Sem Terra protestam contra medida do governo do ES que afeta educação no campo

Manifestantes ocupam a sede da secretaria de educação em São Mateus e questionam medidas que prejudicam o modelo pedagógico praticado há 30 anos na área rural.

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Por Simone Freire
Do Brasil de Fato

Educadores de diversas escolas do campo ocupam a sede da Superintendência Regional de Educação do município de São Mateus, no Espírito Santo, contra medida que reduz a carga horária dos trabalhadores da redes. Os cerca de 150 manifestantes alegam que a proposta do governo estadual prejudica o modelo pedagógico em prática nos assentamentos há mais de 30 anos. A ocupação ocorre nesta quinta (4) e sexta-feira (5).

Sem diálogo com Haroldo Rocha, da Secretaria de Estado da Educação (Sedu), os trabalhadores foram recebidos por uma comissão do órgão, que também não ouviu as exigências da categoria e manteve a proposta de redução da carga horária nas disciplinas ministradas no campo.

Segundo o coordenador do coletivo de Educação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Valdinar dos Santos, a decisão prejudica a educação na região, uma vez que desconsidera a Pedagogia da Alternância, praticada há mais de 30 anos nos assentamentos. Neste modelo, os alunos intercalam um período de convivência na sala de aula com outro no campo, garantindo a permanência dos alunos no meio rural.

A proposta do estado é pagar somente a hora/aula dada por cada educador, não contabilizando outros elementos da pedagogia, como os tempos de acompanhamento do campo e da auto-organização dos estudantes, por exemplo.

“Hoje, se eu tenho dez aulas, eles me contratam com uma carga horária maior para dar conta desses outros elementos, além das aulas e do planejamento. Na proposta deles agora é pagar apenas as horas/aula. E isso dá uma redução de praticamente 50% da carga horária de cada educador. É como se eu tivesse cinco e passasse para metade. O que não dá conta de trabalhar esta Pedagogia da Alternância”, explicou Santos.

 

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Educadores se reúnem na ocupação

Rematrícula

Outro problema apontado pelos educadores na mobilização foi a junção de turmas. Santos critica o novo sistema de rematrícula proposto pela Sedu que, totalmente online, impossibilitou que muitos pais fizessem a matrícula ou rematrícula de seus filhos.

“Muitos dos nossos espaços, nos assentamentos, no campo, a internet não chegou e o camponês não está preparado, não foi orientado suficientemente para fazer esta matrícula. Neste sistema teve um prazo e, por mais que os pais tenham ido na escola e preenchido o documento, isso não está sendo considerado. Logo, estão fazendo junção e fechando várias turmas”, criticou.

Com a nova determinação da Sedu, segundo Santos, 150 educadores e 26 escolas que estão na rede estadual em assentamentos serão impactadas.

Resistência

O cenário só tende a piorar uma realidade já complicada para a educação no campo. Dados do Censo Escolar do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) apontam que, nos últimos 15 anos, mais de 37 mil unidades educacionais foram fechadas no meio rural, o que representa uma média de oito escolas por dia no país.

Só no Espírito Santo, em 2000, existiam 3.062 escolas no campo. Os últimos dados divulgados pela Secretaria de Educação, porém, mostram que em 2009 esse número já totalizava 1.715.

Luta contínua

“Essa luta a gente vem travando desde que as escolas nos assentamentos surgiram. Por questão da infraestrutura, para garantir seu funcionamento, transporte, alimentação, ou seja, a cada ano a gente tem um enfrentamento”, expõe Santos.

Ele relembra da última ação em defesa da Educação no campo, realizada em novembro do ano passado, quando cerca de 500 militantes dos movimentos populares do campo ocuparam a Sedu, em Vitória (ES).

Na ocasião, os manifestantes cobraram a resolução das demandas apresentadas na pauta unificada dos movimentos entregue em junho de 2015, cujo um dos sete pontos era, justamente, medidas para o reconhecimento da Pedagogia da Alternância.

“Neste governo Paulo Hartung [PMDB] a gente tem sofrido bastante, porque é um governo que não dialoga. A gente dialoga com os técnicos, mas dificilmente consegue conversar com o superintendente. Audiência com o governador é quase impossível. Estamos nesta luta há 30 anos e parece que em 2016 não vai ser diferente”, lamentou Santos.

Nesta sexta-feira (5), os educadores resolveram desocupar o prédio. “Vamos retornar no dia 11, depois do carnaval”, comunicou Fátima Ribeiro, educadora e membro da direção estadual do MST. Até o fechamento desta matéria, a Sedu não havia respondido os questionamentos da reportagem.

*Colaborou José Coutinho Junior.