.

8 Revisar a política de tarifas de energia elétrica e de gás  de cozinha e  implemente uma política de estimulo à medidas populares de produção e economia de energia. Queremos que a população receba gás de cozinha abaixo de R$ 20,00/ botijão (antes da privatização estava a R$ 4,00 e agora está em média a R$45,00/botijão); Instalação de um milhão de “Aquecedores Solares de Água”, de baixo custo, experiência comprovada que permite reduzir em 25% o consumo de energia de uma residência; Redução e fim dos aumentos nas tarifas de energia elétrica

9 Aprovação, pela Câmara Dos deputados, do projeto já aprovado no Senado, que determina a desapropriação das fazendas com trabalho escravo. No último ano, a Polícia Federal encontrou trabalho escravo em 240 fazendas, em todo país.

10 Impedir o projeto de lei proposto pelos ruralistas, que permite esterilizar as sementes, na técnica do terminator, para que as empresas transnacionais tenham controle de todas as sementes transgênicas.

11 Reconhecimento imediato e legalização das terras historicamente ocupadas pelas comunidades quilombolas, ribeirinhas e povos indígenas.