Uso de agrotóxico aumentou no Brasil 700% nos últimos 40 anos, aponta Embrapa

Os dados alarmantes foram apresentados durante audiência pública sobre o uso abusivo de agrotóxicos no Rio Grande do Sul.
_MG_0186.JPG

 

Por Leandro Molina
Da Página do MST

Segundo a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), o Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo.

Anualmente são usados aproximadamente 2,5 milhões de toneladas de agrotóxicos em todo o planeta. No Brasil, o consumo teve um aumento de 700% nos últimos quarenta anos, enquanto que a área agrícola produtiva aumentou apenas 78% no mesmo período.

Os dados alarmantes foram apresentados durante audiência pública sobre o uso abusivo de agrotóxicos no Rio Grande do Sul, realizada em Dom Pedrito, na região da Campanha, pela Comissão de Saúde e Meio Ambiente da Assembleia Legislativa. A audiência foi coordenada pelo deputado estadual Edegar Pretto (PT), proponente e titular da Comissão.

O parlamentar destacou a gravidade do uso indiscriminado de veneno nas lavouras gaúchas e criticou o modelo agrícola que coloca o Brasil na triste posição de campeão no uso de produtos químicos.

“Os dados da Embrapa representam um aumento de 17,5% ao ano no consumo de agrotóxico, enquanto a produção cresceu somente 1,9% nesse mesmo período. O comparativo é desproporcional e representa os graves riscos à produção de alimentos saudáveis”, observou Edegar.

O evento, realizado no Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentação de Dom Pedrito, foi solicitado pelo MST em conjunto com o curso de Licenciatura em Educação do Campo da Universidade Federal do Pampa (Unipampa).

A região da Campanha é conhecida por ser um lugar de grandes latifúndios que cercam pequenas propriedades e assentamentos da Reforma Agrária. A principal produção nas grandes lavouras é soja e arroz, produzidos em larga escala e com uso descontrolado de agrotóxicos.

O resultado desta combinação afeta diretamente os pequenos produtores, que são vítimas principalmente da pulverização aérea nas lavouras vizinhas. Como a maior parte do veneno pulverizado é levado com o vento, acaba atingindo a produção orgânica dos assentados e mananciais de água da região.

Élio Müller, presidente da Cooperativa Regional dos Assentados da Fronteira Oeste Ltda (Coperforte), de Santana do Livramento, falou sobre os efeitos da pulverização aérea na região, e questionou o interesse econômico por trás da prática dos fazendeiros. “As pessoas sequer podem ficar do lado de fora das casas quando os aviões passam jogando veneno. Queremos mostrar para sociedade que é possível uma outra forma de produzir alimentos, mas para os grandes a questão econômica e lucro a qualquer preço está acima da vida”, afirmou.

Para o professor do curso de Licenciatura em Educação do Campo da Unipampa, José Guilherme Gonzaga, o papel da universidade pública é dar subsídio para a população e possibilitar à comunidade melhores condições de decisão. “O Estado está refém das grandes corporações, e isso tem que acabar”, declarou.

O dirigente do MST, Luiz Adílio, disse que o movimento sempre denunciou este projeto em curso com interesse do capital nacional e internacional. “É uma guerra longa e nosso papel de movimento social é ocupar os espaços públicos, não só para denunciar, mas principalmente apontar outras alternativas”, salientou.

Adílio lembrou que o MST é referência consolidada na produção de arroz e feijão orgânico, numa prática que respeita a harmonia com a natureza. Também falou da produção de sementes agroecológicas da Bionatur, e cobrou incentivos para o segmento. “A produção orgânica vai permitir que tenhamos um futuro com vida, mas não vamos avançar se os pequenos agricultores que vivem em assentamentos têm dificuldade em obter crédito”, avaliou.

O secretário de Agricultura de Dom Pedrito, Jorge Lopes, expressou posição contrária ao uso abusivo de agrotóxicos na região. Disse que a prefeitura constatou inúmeros danos à fauna e flora. Também denunciou ameaças que recebeu por ter posição contrária ao uso de veneno nas grandes propriedades.

Em relação ao contrabando de produtos pela fronteira, o vereador Dionil Pereira disse que os grandes produtores sem consciência querem ser mais espertos e faturar mais, mas que prejudicam todo um projeto de produção limpa de alimentos. Eloi Pozzer, da Emater, foi na mesma linha, e reiterou que a fronteira tem sido um caminho livre para a entrada de produtos contrabandeados.

A técnica da Cooperativa de Trabalhos em Serviços Técnicos (Coptec), Marli Kupinski, relatou problemas comuns na região: a mortandade de abelhas e problemas com a saúde de pessoas pelo uso indiscriminado de veneno nos latifúndios.

Ela apresentou casos de assentados que perderam colmeias e toda a produção de mel, e vários que enfrentam danos à saúde. “Além dos prejuízos com a produção, mulheres tiveram problema para engravidar, e registramos crianças com constante dor de cabeça atribuída ao contato com veneno pulverizado na região”, alertou.

O representante da Secretaria de Saúde do Estado, Dalto Paiva, conta que o município tem uma série de casos de câncer, atribuídos aos efeitos nefastos que, segundo ele, os agrotóxicos trazem para os trabalhadores rurais em toda a região. “Temos acompanhado os diversos problemas de saúde causado pela ingestão involuntária do veneno pulverizado”, relatou.

 

_MG_0200.JPG

Frente Parlamentar em Defesa da Alimentação Saudável

Para contrapor o uso abusivo de agrotóxicos no estado, o deputado Edegar Pretto falou da Frente Parlamentar Gaúcha em Defesa da Alimentação Saudável, constituída em 2015 na Assembleia Legislativa, e apresentou seus projetos de lei que estão em tramitação e tratam do tema: um que obriga a rotulagem das embalagens de alimentos produzidos com o uso de agrotóxicos, outro que proíbe a fabricação, uso e comercialização do agrotóxico 2,4-D no estado, e um terceiro que proíbe a pulverização aérea no Rio Grande do Sul. “O consumidor tem que ter o direito de saber o que leva para casa.

Cícero Correia, do Ministério Público Federal, prestou apoio ao movimento em defesa da alimentação saudável, e disse que o rompimento do elo na cadeia pode significar o fim da raça humana. “O aumento abusivo de uso de veneno desrespeita a preservação da natureza e nossa cultura de trabalhar na terra. Muito cuidado com aqueles que vêm com promessas fáceis, mas que só visam lucro”, alertou.

A audiência pública fez parte da Jornada Universitária em Defesa da Reforma Agrária, da Unipampa. Além de contar com a presença de especialistas que apresentaram dados sobre os impactos da escolha alimentar da população no meio ambiente, nos animais e saúde humana, houve espaço para manifestação popular.

O evento encerrou com a concordância entre os participantes de que o modelo agrícola com base no uso de veneno está com os dias contados, e que é cada vez mais urgente novas alternativas de produção de alimentos, entre elas a agroecológica, que não maltrata o meio ambiente e prioriza a vida, e não o lucro de poucos a qualquer preço.

 

_MG_0225.JPG