Sem Terrinhas se mobilizam em defesa da alimentação saudável no RS

Para despertar a consciência crítica dos Sem Terrinhas sobre os temas, o encontro contou com a Exposição Colheita Venenosa, que trata da memória da vida agrícola do Brasil

 

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Por Catiana de Medeiros
Da Página do MST

Conscientizar as crianças do MST em estudos e práticas sobre a importância da alimentação saudável foi um dos objetivos do 18º Encontro Estadual dos Sem Terrinhas do Rio Grande do Sul, realizado de 10 a 12 de outubro no Centro de Referência de Economia Solidária Dom Ivo Lorscheiter, em Santa Maria, na região Central.

Nos três dias de atividade, que este ano teve como lema “Alimentação saudável: um direito de todos”, cerca de 700 crianças de assentamentos e acampamentos de todas as regiões do estado participaram de atividades relacionadas ao consumo de alimentos saudáveis e aos modelos de produção na agricultura.

Para despertar a consciência crítica dos Sem Terrinhas sobre os temas, o encontro contou com a Exposição Colheita Venenosa, que trata da memória da vida agrícola do Brasil.

A exposição é itinerante e organizada pelo Museu Agrícola Olindo Feldkircher de Selbach, município localizado a 200 quilômetros de Santa Maria. Além de fazer um resgate histórico do surgimento dos pesticidas. A iniciativa mostra o papel da indústria nacional na popularização do uso dos agrotóxicos, substâncias nocivas que têm seu desenvolvimento ligado às armas químicas, em especial, da 1ª Guerra Mundial.

“Nos anos 50 e 60 empresas paulistas de imigrantes japoneses começaram a produzir pulverizadores bem mais baratos que aqueles que vinham do exterior. Isso fez com que mais agricultores utilizassem pesticidas. O uso era sem regra até os anos 90, quando começaram a surgir normas mais específicas, entre elas as classes toxicológicas. Antes disso até as farmácias vendiam pesticidas. Alguns, muito utilizados para suicídios, podiam ser comprados por correio”, explica o vigilante sanitário Jorge Rogelson da Silva.

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A exposição tem uniforme da Missão Militar Brasileira da 1ª Guerra Mundial, máquina de matar formiga e embalagens de venenos como o Dicloro-Difenil-Tricloroetano (DDT), o qual contribui para a má formação genética. Além disso, há Equipamento de Proteção Individual (EPI).

“Não existe agrotóxico seguro, todos são perigosos. Através do projeto buscamos conscientizar as pessoas que esses produtos causam sérios danos e devem ser manipulados com extremo cuidado e dentro das normas técnicas. Nossa missão ainda é ajudá-las a repensar o uso dos pesticidas e a caminhar em direção à agroecologia”, argumenta.

Mais conhecimentos

O aprendizado adquirido em visita à Exposição Colheita Venenosa foi levado por Natanieli Leite, de 12 anos de idade, ao Assentamento Santa Maria do Ibicui, em Manoel Viana, onde mora com seus pais. Para a Sem Terrinha, o encontro ajudou-a a adquirir mais conhecimento sobre os benefícios da alimentação saudável e os malefícios que a má alimentação e os agrotóxicos causam à saúde.

“O evento reforçou os benefícios de consumirmos alimentos sadios e de evitarmos ingerir somente batata frita, salgadinhos e refrigerantes. Temos que apostar numa alimentação bem equilibrada para termos boa saúde e estarmos fortes”, aponta.

Natanieli, que também visitou a Mostra de Produtos Orgânicos e Agroecológicos no encontro, assumiu o compromisso, junto aos outros Sem Terrinhas, de fortalecer nas escolas, acampamentos e assentamentos o debate sobre a produção livre de venenos. “É pelo bem de todas as pessoas”, garante.

Direito de todos

Conforme Diana Daros, do setor de Educação do MST, o encontro mostrou que a alimentação saudável é um direito de todos, e foi por este motivo que os Sem Terrinhas doaram alimentos ao Centro de Apoio à Criança com Câncer, indígenas Kaingang e Guarani, e catadores de materiais recicláveis. “Nós colocamos no prato dessas pessoas a produção da reforma agrária popular”, afirma.

Diana lembra que toda a diversidade das refeições que foram servidas no encontro, com muitas frutas, verduras e legumes, veio dos assentamentos e acampamentos das famílias Sem Terra, o que demarca resistência ao projeto do agronegócio.

“As crianças sofrem muita influência dos meios de comunicação, que potencializam a alimentação industrializada e artificial. É por isso que não ficamos somente no debate: nós pudemos comer, todos os dias, alimentos saudáveis. Compreendemos que, além de dialogar sobre os malefícios da má alimentação, devemos agir na prática e começar a mudar nossos hábitos”, sinaliza.

O dirigente nacional do MST pelo RS, Ildo Pereira, em diálogo com as crianças, motivou-as a continuarem a luta de seus pais por soberania alimentar e a reforma agrária popular. “Os Sem Terrinhas são o futuro do nosso Movimento. Queremos que vocês saiam desse encontro com o compromisso de serem nossa vanguarda e defensores da produção de alimentos saudáveis”, reforça.

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Confira a íntegra da carta compromisso dos Sem Terrinhas do Rio Grande do Sul:

Nós, Sem Terrinhas do Rio Grande do Sul, filhos e filhas de trabalhadores camponeses, estivemos em Santa Maria nos dias 10, 11 e 12 de outubro no nosso 18° Encontro Estadual, com o Lema “Alimentação Saudável: um Direito de Todos”.

Nos colocamos em marcha para denunciar o sucateamento da educação pública, defender a educação do campo e não aceitar nenhum direito a menos.

E é neste sentido que denunciamos:

Os poucos recursos destinados à merenda escolar, que hoje tem uma média de R$ 0,30 aluno/dia;

As péssimas condições do transporte escolar e das estradas dos nossos assentamentos;

O uso dos agrotóxicos em área de assentamentos e ao seu redor; Veneno Mata!

O fechamento das escolas do campo. Só no Rio Grande do Sul aproximadamente 350 escolas correm o risco de serem fechadas.

Nos comprometemos:

Em criar e fortalecer os coletivos de educação e dos Sem Terrinhas, organizando lutas em nossas regiões;

Organizar junto aos educadores de nossas escolas lutas a partir da pauta do nosso Encontro dos Sem Terrinhas;

Fortalecer em nossos assentamentos e escolas o trabalho sobre a produção de alimentos saudável, bem como trocar experiência;

Organizar feiras e amostras nas escolas para divulgar a produção orgânica e agroecológica dos nossos assentamentos;

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Lutar pela educação pública e do campo, não permitindo que nenhuma escola seja fechada;

Lutar para a construção das escolas do campo já aprovadas para funcionarem em nossos assentamentos;

Nos comprometemos em preservar a natureza e não maltratar a mãe terra;

Sermos solidários com os povos de todo o mundo que são arrancados da terra, perdendo a vida apenas por defenderem o direito de serem um povo, de terem um país, de cultivarem sua cultura;

Sermos os continuadores da luta e dos sonhos de todos os povos. Regaremos o sonho de um mundo onde possamos todos florescer a esperança de transformação.

MST: Por Escola Terra e Dignidade!
Santa Maria, 12 de outubro de 2016.

*Editado por Iris Pacheco