Diante de um Executivo blindado, oposição amplia diálogo com sociedade por novas eleições

Em paralelo às articulações de Temer contra a denúncia, Frente pelas Diretas inicia mobilizações com reunião com OAB.

Parlamentares em reunião com presidente da OAB, Cláudio Lamachia. Foto Eugênio Novais. Comunicação OAB.jpg

 

Por Lizely Borges
Da Página do MST

 

Os deputados federais e senadores que integram a Frente Suprapartidária pelas “Diretas Já” devem intensificar as mobilizações e diálogos com a sociedade no próximo período com a pauta da destituição de Michel Temer (PMDB) do cargo da presidência, diante da acusação de corrupção passiva, e pela antecipação de eleições diretas. O primeiro diálogo entre os parlamentares de um diverso espectro político e sociedade civil ocorreu nesta quarta-feira (5) com o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cláudio Lamachia, na sede da organização, em Brasília. A próxima atividade será nesta segunda-feira com representantes de movimentos populares. 

Criada no início de junho com objetivo de aumentar a pressão popular pela realização de eleições diretas, a mobilização ganha novos contornos com a movimentação presidencial para paralisar a denúncia realizada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

Com sustentação na delação de um dos donos do grupo JBS, Joesley Batista, feita à Procuradoria Geral da República (PGR), a denúncia feita por Janot é objeto de julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF), como determina a constituição para casos de crimes comuns envolvendo o presidente. No entanto, anterior ao STF, é preciso que a Câmara dos Deputados, em duas instâncias, aprove a abertura do processo: pela maioria simples da Comissão de Constituição e Constituição e Justiça e Cidadania (CCJ) da casa – com votos de, no mínimo 34 votos; e ao menos dois terços dos deputados em votação pelo Plenário (mínimo de 342 votos favoráveis).

Tramitação na CCJC

 

Deputado Rodrigo Pacheco (PMDB-MG) preside o Colegiado que aprecia a  denúncia contra Temer. Foto Luis Macedo Agência Câmara.jpg
O presidente da CCJ, Rodrigo Pacheco (PMDB).

De acordo com o presidente da CCJ, Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), a leitura do relatório pelo deputado Sérgio Zveiter (PMDB-RJ) tem início nesta segunda-feira (7), discussão na quarta (12) e votação na quinta-feira (13). O calendário atende às expectativas de parte da base governista em acelerar o processo dentro do comissão, e com isso evitar a ampliação do desgaste da base do governo. Neste sentido, Pacheco rejeitou os quatro requerimentos apresentados pela oposição na sessão do dia 5 para escuta à Janot pela CCJ. Outros requerimentos para convocação de peritos, testemunhas e realização de audiências e diligências também foram indeferidos pelo peemedebista. 

“Nós insistimos em procedimentos que qualificam o debate e ampliam as discussões para nosso juízo político e jurídico”, defendeu o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ). O deputado defende a realização das oitivas de Janot, do Instituto Nacional de Criminalística para atestar a validade da gravação de Joesley, e do também denunciado na delação, Rocha Loures (PMDB-PR). Homem de confiança de Temer e responsável pelo transporte da propina para o presidente, Loures possui envolvimento direto na transação que visava favorecer a JBS nas ações do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).

A oposição ainda afirma que a abertura de espaço às diversas fontes colabora para reequilibrar o conteúdo a ser apresentado pela defesa de Temer. “Nós insistimos porque a defesa de Temer é uma peça acusatória contra o inquérito, contra o Ministério Público, contra a PGR e até mesmo o contra o Supremo”, argumentou Alencar.  

A escuta a outras testemunhas é compartilhada pelo deputado Wadih Damous (PT-RJ). “Nós defendemos que, pelo menos, haja no âmbito da CCJ a sustentação oral entre acusação e defesa, sem inquirição. Há resistência por parte da bancada governista, eles querem decidir logo e nós queremos debate até porque a sociedade precisa saber e ter maior compreensão sobre a denúncia”, apontou o deputado. Em entrevista à Página do MST, o petista, integrante da CCJ, reconheceu que o processo contra Temer é diferente do sofrido pela ex-presidenta Dilma Rousseff e que não cabe ao legislativo investigar e colher elementos sobre a denúncia – papel do STF. No entanto, ele aponta que a população deve ter acesso, por meio das ações do legislativo, a mais informações.

Blindagem ao governo

Para barrar o processo, Temer tem realizado um conjunto de articulações com parlamentares e ministros que compõem a base do governo. No mesmo dia da reunião da Frente pelas Diretas com a presidência da OAB, o presidente esteve reunido com 27 deputados federais, incluindo líderes, e 7 senadores. A articulação visa fortalecer uma base que já sofre fissuras. Vulneráveis ao constrangimento popular na defesa de um presidente alvo de denúncias, parte de base tem declinado nos últimos dias. A mais recente retirada de apoio à Temer foi pelo presidente interino do PSBD, o senador Tasso Jereissati (CE).

Engrossando a defesa da eleição indireta do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), Jereissati afirmou que é preciso que o país seja conduzido por “alguém que dê governabilidade”.  “Não dá pra viver cada semana uma nova crise, (….), está na hora de buscar alguma estabilidade”, complementou o senador.

A oposição já denuncia que os movimentos de bastidores no Congresso Nacional caminham para edificar a posse de Maia, primeiro na linha sucessória com a destituição do presidente. Em agenda oficial na Alemanha, Temer disse na sexta-feira (6) que apresenta “zero de preocupação” no avanço das denúncias e novas debandadas da base de apoio. “O PSDB tem quatro ministérios, os ministros todos estão tranquilos, exercendo suas funções, me ligaram todos”, disse. Para ele, Maia deve manter uma postura de defesa do cargo presidencial. “Ele só me dá provas de lealdade o tempo todo”, argumentou.

A lealdade de Maia a Temer esteve expressa na rejeição dos diversos pedidos de impeachment protocolados na Câmara. Um deles é de autoria do presidente da OAB. “O presidente da Câmara, que tem prerrogativa de exame da admissibilidade do impeachment, tem também responsabilidades. Nós imaginamos que quem assume este cargo [o de presidente da Câmara] tem que agir não de acordo com ideologias ou paixões partidárias, mas de acordo com cargo que exerce. Este tema tem que ser resolvido, tem que ser apreciado ou mandando arquivar, fundamentando porque mandou arquivar ou deu curso a este pedido”, defendeu Lamachia.

PMDB no comando da CCJC

Outra ação vista com reservas pela oposição foi a nomeação do deputado Sérgio Zveiter (PMDB-RJ) para relator da denúncia na CCJ. O parlamentar também responde pela vice-liderança do PMDB na Câmara. Além de Zveiter, outra importante função na comissão é comandada por membros do partido. O presidente do colegiado, deputado Rodrigo Pacheco (MG) também é do PMDB.  Entre as atribuições do cargo estão: convocar as sessões, presidir as reuniões, designar relatores e despachar as matérias.

Para Damous, embora os representantes do partido do presidente ocupem estes cargos, fundamentais para o avanço da denúncia contra Temer, eles não devem obstaculizar o progresso da ação. “O fato do presidente da CCJ e relator serem do PMDB não terá, no final das contas, o peso que se pensa que terá. O que vai decidir é o grau de rejeição que Temer tem na sociedade brasileira e a necessidade de a gente sair deste atoleiro. Se a Câmara arquivar este pedido eu não sei o que vai acontecer neste país”, argumentou o parlamentar, em referência ao índice de rejeição à gestão Temer por mais de 85% da população (Pesquisa Ipsos).

Construção de Rede pelas Diretas

Formada por parlamentares de cinco legendas (PSOL, PSB, PT, PDT e PCdoB) a Frente Pelas “Diretas Já” enfrenta como desafio de ampliar o debate com a população sobre um projeto político para o país, ao mesmo tempo que a base do governo busca construir novos arranjos para se manter no poder. Orientados pela compreensão de que é necessária uma mudança dos quadros legislativos, parte dos parlamentares de oposição defendem a realização de eleições amplas para os cargos para presidência, senadores e deputados federais. 

“Temos um déficit democrático, com um Congresso acuado, com boa parte denunciado. (…) Caso tenhamos eleições diretas, ele será, um mês depois, alvo de novas denúncias. Se a gente continuar sequestrando o direito de escolha do povo o país deve afundar ainda mais”, denunciou a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), em referência à realização de eleições indiretas.              

Para o presidente da frente, senador João Capiberibe (PSB-AP), o momento pode servir a um reencontro da população com seus representantes. “Reconhecemos que a atividade política está muito desqualificada e precisamos nos reencontrar com a sociedade brasileira. Estamos avançando na direção de ampliar o movimento por mais democracia. Queremos  que toda brasileira e todo brasileiro componha este movimento”, diz. 

Para o senador, a sociedade civil é fundamental, pela capilaridade nos territórios, para estruturar as Frentes pelas Diretas nos estados e municípios. “A ideia é provocar que, no local de trabalho, de estudo, a gente crie um movimento político para superar esta fase crítica que a representação política está vivendo no país”, finalizou.

“Como a gente vive uma crise de representatividade, com um Congresso dominado por parlamentares que legislam em causa própria, às custas da perda de direitos do povo, é muito importante que parlamentares de oposição ao governo golpista ampliem o diálogo com o povo. Somente ele dará legitimidade a um projeto político para o país”, defendeu o membro da Coordenação Nacional do MST, Alexandre Conceição.

 

*Editado por Leonardo Fernandes