“O capitalismo transforma o que deveria ser alimento em apenas mercadoria”, diz Stédile

As consequências da ofensiva do capitalismo na agricultura brasileira foi uma dos temas abordados pelo coordenador nacional do MST, em aula pública sobre a alimentação saudável.

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Por Catiana de Medeiros
Da Página do MST

 

As consequências da ofensiva do capitalismo na agricultura brasileira fizeram parte dos principais temas abordados pelo coordenador nacional do MST, João Pedro Stédile, em aula pública sobre a alimentação saudável, realizada no último sábado (14), em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul.

O evento, organizado pela Frente Parlamentar Gaúcha em Defesa da Alimentação Saudável em parceria com entidades e movimentos sociais, aconteceu ao lado da Feira Agroecológica, no Parque da Redenção.

Logo após a abertura da aula pelo coordenador da Frente, deputado estadual Edegar Pretto (PT), Stédile pediu solidariedade e um minuto de silêncio às vítimas do capitalismo.

Entre os exemplos, citou os milhares de mortos na Síria; os mais de 120 mortos em atentados em Paris, na última sexta-feira (13); e os mortos e desaparecidos na tragédia em Mariana (MG), após rompimento de duas barragens de rejeito de minério da Samarco/Vale.

De acordo com Stédile, o domínio do capital financeiro e das grandes corporações internacionais sobre o modelo de agricultura existente hoje no Brasil e no mundo corresponde a uma reorganização econômica do planeta, iniciada nos anos 90, que é fruto de uma nova etapa do sistema capitalista, responsável pela origem da crise econômica existente no país.

 

“Cerca de 500 empresas dominam 60% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial, sendo que 50 delas atuam no setor da agricultura.

Nunca antes a humanidade estivera sobre o domínio de um só modelo de produção e essa é uma situação que afeta de forma unitária todas as famílias do mundo.

Essa também é a causa e a origem da crise econômica que a sociedade está vivendo. Não é culpa do governo, mas nem o governo tem consciência dessa crise”, disse Stédile.

O coordenador do MST explicou ainda que o capitalismo transformou a agricultura em mecanismo de acumulação de riquezas e desigualdade social.

“O capitalismo dominou bancos e multinacionais e com esse sistema ocorreu uma revisão nacional da produção, onde as 50 empresas brincam com o planeta e decidem, de acordo com seus interesses, o que cada território vai produzir.”

Conforme o coordenador do MST, outra tática do capital para a acumulação de riquezas se dá através da padronização da produção e uniformização do preço dos alimentos.

Ele também lembrou que 85% das terras cultivadas no país se destinam a produção de soja, milho, pastagem, cana-de-açúcar e eucalipto.

“Para o capital os alimentos são mercadorias e na sua lógica toda mercadoria ter que ser padronizada para assim obter lucro.

Ele fez o nivelamento dos preços dos alimentos, independente do tempo de trabalho necessário para a produção, o que afetou a economia camponesa do mundo inteiro.

Hoje, ninguém sabe o valor exato das culturas; a safra de soja do ano de 2019 já está vendida na Bolsa de Amsterdã a um determinado preço”, declarou.

Stedile também afirmou que o capitalismo e as grandes empresas que agem dentro dos estabelecimentos agrícolas são responsáveis pelas mudanças na forma de produção da agricultura, que hoje é baseada no uso de agrotóxicos, sementes transgênicas, monocultivo e plantios em grandes áreas.

“Os fazendeiros organizaram a produção na maior escala possível para ter lucro máximo. E esse lucro é dividido com empresas e bancos que financiam seus plantios”, declarou.

Outra ofensiva do capital na agricultura, destacada Stédile, foi a substituição da mão de obra pelo uso de venenos.

“No Brasil estão usando os agrotóxicos com substituição de mão de obra. Nos últimos dez anos mais de 2,4 milhões de trabalhadores rurais assalariados perderam seus empregos.

Eles foram substituídos pelos venenos. É desta forma que o capital também atua na agricultura e transforma o que deveria ser alimento em apenas mercadoria”, argumentou.

 

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Contradições do Capital

Segundo Stédile, por mais força que tenha o capitalismo, para cada ação desse sistema haverá uma contradição que levará a uma crise e à mobilização social.

O mesmo vale para a sua atuação na agricultura, onde o uso abusivo de agrotóxicos tem aumentado cada vez os casos de câncer no Brasil.

Outros exemplos citados por Stédile foram a descoberta de Glifosato no leite materno de mulheres que residem em Lucas do Rio Verde (GO), e os prejuízos que os venenos causam à biodiversidade.

“Além de prejudicar a saúde, mata os seres vivos que há na natureza – só não mata a soja, contamina as águas e o solo, e altera o clima. Hoje, até os cemitérios estão sendo reduzidos para plantar com o uso veneno e em nome do lucro”.

Finalizando a aula pública, Stédile disse que acredita na conscientização da população sobre o tema e defendeu a produção livre de agrotóxicos como alternativa ao agronegócio. “Ânimo, camaradas, porque na sociedade brasileira há energias progressistas e a prova está na agroecologia.

Vamos derrotar essas ideias atrasadas e reacionárias e construir uma agricultura sem agrotóxicos e uma sociedade socialista, que é o sono de todos nós”, concluiu.

Engajamento social

Para o coordenador da Frente Parlamentar em Defesa da Alimentação Saudável, deputado Estadual Edegar Pretto, a luta em defesa da alimentação saudável depende do apoio e engajamento de toda a população.

“Não é justo que litros e mais litros de venenos matem nosso povo em nome do lucro de meia dúzia de fazendeiros que não se importam com a água, a saúde e o meio ambiente. A população tem que começar a denunciar essas ações e exigir a rotulagem dos alimentos transgênicos. Essa luta que estamos enfrentando não é pequena, mas vale a pena”, complementou Pretto.