Vandana Shiva: ”Parem os ladrões de territórios férteis”

Perdemos 24 bilhões de toneladas de solo fértil por ano. Até 2030, está previsto um crescimento da área urbanizada equivalente a superfície da África do Sul.

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Por Antonio Cianciullo*
Do La Repubblica

“As multinacionais não alimentam o planeta. Matam-no de fome. Devemos fazer de tudo para defender um modelo agroalimentar baseado na agricultura familiar como o italiano, o europeu e de muitos outros países. Devemos reafirmar o orgulho de tantos pequenos agricultores de todo o mundo que mantiveram às custas de grandes dificuldades os seus campos e que os cultivam com os métodos biológicos e ecológicos.” É a mensagem que surge do manifesto Terra Viva, que a líder ambientalista indiana Vandana Shiva, presidente da associação Navdanya International, apresentou nos últimos dias em Cascina Triulza, na Itália.

O texto é uma acusação contra um sistema econômico-financeiro que, além de empurrar as espécies à extinção e de levar os ecossistemas ao colapso, pôs-se acima da sociedade, fora do controlo democrático deslocando a atenção da produção real à multiplicação abstrata do capital.

As consequências desse processo foram devastadoras (perdemos 24 bilhões de toneladas de solo fértil por ano), e o futuro ameaça ser pior: até 2030, está previsto um crescimento da área urbanizada igual a 1,2 milhão de quilômetros quadrados, uma superfície equivalente à da África do Sul.

“A batalha, contudo, não está perdida”, afirma Vandana Shiva. “Com a agricultura biológica, podem ser combatidas a erosão e o empobrecimento do solo desacelerando as mudanças climáticas. Existe a possibilidade de recuperar dois bilhões de hectares de terras degradadas: uma operação que envolveria a absorção de três bilhões de toneladas de carbono por ano, 30% daquilo que é emitido pela queima de combustíveis fósseis.”

Mas, para alcançar esse objetivo, segundo a ambientalista indiana, são necessárias duas condições. A primeira é parar a grilagem de terras, o açambarcamento de solos férteis. As multinacionais, sustentadas pelos subsídios públicos, estão se apoderando das terras dos pequenos agricultores que, em nível global, produzem 70% dos alimentos, causando uma nova onda de espoliações maciças de pobres. O percentual de riqueza possuída pelo 1% mais rico da população mundial passou de 44% em 2009 para 48% em 2014. O patrimônio das 300 pessoas mais ricas vale mais do que a soma do PIB dos 29 países mais pobres.

A segunda é dar espaço para a nova agricultura, que inverte o esquema das últimas décadas: em vez de consumir energia, a produz, em vez de contribuir para o crescimento do efeito estufa, a freia. A agricultura biológica tem a possibilidade de captar todos os anos duas toneladas de CO2 por hectare: uma formidável arma para atingir o objetivo da contenção da temperatura dentro dos dois graus de aumento, o limiar além do qual as mudanças climáticas se tornariam catastróficas.

* A tradução é de Moisés Sbardelotto.