Agronegócio já domina metade das terras agrícolas na Europa


Por John Vidal*
Do The Guardian


Vastas extensões de terra na Europa estão sendo “tomadas” por grandes empresas, especuladores, compradores ricos estrangeiros e fundos de pensão de forma semelhante ao que ocorre nos países em desenvolvimento, segundo um extenso novo relatório.


Por John Vidal*
Do The Guardian

Vastas extensões de terra na Europa estão sendo “tomadas” por grandes empresas, especuladores, compradores ricos estrangeiros e fundos de pensão de forma semelhante ao que ocorre nos países em desenvolvimento, segundo um extenso novo relatório.

Corporações chinesas, grandes fortunas do Oriente médio e hedge funds , bem como oligarquias Russas e as gigantes do agronegócio todos intensificaram as compras de terra na última década em um processo, que o relatório considera estar impedindo que as pessoas comuns possam ser agricultores, e assim concentrando a agricultura e a terra em algumas poucas mãos. 

Segundo pesquisa do Instituto Transnacional, Via Campesina [Transnational Institute, Via Campesina] e outros, metade de toda a terra agrícola da União Europeia esta hoje concentrada em 3% de grandes fazendas que tem mais de 100 hectares (247 acres). Em alguns países da União Europeia, a propriedade da terra é tão desigual quanto é no Brasil, Colômbia e Filipinas.

Embora os agricultores camponeses e pequenos proprietários estejam saindo de suas terras a décadas, os especuladores e os produtores do agronegócio estão se apossando de vastas extensões de terras, diz o relatório de 200 páginas.

Isso pode ser amplamente observado nos estados Soviéticos, afirmam 25 autores em 11 países. Na Ucrânia, 10 gigantes do agronegócio controlam hoje aproximadamente 2.8milhões de  hectares. Apenas um oligarca, controla mais de 500.000 hectares. Empresas chinesas se deslocaram em grande escala para a Bulgária e empresas do Oriente Médio  são hoje grandes produtores na Romênia.

A concentração da propriedade da terra esta se acelerando. Na Alemanha, 1.2 milhões de propriedades agrícolas em 1966-67  encolheram para apenas 299.100 propriedades agrícolas em 2010. Desse número, a área coberta por propriedades com menos de dois hectares encolheu de 123.670 hectares em 1990 para apenas 20.110 em 2007.

Na Itália, 33.000 propriedades agrícolas cobrem hoje 11milhões de hectares, e na França mais de 60.000 hectares de terra agrícola são perdidas a cada ano para abrir espaço para estradas, supermercados e o crescimento urbano. Na Andaluzia, Espanha, o número de propriedades agrícolas caiu em mais de dois terços para menos de 1 milhão em 2007. Em 2010, 2% dos proprietários de terra controlavam metade de toda a terra. 

Essa pesquisa não foi feita na Inglaterra, que tem uma das maiores concentrações da propriedade da terra do mundo, com 70% de toda terra, segundo relatos, sendo de propriedade de apenas 1% da população.

“Essa é uma dinâmica sem precedentes na concentração de terras e reflete um avanço assustador na toma de terras. Isso piorou a atual situação onde muitos jovens que querem ficar na terra ou começar a trabalhar na agricultura, não conseguem manter ou obter acesso a terra , “ afirmou o professor Dr Jan Douwe van der Ploeg  da Universidade de Wageningen, e membro do grupo de pesquisa.

Os autores argumentam que essa “toma de terras” tem sido alimentada pela política agrícola comum (CAP), que distribui um terço de todos os subsídios da União Europeia  a cada ano, mas esses fundos tem sido açambarcados pelos grandes fazendeiros.

“Na Itália em 2011, 0.29% das propriedades agrícolas tiveram acesso a 18% de todos os incentivos do CAP, e 0.0001 destes, ou 150 fazendas, obtiveram 6% de todos os subsídios. Na Espanha, 75% de todos os subsídios foram tomados por apenas 16% dos maiores produtores. Na Hungria em 2009, 8.6% de todas as propriedades rurais açambarcaram 72% de todos os subsídios agrícolas,” afirma Van der Ploeg.

“As três questões fundiárias mais prementes na Europa hoje são a concentração, a toma de terra e a incapacidade dos jovens de manter ou  obter acesso a terra para poder ingressar na agricultura sustentável – interligados então as questões triangulares de terra que são bastante semelhantes as que se vê na África, América Latina e Ásia hoje.”

O relatório sugere que, como em muitos países em desenvolvimento, existe uma forte oposição as “tomas“ de terra na Europa. Há relatos de comunidades que estão ocupando terras. Na Andaluzia, agricultores sem terra estão ocupando coletivamente e cultivando a terra. Em Viena, jovens estão criando assentamentos nas terras férteis urbanas. 

“A terra tem que ser vista  novamente como um bem comum. Precisamos reduzir a comodificação da terra e promover  a administração pública desse recurso comum do qual todos nós dependemos,” disse Jeanne Verlinden  da coordenação Europeia da Via Campesina. “Deve se dar prioridade para o uso da terra pelos pequenos produtores e pela agricultura camponesa para a produção de alimentos, ao invés de entregar a terra para os interesses comerciais privados”.

*Tradução: Ana Amorim