“Os fatores que a agroecologia possibilita são elementos para efetivação de direitos humanos”

Em novo livro, Direito à Agroecologia, Gladstone Leonel Júnior aponta que a produção de base agroecológica, fornece elementos para a efetivação dos direitos humanos ao meio ambiente.
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Por Lizely Borges
Da Página do MST

A partir da experiência política e profissional na luta pela terra e território, o advogado Gladstone Leonel Júnior identificou uma lacuna: “Observava que o debate do direito agrário quando se especializava, sempre era direcionado a um direito ao agronegócio.

Assim, achava importante apresentar e sistematizar um contraponto. Mais do que isso, seria necessário demarcar esse campo político, no caso relacionado à agroecologia, dentro do Direito”. Provocar este outro debate é a proposta do livro Direito à Agroecologia: A Viabilidade e os Entraves de uma Prática Agrícola Sustentável (Editora Prismas. R$ 49) a ser lançado nesta quinta-feira (14), em Brasília, Distrito Federal.

Doutor em Direito pela Universidade de Brasília, assessor da Relatoria Nacional do Direito à Terra, Território e Alimentação Adequada da Plataforma DHESCA – Brasil no ano de 2011 e advogado popular de movimentos populares, Gladstone destaca a vinculação entre o Estado brasileiro e o agronegócio como obstáculo ao avanço da agroecologia no país, manifesta preocupação com as ações adotadas pelo governo interino de Michel Temer para a política agrária, como a extinção do Ministério do Desenvolvimento Agrário, e problematiza: “enquanto a reforma agrária for escanteada da pauta política, o tema da alimentação adequada ficará em segundo plano”

A conversa abaixo foi feita por troca de e-mails entre o autor e o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST).     

Por que a reflexão proposta pelo livro posiciona a agroecologia como direito humano?

Na verdade o livro, busca apontar a agroecologia como uma potencial promotora de direitos humanos. Observa-se que as práticas agroecológicas vão no sentido do cultivo de alimento saudável, sem a exploração do homem/mulher do campo, com um preço justo na venda do produto plantado, geralmente em propriedades pequenas e sustentáveis ambientalmente. Todos esses fatores que a agroecologia possibilita são elementos para efetivação de direitos humanos para os/as camponeses, os/as consumidores/as e a população em geral.

Quais são os obstáculos econômicos, sociais, políticos ao desenvolvimento de uma produção agrícola de base agroecológica?

Na minha avaliação, o principal obstáculo à agroecologia é a falta de vontade política do Estado em investir em uma prática diversa, sustentável e que respeite as pessoas. Ao contrário, se pinta o modelo do agronegócio como o grande impulsionador da economia, quando não passa de uma reprodução repaginada do modelo de monocultivo-exportador que se pratica há mais de 500 anos no Brasil. 

No início do livro o apresentador do livro, o procurador federal Valdez Faria, cita Darcy Ribeiro no qual ele afirma que o país produz alimentos para engordar porco no Japão e na Alemanha, mas não dá bola para o feijão que o povo come. Por que o padrão de agricultura brasileira é baseado na alta concentração de terra e renda, em grandes extensões rurais, de monocultivo e com produção voltada para exportação?

Entendo como atual a afirmação de Darcy Ribeiro, pois ainda temos uma classe oligárquica rural muito atrasada que não permite a mudança do modelo. Embora, as transnacionais estejam adquirindo cada vez mais terras no Brasil e comprometendo, não só nossa soberania propriamente dita, mas também a soberania alimentar. Romper com esse elo que mantém o país numa lógica de capitalismo dependente e exportador de commodities não é simples, pois o poder econômico acaba financiando a campanha de ruralistas que conseguem uma maioria de representantes no Congresso Nacional e inviabilizam qualquer tipo de mudança que saia dessa lógica de dependência externa.

Quais passos são necessários para a transição deste modelo convencional de agricultura para a agroecologia?

 

Como tudo na vida, a agroecologia não resolveria imediatamente os problemas da agricultura brasileira. Se faz necessário uma transição, pois os camponeses/as em geral, foram educados e estimulados a utilizarem agrotóxicos, mais recentemente, sementes transgênicas e aos poucos devem ser reinseridos em outro universo. Apesar de termos experiências de diversos povos indígenas e povos tradicionais que nunca abandonaram essa diversidade de práticas relacionadas à agroecologia. Conforme for crescendo, a prática agroecológica irá apresentando caminhos novos, heterogêneos, afirmando a sustentabilidade concreta e garantindo a soberania e segurança alimentar.  

Como que as medidas adotadas pelo presidente em exercício, Michel Temer, como a extinção do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e a fragilização de políticas públicas voltadas à assistência técnica e apoio à pequena e média agricultura impactam o desenvolvimento de um modelo de agricultura agroecológica no Brasil?
Gladstone – No último período, em vários eventos e reuniões, o Ministro Patrus Ananias falava bastante da importância em estimular a agroecologia e garantir cada vez mais assistência técnica à agricultura familiar. Conversamos isso algumas vezes, pois participava de um Grupo de Estudo em Direito Agrário (GEDA), liderado pelo então Consultor Jurídico do Ministério naquela época, João Paulo Farias Santos. A extinção do MDA é um recado de um governo ilegítimo e golpista de que eles não estão interessados em garantir a soberania alimentar do país, visto que a produção de mais de 70% dos alimentos do Brasil está nas mãos do/ agricultor/a familiar. 

Na sua avaliação, por que o tema da alimentação, ação presente na vida da população, não está fortemente presente no debate público?

Acredito que para falar em alimentação adequada, também é necessário se falar em reforma agrária, uma vez que as áreas de assentamento são as que preponderantemente produzem alimentos. Não se garante o desenvolvimento de práticas agroecológicas em latifúndios, preocupados com a exportação de commodities. Quem alimenta o povo brasileiro é o agricultor/a familiar e quanto mais pessoas tiverem acesso à terra e territórios, teremos alimentos mais baratos e saudáveis. Enquanto a reforma agrária for escanteada da pauta política, o tema da alimentação adequada ficará em segundo plano.

Serviço:
Lançamento do Livro Direito à Agroecologia: A Viabilidade e os Entraves de uma Prática Agrícola Sustentável (Editora Prismas)
Preço na atividade de lançamento R$ 35
14 de julho, às 19h
Martinina Café, CLN 303, Lj. 04 Asa Norte. Brasília-DF
Para adquirir o livro. Editora Prismas.