Desafios da produção sem veneno: “Até quando tivermos condições, nós continuaremos apostando na apicultura”, diz assentado

Hoje encerramos a série “Tem veneno no seu mel”, que mostra os prejuízos que a soja transgênica e o uso de agrotóxicos trazem à produção de mel na região da Campanha do Rio Grande do Sul.

 

Da Página do MST
Por Catiana de Medeiros
Colaboração: Leandro Molina

“Não desanimei, fui à luta de novo”

Conforme o engenheiro agrônomo Márcio Morales, a região da Campanha do Rio Grande do Sul é uma das mais adequadas do estado para se desenvolver a apicultura, principalmente pela diversidade que possui de floração em todas as épocas do ano.

“A vegetação é nativa, há campos com grande diversidade de espécies que florescem em todas as estações, além de matas ciliares com grandes quantidades de árvores e arbustos, que também têm uma florada interessante para a produção de mel. É uma região que, mesmo com todos esses problemas da soja transgênica e do uso de agrotóxicos, se comparada com a metade norte do RS e Oeste catarinense e paranaense, ainda está preservada. A partir do momento que há preservação da biodiversidade, há uma oferta de florada maior para as abelhas fazerem mel”, explica.

Estes motivos fazem diferença para os assentados que não desistiram da apicultura. Seu João Carlos Camargo, que também trabalha com a produção de sementes agroecológicas, leite e açúcar mascavo, é um exemplo de perseverança. Mesmo com todas as dificuldades impostas pelo modelo do agronegócio para produzir e encontrar novos enxames, conseguiu colher 180 quilos de mel nesta última safra.

“É uma atividade que faço há anos, eu realmente gosto dessa lida. Perder tudo de uma hora para outra gerou um sentimento muito próximo de como se estivéssemos perdido alguém da família. Era indignação, misturada com tristeza e desespero. Mas não desanimei, fui à luta de novo e hoje tenho 30 colmeias que busquei em locais onde não há uso de veneno”, relata.

 

Matéria III - O assentado João Carlos Machado, mesmo com todas as dificuldades, não pensa em desistir da apicultura.jpg
 O assentado João Carlos Machado, mesmo com todas as dificuldades, não pensa em desistir da apiculturaLegenda

Atualmente, o assentado Amarildo Zanovello trabalha, junto com duas outras famílias, com mais de 500 caixas de abelhas, com foco na venda de mel para o estado de Santa Catarina e exportação para países da Europa, Estados Unidos e Japão. Segundo ele, a palavra desistir não consta em seu vocabulário. “Não penso em desistir, porque essa é uma linha de produção que conheço bem e que agora estamos conseguindo investir. Até quando tivermos condições, nós continuaremos apostando na apicultura”, afirma.
 

Matéria III - Mesmo com todas as dificuldades, as famílias não pensam em desistir da apicultura.JPG
Mesmo com todas as dificuldades, as famílias não pensam em desistir da apiculturaLegenda

Grande parte dos produtores de mel da região comercializam sua produção através de associações familiares, e unidos encontram apoio para continuar investindo na apicultura. Nos próximos meses, devem ser inauguradas estruturas que ajudarão na extração e comercialização de mel.

Porém, para os assentados não basta ter meios que torne viável a apicultura. É necessário conscientização da população do campo e da cidade, principalmente dos beneficiários da Reforma Agrária, sobre os malefícios que os venenos e a soja transgênica geram à saúde humana e ao meio ambiente.

“Lutamos pela democratização da terra para produzir alimentos saudáveis, e é muito triste ver pessoas distorcendo nosso projeto de produção limpa e defendendo o monocultivo de soja transgênica de forma irregular. Alguns podem até se dar bem por um determinado tempo, porém, mais cedo ou mais tarde voltarão para as vilas e a concentração de terras irá se dar novamente. Hoje, não enfrentamos só problemas com as abelhas, enfrentamos também um grande desequilíbrio ambiental, como consequência da ambição sem limite do homem”, alerta seu João, enquanto segura em suas mãos um recipiente de vidro com uma pomba morta por ingestão de soja transgênica e de agrotóxicos.

 

Matéria III - A soja transgênica e outros grãos contaminados por venneos estavam no papo de uma pomba, que foi encontrada morta no pátio de seu João.jpg
A soja transgênica e outros grãos contaminados por venneos estavam no papo de uma pomba, que foi encontrada morta no pátio de seu João

 

​Veja as outras da matérias da série:

 

Chuva de veneno mata abelhas e destrói produção de mel no interior do RS

http://goo.gl/HvUU84

 

Alerta: mortandade de abelhas pode ficar sem controle

http://goo.gl/7QvJrR